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Tecnologia

Conferência pirata: os editores são uns chulos

E, afinal, nem sequer bebem rum.

A pirataria sempre foi uma área do meu interesse. Interessa-me o facto de que os piratas se chamem a si próprios piratas. É uma espécie de último estádio do

bullying

, em que a ofensa se torna orgulho. Por outro lado, roubar as grandes editoras dá prazer, sobretudo aos que nasceram nos 80 e que já souberam o que era gastar rios de guito em CDs de merda e que, às vezes, até demoravam meses a chegar a Portugal. Hoje em dia, muitos putos não sabem o que é isso e para eles (e para mim) pouca diferença há entre um CD e uma daquelas canecas de merchandising. A conferência internacional de Cultura Pirata 2012 veio a Lisboa e eu não podia faltar.

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O primeiro painel começou por ser interessante. Um orador que é professor universitário no Minho criou, pelo que percebi, uma biblioteca online em livre-acesso, tipo b-on ou rcaap.pt. O pessoal da comunicação deve conhecer. Ninguém paga um cêntimo. Chama-se BOCC. Esta apresentação correu bem e acabou melhor. O orador deixou claro que “o que é do público deve ser devolvido ao público” e insinuou que piratas são os grandes editores! Sim, esses gajos querem fazer um negócio certinho e, por isso, exploram o público com preços inflacionados e exigem “pagamentos de edição” aos autores. Portanto, editores-chulos… Era precisamente isto que eu precisava de sentir numa conferência pirata. Só por isto já estava agradecido, mas o orador que se seguiu foi o meu preferido. Avisou-nos logo que não iria falar do digital. Muitos dos que assistiram apagaram naquele momento. Eu não consegui. A sua semelhança com António Lobo Antunes era séria, até nas atitudes.

Olha o António Lobo Antunes, versão pirataria.

Conhecem aquele vídeo promocional em que o Lobo Antunes diz que “é preciso encher os livros de silêncio”?

Ora bem, a atitude desse professor era exactamente a mesma e o espectáculo visual que nos proporcionou foi bem fixe. Não tinha qualquer cuidado formal e isso balançou na cena de não querer falar do digital. Ora dormia ora acordava, ora ignorava, ora interrompia os restantes oradores. Parecia que estava ali a fazer um frete, mas não estava. Tanto que assistiu à sessão da tarde.

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No final da sessão da manhã, foi-nos dito pelo moderador que tínhamos uma mesinha com águas à nossa disposição e o meu alerta disparou. Eu pensei logo, RUM! Os piratas bebem rum.

Afinal era água…

A parte da tarde foi diferente. Tivemos participações em vídeo-conferência com uma qualidade lastimável (desculpa Paulo Rená, ninguém te ouviu e ninguém percebeu quando acabou a tua intervenção) e um atrito que poderia ter dado mais merda, mas não deu.

Ei, cara, ninguém ouviu você, não.

Na audiência estiveram piratas a sério (tipo aqueles que metem mãos à obra e que alimentam os servidores com cultura e porno) e esteve um senhor careca, de fato, a destoar. Os piratas são malta fixe e tudo correu bem até que esse senhor decidiu assumir-se e dizer que estava ali como “representante dos direitos de clientes” e disse-nos que algumas coisas que foram ditas não estavam certas, porque a classe que ele representa não é um grupo de gananciosos. Falou da Mona Lisa para nos dizer que os mp3s eram ilegais, esquecendo-se de que a representação em suporte digital é a própria cópia e que, precisamente por isso, é impossível distinguir a cópia do original. Todos lhe caíram em cima e, nesse momento, ele sentiu que é pior ser editor ou empresário do que banqueiro.

Piratas e pirateados como se quer: juntinhos. Mas, será que este gajo já arranjou namorada?

Seja como for, foi-se embora pelo seu próprio pé e não houve agressões. Para mim, a organização esteve mal. Os piratas do digital não se embebedam com torrents. Para a próxima já sabem, RUM.