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Música

Assim é o Shamir

Estivemos à conversa com Shamir, natural de Las Vegas a viver em Londres, e falámos sobre música pop, astrologia, percepções, baile de finalistas e muitas outras coisas.

No recente vídeo da ritmada e electro-tingida pândega de Shamir Bailey "Call it Off", os reinos de realidade e ficção unem-se numa massa vibrante. Tendo lugar principalmente num sonho, encontramos o nosso herói e residente de Las Vegas a dobrar roupas naquele tipo de loja bem iluminada que poderias imaginar encontrar nas ruas de Northtown, os empoeirados subúrbios onde ele cresceu. De facto, até há pouco tempo - mesmo depois de assinar com a editora Point, XL Recordings, e do lançamento do EP elogiado pela crítica em homenagem à sua cidade natal - Shamir estava realmente a dobrar t-shirts numa loja de roupa. Fazer música era uma preocupação para os tempos livres. No vídeo, o mundano é virado de cabeça para baixo quando Shamir se transforma numa versão sua de um fantoche, uma caricatura que espelha a imagem projectada olhando de volta de praticamente todas as revistas e blogs desde o cowbell-tástico "On the Regular" que emergiu no ano passado.

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No papel e no ecrã Shamir - todas as suaves e expressivas características, grandes olhos de avelã, cintilante piercing de prata no nariz - parece um personagem de desenho animado saído directamente do Tumblr, um clarão andrógino, sem género de diversão hedonista em tempos bege. A realidade, no entanto, é surpreendentemente diferente. "Não é uma fachada, mas irias definitivamente julgar-me se eu te mostrasse o meu lado realmente obscuro", adverte.

Sentou-se nos bastidores com umas calças de ganga duplamente branqueadas, o seu casaco estampado com um motivo Velvet Underground nas costas e salpicado com pins na frente, Shamir mata o tempo antes do seu esgotado espectáculo no XOYO de Londres. Magro e nervoso, membros drapeados sobre uma poltrona desgastada, destrói lentamente um saco de gomas de ursinhos , enquanto dois pacotes de bolacha (fechados) repousam numa mesa nas proximidades, intocados devido a uma alergia ao glúten. Até há pouco tempo era vegano, acabando por desistir porque não combinava com a sua vida em turné ("Provavelmente morreria").

Conhecer Shamir em pessoa é um pouco como conversar com o Clark Kent quando estamos à espera do Super-Homem. Ele fala de forma tão suave e sossegada que eu aproximava constantemente o gravador até estar praticamente debaixo do seu queixo. Isto não se deve ao cansaço da sua agenda louca - ele está a meio caminho da sua primeira turné pela Europa promovendo o seu recém-lançado LP de estreia, Rachet - ou demasiada festa. Nem é uma espécie de arrogante anti-social que se acha demasiado bom para isto . "Eu sou apenas naturalmente introvertido," diz, a determinada altura. Ele pode até ser o artista de que todos falam, mas cada questão pessoal faz o volume das suas respostas diminuir para um murmúrio, o volume da sua voz - algo entre o Michael Jackson da era dos Jackson 5 e a Minnie Mouse - apenas sobe quando se fala de Sia ("Ela nunca consegue fazer algo errado"), ou de tricot (fá-lo para afastar o tédio, costumava transportar fios com ele o tempo todo, e consegue despachar um gorro em meia hora). Parece estar tão azamboado com a sua súbita ascensão à proeminência como as pessoas que deixam comentários nos seus vídeos perguntando "Qual é o sexo dele/dela?" "A fama não é o que eu procurava", diz, calmamente. "Eu só queria fazer música e fazer com que as pessoas se relacionassem com ela. É chato que eu, como pessoa e a minha personalidade seja sugado para dentro disto também." Mas é isso que se passa com os fãs de música moderna: nós não queremos apenas as músicas, queremos saber tudo, queremos o pacote completo; exigimos tudo.

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Desde miúdo que Shamir se destacou. Embora nunca tenha sido maltratado na escola, diz que só fazia amizade com raparigas. Isto é um reflexo da família orientada para as mulheres em que cresceu - viveu com a sua mãe, tia, e a sua irmã gémea - mas também porque deixava os rapazes desconfortáveis. "Os meus amigos eram raparigas principalmente porque muitos homens não queriam lidar comigo." Quando eu pergunto qual a razão, as suas sobrancelhas inclinam-se para cima, como que a dizer, "Dah."

"Olha para mim. Muitos rapazes não queriam estar ligados ao Shamir ", explica, referindo-se a si mesmo como um personagem. "Eles falavam comigo, mas não queriam que os seus amigos soubessem que estavam a falar com o Shamir. Quando éramos mais novos essas coisas preocupavam-nos , mas agora estou a ficar mais velho e os meus amigos são mais velhos, e tenho mais amigos homens. Claro que na terra onde cresci tenho mais amigas, mas na Costa Leste quase todos os meus amigos são homens." Isso não quer dizer que ele não era popular: foi eleito o Mais Bem Vestido na versão escolar dos Grammys e foi nomeado para Rei do Baile de Finalistas. "Isso foi estranho para mim. Fui nomeado mas não concorri." Na verdade, ele nem sequer foi ao baile de finalistas, em vez disso foi a um concerto dos Paramore. Mas chegou a participar na premiação, uma noite que ditou que todos aparecessem vestidos como uma pessoa famosa. A escolha de Shamir? "Tracey Chapman", diz, soltando uma gargalhada. "E cantei 'Talkin' About A Revolution.' Ela é super andrógina. Talvez por ser jovem, as pessoas pensam que todo o meu estilo andrógino é pensado, mas não, isto é quem eu sou."

Tendo anteriormente falado sobre sentir-se um pouco como um objecto de fascinação quando miúdo, uma espécie de curiosidade tipo alienígena, eu sugiro que isso talvez ainda esteja a acontecer agora dentro do vácuo do mundo da música. "Isso acontece constantemente! O próprio facto de eu estar aqui a dar esta entrevista é provavelmente por causa disso", diz ele, mais alto do que alguma outra coisa que dirá durante o nosso tempo juntos. "Honestamente, eu não acho que a minha música seria tão interessante para as pessoas se não fosse por causa dessas qualidades", continua ele, referindo-se a tudo fora da música que ele faz. Embora escrito pareça um pouco sem graça, é dito com a característica factual da maioria das respostas de Shamir. "Acho que a minha música e a sua composição é muito simples e directa. Estou confiante na minha música e tudo mais, mas não sei…suponho que não estou muito habituado a elogios, sinceramente."

Mas, é algo a que vai ter que se habituar. Uma mistura inebriante da música de dança soulfull reminiscente dos Hot Chip e LCD Soundsystem, quebradiça, eletcro-downtime e, na sombria, triste e melancólica balada "Darker", Ratchet constrói a promessa delineada pela igualmente emocional e polarizada Northtown EP. A última criação, uma espécie de feliz acidente graças ao facto de Shamir ter enviado por email, para o chefe da editora Godmode Nick Sylvester, algumas demos em bruto e prontas, principalmente porque ele era um fã da lista de bandas da editora (que inclui lançamentos de escolha da Motion Studies, Courtship Ritual, e Montreal Sex Machine). Enquanto esperava por uma resposta, Shamir, que anteriormente queria ser agricultor, organizou um trabalho como vigilante em Arkansas, apenas mudando de ideias quando Sylvester sugeriu que fosse gravar a Nova Iorque.

"Pensei que, se tudo corresse mal em Nova Iorque, podia dizer que fiquei com a experiência e depois economizar de novo e voltar para o Arkansas." Viajar sozinho para conhecer um completo estranho pode ter levantado alguns sinais de alarme, mas Shamir estava tranquilo por causa de um sonho que a sua mãe teve em que tudo acabou bem devido signo de Sylvester (Caranguejo) elogiando o seu filho (Escorpião). "Eu acredito no universo", confirma Shamir. "Acredito bastante em astrologia e que quem és como pessoa quando nasces e a colocação das estrelas e do universo é tudo. Isso desempenha uma grande parte da nossa trajectória de vida também. Mesmo quando enviei um email ao Nick eu não fazia ideia que ele tinha um amor tão grande pela música de dança - ele estava numa banda punk. Estava a lançar toda esta música electrónica estranha quando eu entrei em contacto com ele." Fosse pelo alinhamento das estrelas ou o reconhecimento de Sylvester pelo espírito de Shamir, que anteriormente tinha, ele próprio, feito parte de uma banda punk chamada Anorexia, o e-mail que enviou o cantor de 20 anos lançou-o numa viagem rumo ao estrelato. A única coisa que não está absolutamente clara que se ele quer isso ou não . "É claro que eu prefiro não fazer entrevistas", diz, ignorando a minha a súbita cara triste. "Mas depois também tenho consciência que a única coisa que me mantém são é pensar como um fã e pensar sobre o quanto eu gosto de aprender sobre os meus músicos favoritos; para aprender sobre o seu passado, de onde vêm e como chegaram onde estão agora. Sempre que dou entrevistas apenas penso sobre isso." Tal como ele próprio - um voraz fã de música - Ratchet é um reflexo dos seus amplos gostos, vagueando por entre os géneros como todas as playlists mais fixes do iTunes (o seu mix actual de turné tem de tudo desde Marina and The Diamonds às Vivian Girls e a "Hold on to your misery", com uma letra do cantor pop britânico CocknBullKid, tatuado ao longo da sua caixa toráxica). Antes do seu breve flirt com o punk ("Ajudou-me a sair de mim mesmo um pouco mais") Shamir, muitas vezes cantaria músicas country - apenas a sua voz e a sua guitarra. "Recebi a minha primeira guitarra acústica e na altura ouvia bastante folk e country. Mas foi difícil fazer música acústica discreta e despida que ao mesmo tempo pudesse identificar-se comigo. Eu queria fazer música que fosse simples e discreta, mas usar cores brilhantes e ser eu próprio ao mesmo tempo poderia ser um bocado estranho para as pessoas". No amplo e abrangente reino da pop, ele parece finalmente ter encontrado o seu lugar. "A música está a começar a tornar-se cada vez mais desprovida de ego e acho que está a tornar-se mais uma arte, uma experiência partilhada, e não esta coisa do status, ou esta coisa da identidade", diz ele. "Acho que antes, a música era uma maneira das pessoas encontrarem a sua identidade, mas foi algo que lhes foi meio alimentado à colher - se estivesses todo de preto e usasses eyeliner então eras gótico, e por aí fora". Mas isso eras tu? "As pessoas têm fases quando crescem. Nunca tive uma fase. Está tudo relacionado com seres honesto contigo mesmo. Sempre gostei do que gosto." Rachet está à venda na XL Recordings. Segue Michael Cragg no Twitter. Este artigo foi inicialmente publicado em Noisey.