Cerol na mão: o maior combate de pipeiros do Brasil

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Cerol na mão: o maior combate de pipeiros do Brasil

No último domingo (13), um combate alto-astral reuniu mais de 10 mil pipeiros em Osasco, região metropolitana de São Paulo.

Aconteceu no último domingo (13), em Osasco, região metropolitana de São Paulo, o maior combate de pipas do Brasil. Conhecido como "Rio X SP", o evento reuniu mais de 10 mil pipeiros de todo o país durante o fim de semana mais frio do ano. O céu cinza tinha espaço pra todo tipo de pipa, cujas estampas iam desde Jesus Cristo até Snoop Dogg.

Foto: Felipe Larozza/VICE

Carne na churrasqueira, cerveja no isopor, criança, adulto, Racionais MC's, funk paulistano e arrocha no último volume. Embora o dia estivesse congelante, o clima era de alto-astral. Carros improvisados vendiam as pipas pela bagatela de R$ 1. O espírito de competição até existia, mas não havia regra. O negócio era botar os brinquedinhos no ar e permanecer o quanto desse, de preferência cortando os oponentes. A concorrência era tão grande que, às vezes, bastavam 20 segundos para a pipa ir embora.

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Foto: Felipe Larozza/VICE

No chão enlameado, a molecada segurava grandes varas de bambu ou pedaços de pau para fisgar ainda no ar as pipas aparadas. Selvageria. Valia tudo.

Foto: Felipe Larozza/VICE

A rixa não é nova: há mais ou menos oito anos, pipeiros de São Paulo e do Rio de Janeiro se encontram para disputar no ar quem corta a linha do outro. Com o tempo, pessoas de outras cidades e até de outros estados se juntaram. É o caso de Zinho, de Florianópolis, Santa Catarina, que enfrentou 10 horas de estrada junto da equipe Só Puxão. "Trouxe 50 pipas só pra mim", falou. "Em cima, no céu, é briga. Mas aqui embaixo é amizade."

Zinho, da equipe Só Puxão. Foto: Felipe Larozza/VICE

Os homens eram maioria. Depois de rodar muito pelo lugar, que era gigante, a VICE não encontrou nenhuma garota empinando. Uma pena.

VOCABULÁRIO RÁPIDO DOS PIPEIROS

Dar linha: descarregar, soltar mais linha pra pipa voar
Tenteio: cortar a linha do oponente duas vezes
Largada: soltar a linha de uma vez na linha do rival
Rancão: puxar a linha desesperadamente
"Nossa, que tapa": quando um pipeiro dá um corte muito bruto no oponente
"Tá chocando": quando o rival fica fugindo da briga

Mãe de pipeiro, Valquíria já está acostumada a passar o dia no carro esperando o filho se divertir. No último encontro, fazia calor. Dessa vez, o negócio foi apelar para o crochê e se proteger da friaca dentro do automóvel. "Meu filho tem 18 anos. A pipa é uma diversão, uma coisa saudável. Desde que não tenha o bendito do cerol, né? É arriscado. Aqui no campeonato a gente não vê cerol."

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Foto: Felipe Larozza/VICE

Na verdade, Valquíria estava enganada. A maioria dos pipeiros apela, sim, para a mistura de vidro moído e cola ou para a linha chilena, que é similar ao cerol – só que mais potente (e industrializada). Bastava uma olhada ao redor pra ver um monte de moleques com as mãos sangrando. Pra amenizar os machucados, a maioria usava esparadrapos.

Foto: Felipe Larozza/VICE

A utilização e fabricação tanto do cerol quanto da linha chilena são proibidas, já que muitos motociclistas e pedestres foram feridos – e até morreram – por conta de ambos. Renato Libonati, proprietário da AEROPipa, levanta a bandeira da regulamentação. "Não queremos que o cerol seja totalmente liberado. Queremos a regulamentação. Da mesma maneira que o racha na rua foi proibido e acabou dentro do autódromo", falou à VICE.

Foto: Felipe Larozza/VICE

O grupo Os 64 saiu da Zona Leste de São Paulo para ir ao combate. "Isso aqui é coisa de infância, não é do século 21", contou Felipe, cheio de esparadrapo na mão. "Querem proibir, mas aqui é um lugar apropriado. Não tem perigo de machucar outras pessoas."

Josué Teixeira, da equipe Guerreiros de Bangu. Foto: Felipe Larozza/VICE

Integrante da equipe Guerreiros de Bangu, do Rio de Janeiro, Josué Teixeira concorda que o ideal seria "determinar locais pra soltar pipa com segurança". Ele acredita que a brincadeira seja um fator decisivo para tirar da rua quem está vulnerável. "Falo com certeza: uma criança que é apaixonada por pipa não vai se envolver com tráfico ou drogas porque não vai sobrar tempo. Ela vai gostar muito mais de pipa do que de qualquer outra coisa." O amor pela pipa é real. Só os Guerreiros de Bangu levaram 20 mil delas pra empinar no dia.

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Mais de 10 mil pipeiros. Foto: Felipe Larozza/VICE

Um dos organizadores do combate, Edson dos Santos relatou que a paixão vem desde criança. Para realizar o encontro, ele enviou um ofício à Prefeitura de Osasco, que juntamente à Unifesp, proprietária do terreno, liberou o espaço. A Guarda Civil Metropolitana e a Polícia Militar escoltavam o evento, que contou com a presença de uma ambulância caso alguém se machucasse.

Foto: Felipe Larozza/VICE

Apesar da quantidade de pessoas ali, havia somente a VICE e um jornalista independente cobrindo o combate. Para Edson, a mídia só quer ver "gente com pescoço cortado". "Tacham a gente de desocupado, maloqueiro, vagabundo. E não é isso. Não teve uma briga aqui."

Abaixo, transe mais fotos desse dia tão alto-astral:

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE

Foto: Felipe Larozza/VICE