Cinco horas no planeta Terra corresponderam a 15 minutos na galáxia 20 XX Vinte. Eis a equação que traduz a primeira experiência 20 XX Vinte, em Lisboa, que teve lugar na noite deste sábado, 22 de novembro, na Taberna das Almas, nos Anjos. A teoria, engendrada pela promotora e editora Lovers & Lollypops e o Atelier Bolos Quentes, era simples: 20 bandas e 20 DJs, em dois palcos, com atuações de 15 minutos, e a exposição dos cartazes que 20 artistas convidados criaram para o evento. Mas, na prática, o 20 XX Vinte transformou-se numa viagem espacial: entrámos numa nave em forma de antiga fábrica - um open space, de dois andares e aspecto arrumado-desarrumado -, e o tempo acelerou, num zapping vertiginoso por 20 dos mais interessantes, e recentes, projetos de música portugueses.Foi uma espécie de jogo. O cronómetro, projetado numa imagem na parede do palco, marcava 15 minutos, em loop. As bandas apareciam e tinham de dar o seu melhor. Na guerra do homem contra o tempo, ganharam as bandas que souberam dele libertar-se e impor o seu universo.A mesma pressão não se fez sentir no palco dos DJs. Sem a necessidade de trocas de materiais, afinações e outras contingências próprias de quem vai tocar ao vivo, a aplicação do conceito '15 minutos e acabou' foi mais fluida. E, entre o rock e o techno, esteve-se sempre em altas.No palco das bandas, os primeiros a dar tudo foram os primeiros a pisá-lo: os JUBA. Tudo parecia jogar contra eles - desde a plateia ainda pouca e dispersa (a nave só encheu por volta da meia-noite) até aos problemas técnicos, com o quadro elétrico a ir abaixo várias vezes. Mas os quatro rapazes aguentaram-se à bronca, sempre prontos a retomar o seu rock experimental com laivos psicadélicos, já consolidado no disco Mynah (2013).O primeiro grande concerto, sem mácula, chegou pouco depois, com Rodrigo Amado, no saxofone, e Gabriel Ferrandini, na bateria. O duo de jazz chutou o relógio para canto e tocou à velocidade da luz. No fim, ficámos como se tivéssemos sido atropelados por um TGV. A precisar de um whisky, portanto.Felizmente, fomos salvos por duas entidades de outro planeta. Primeiro, por Alek Rein, com a sua voz tão bela que parece que tudo inaugura. À sua juntaram-se as de dois fãs, na primeira fila, que sabiam as canções de cor, e, curiosamente, lhes deram um cheirinho a Beatles.A segunda 'reanimação' deveu-se aos Memória de Peixe, em cujas construções de malhas de guitarra - que conhecemos de trás para a frente graças ao disco homónimo, de 2012 - mergulhamos sempre de cabeça. Juntamente com Quelle Dead Gazelle (que atuou mais tarde), este foi sem dúvida o par de rock da noite.Outro momento feliz foram os novíssimos Marvel Lima, banda de rock com ginga latina, a ter debaixo de olho, seguidos de Cangarra. A dupla de rock psicadélico, que conta com quatro registos disponíveis em formato digital, já teve noites mais fulgurantes. Ainda assim, é impossível ficar indiferente à ferocidade do baterista Ricardo Martins, que também subiu ao palco, momentos antes, com o projeto Noz.Iguanas/Kridinhux foi o nome de código para os 15 minutos mais insólitos da noite. Uma espécie de comic relief. Uma rapariga e dois rapazes, quais entertainers/cantores românticos, em modo acelerado, a cantar por cima de ritmos eletrónicos tropical disco. A nave-Taberna chegou mesmo a transformar-se numa imensa pista de dança com a entrada em cena da malta de André do Poster e a sua contagiante mistura de afrobeat, zouk e kuduro.Passámos, entretanto, por um buraco negro, na excelente companhia do rock pesado de Don't Disturb My Circles e de Signs of the Silhouette, e fomos acabar de boca aberta: erguia-se uma ode musical e performativa ao jogador de futebol Ibrahimovic, com direito a Bíblia aberta e quadro de 'A Última Ceia' em riste, com uma fotografia do jogador sueco colada na cara de Jesus Cristo. Estávamos na constelação de Feia Medronho.Regressámos a Terra sãos e salvos (apenas com uma ligeira arritmia). E com uma certeza: há vida na galáxia 20 XX Vinte.carolina.furtado.freitas@gmail.com
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