Fomos lá e vimos: Cícero

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Música

Fomos lá e vimos: Cícero

Agora que quebrámos o gelo, venham mais concertos.

Há pouco mais de quatro meses fizeram a estreia em Portugal três brasileiros chamados Wado, Momo e Cícero. Podiam ser personagens de banda-desenhada ou até nomes de palhaços do circo Chen, mas eu que assisti a esse concerto boquiaberto do primeiro ao último acorde, tornei-me adepto incondicional das canções destes três — que terão sido apadrinhados em Portugal pelo mestre Marcelo Camelo e pelo baterista Fred Ferreira (Orelha Negra). Na noite de ontem, Cícero Rosa Lins de seu nome completo, não só encheu o Musicbox, como deu um concerto em que confirmou todos os motivos que me levaram a passar os últimos quatro meses a ouvir os dois álbuns que lançou até à data: Canções de Apartamento (2011) e Sábado (2013).

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O espectáculo começou tímido, com um nervoso miudinho mais tarde confessado em modo de alívio pelo compositor carioca. Acompanhado por um quarteto de músicos muitíssimo capazes, entre os quais o Fred Ferreira na bateria, a voz morna de Cícero soltou-se em fumos ora azúis e frios, ora em tons mais quentes, como que a dividir as diferentes auras dos seus dois registos. As duas primeiras canções de Sábado, obra sobretudo minimalista e introspectiva do autor, deram o mote para essa contenção cromática, que se libertaria no primeiro tema potenciador de coros espontâneos do público, "Vagalumes Cegos". Seguiu-se uma rotação bem planeada de músicas que percorrem tanto caminhos da mpb, como do indie-rock, sempre adornadas com letras bonitas e bem construídas, que muitas vezes nos fazem prestar muita atenção ao que está a ser cantado, como em «Açúcar ou Adoçante”, primeiro grande momento da noite com o seu refrão explosivamente apaixonado. Se o Cícero estava desconfiado com o público português, que segundo ele, faz menos barulho que o brasileiro (porque se calhar ouve com mais atenção), depressa se apercebeu que o concerto estava a correr muito bem, já que a belíssima canção "Zelo", composta pelo amigo Wado, e o maior sucesso do primeiro álbum Tempo de Pipa, fizeram com que o silêncio contemplativo da audiência se tornasse em movimento e exclamação. No final ainda deu para um encore e para uma declaração de “músico muito feliz por se estrear em Portugal”, que tanto nos envaidece sempre. De facto, ter um coro de vozes, ainda que tímidas, a acompanhar rigorosamente um par de canções numa estreia é algo de que um autor muito se pode orgulhar. Agora que o gelo já foi quebrado, que venham muitos mais concertos por esse país fora deste nosso novo amigo carioca despenteado de nome simples e clássico: Cícero. Fotografia por Tiago Franco Paiva.

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