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Entretenimento

Estive cinco minutos no programa "Olé" e já foi demais

Televisão: chegar ao fundo e continuar a escavar.

Se há coisa que nunca conseguirei compreender é esta lógica de as televisões colocarem famosos (que só o Google conhece) a fazer coisas que não sabem fazer e que nunca saberão concretizar. Muito longe vão os tempos em que o mérito físico ou intelectual era fundamental para entrar num qualquer programa de TV. Hoje em dia, basta juntar um grupo de parvos — concorrentes e espectadores — e a festa está feita. Dado que chegámos ao último estádio da estupidez, programas como o

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Olé

podem existir. E são um sucesso.

Tudo isto baseado num mundo de imbecilidade, em que se diz ao espectador que os famosos podem fazer qualquer coisa bem — cantar, actuar ou (agora a sério, vá lá) marchar. E o espectador, por sua vez, espera que tudo corra mal e que algum desses tais “famosos” faça figuras mesmo tristes. Se nada disto acontecer, teremos sempre o conhecimento do júri e a boa disposição da Bárbara, que adora aconchegar o público com o seu entusiasmo permanente, movimentos de dança e sorriso XXL.

No caso deste programa, uma tourada com celebridades,

a indignação virtual

não faltou e a presencial, convocada pela

ANIMAL

, também lá esteve — mas em menor número, como vem sendo hábito. No total, foram cerca de 100 pessoas a gritar palavras de ordem com tachos e buzinas e um ligeiro cerco que a polícia tinha preparado. Não é difícil sermos solidários com a ANIMAL, mas também não é preciso muito para os apreciadores do mau gosto e vexame alheio pedirem um bilhete gratuito para terem lugar cimeiro no espectáculo das desgraças.

Ao entrar no Campo Pequeno, percebi que quer a segurança, quer a organização do evento valiam tanto como o espectáculo em si: a sério, deviam ter visto a discussão sobre o facto de se poder ou não entrar com uma câmara fotográfica no recinto. Depois de algumas informações contraditórias, lá percebi que o problema passava pelo exclusivo fotográfico que a SIC tinha dado à

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Nova Gente

. Como este tipo de relações funcionam melhor em ménage, decidi criar ali uma parceria à força e sacar umas fotos a partir dos camarotes.

Felizmente, cheguei mais tarde e mal apanhei aquela coreografia inicial com cavalos, dançarinos e tambores (condição

sine qua non

para abrir um programa de merda) que o público adorou, como adora sempre. Agradeci aos deuses ter sido poupado dessa parvoíce. Mas não me livrei de levar com a Bárbara Guimarães e com o seu auxiliar a tentarem legitimar este espectáculo indigno. Por sorte, ainda me ri com o funcionário da SIC que se abanava todo, só para ensinar o público a bater palmas na altura certa.

Como nestas coisas torço sempre pelo touro, decidi vir embora. Pelo caminho, não consegui deixar de pensar em quem teria arquitectado tudo isto, ao ponto de conseguir o impossível: juntar aficionados e defensores dos direitos dos animais contra o mesmo programa. Chegado a casa percebi que, afinal, o ideólogo foi o Piet-Hein, aquele produtor holandês especialista em

reality shows

e que teima em assegurar que estes programas não saem dos nossos televisores. Assim de repente, não me consigo lembrar de nenhum espectáculo mais degradante que a televisão portuguesa tenha transmitido nos últimos anos.

Mas não percamos de vista o essencial. Programas como o

Olé

servem para manter e reforçar estereótipos, por mais ridículos que sejam: neste caso, lembrar a quem assiste (o público

esclarecido

que fez deste o programa mais visto do dia) que é diante de touros que a coragem se demonstra.