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Desporto

A glorificação de Matic é um erro daqueles

É mesmo o melhor médio defensivo do mundo? Talvez não.

Uma vez, Freitas Lobo disse que Ibrahimovic era o melhor jogador do mundo com mais de 1,90 metros de altura. O comentário veio na sequência de uma verdadeira ode ao sueco, após a bicicleta fantástica frente à selecção inglesa. Por isso, quando Jorge Jesus afirmou, recentemente, que Matic era o melhor médio defensivo do mundo só posso interpretar esta declaração à luz do critério de Freitas Lobo. De outra forma, teria de olhar para estas palavras como mais um laivo de loucura e desfasamento da realidade do treinador do Benfica, que já nos mostrou em anos anteriores que, por vezes, confunde gravemente o sonho com a realidade.

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No universo de Jesus, o Benfica era a melhor equipa do mundo na época 2010/2011, candidato assumido à conquista da Liga dos Campeões. Também no seguimento desta lógica, os verdadeiros perigos à conquista do título de campeão nacional 2012/2013 passavam pela recepção ao Sporting e pela visita ao Marítimo, visita essa que acabou com festejos dos encarnados e títulos gloriosos nos jornais. A euforia acabou quando esbarraram com o pequeno grande Estoril na Luz e com um golo titânico de Kelvin aos 92 minutos no Dragão. Portanto, não me surpreende ouvir de Jorge Jesus constantes exageros associados à mística benfiquista.

No caso Matic o exagero assumiu contornos diferentes, expandindo-se, que nem doença viral, pelas bocas deste país fora. Tenho a perfeita noção que sou uma das poucas pessoas a olhar para Matic como um jogador mediano, e, por isso mesmo, questionei-me várias vezes sobre a fidelidade desta minha posição. No entanto, o máximo que consegui foi considerar Matic um jogador normal em vez de mau. E isto deixa-me bastante confusa, dado o processo de glorificação dos últimos meses, que culminou na elevação do sérvio à categoria de melhor médio defensivo do mundo. Como se não bastasse, para além de considerado o melhor dos melhores, Matic passou a ser visto como o protótipo de jogador que está no restrito patamar dos talentos inatingíveis. Para Jesus, nem que nascessem dez vezes, seria impossível aos pupilos da equipa B do Benfica chegarem ao nível de perfeição do sérvio. Esta última observação parece-me totalmente descabida.

Os primeiros jogos de Matic ao serviço do Benfica foram caricatos. O sérvio parecia uma girafa em campo a tentar coordenar as suas pernas desconchavadas para jogar à bola. Com a transferência de Javi Garcia para o Manchester City, Matic viu-se confrontado com a missão difícil de substituir o trinco espanhol. Lentamente, o jogador de 1,94 metros foi adquirindo noções de jogo, de posicionamento em campo, de passes em profundidade, enfim, de jogador de futebol. Nisso Jesus tem mérito. Mas mérito igual tem Enzo, qual pendulo incansável sempre pronto a limpar as asneiras do colega, sempre lesto a recuar no campo, sempre preciso no passe e na falta inteligente a parar contra-ataques perigosos. Enzo Pérez é peça essencial para entender Matic. Porque sem o argentino ao lado, a glorificação do sérvio seria impensável, com tudo aquilo que nele não é divino a vir ao de cima.

Agora Matic está no Chelsea para jogar no campeonato mais competitivo e emocionante do mundo. Um campeonato que tem Fernandinhos, Tourés, Artetas, Sandros, Carricks, enfim, vários centrocampistas de qualidade invejável. O tempo nos dirá se Matic é de facto o talento imenso que até aqui foi dito ou se é apenas o melhor médio defensivo do mundo com mais de 1,90m de altura.