A juventude birmanesa encontrou no punk uma nova voz política
Todas as imagem de "My Buddha is Punk". Cortesia Andreas Hartmann

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A juventude birmanesa encontrou no punk uma nova voz política

O punk chegou com 20 anos de atraso à antiga Birmânia, mas, desde os anos 90, não parou de crescer. O documentário "My Buddha is Punk" é o testemunho da força do movimento.

Este artigo foi originalmente publicado na nossa plataforma i-D.

Em My Buddha Is Punk, o realizador Andreas Hartmann acompanha o músico birmanês de 25 anos, Kyaw Kyaw, enquanto ele tenta difundir a sua mensagem de liberdade através do punk.

O filme, que acaba de estrear no Festival de Cinema Doc' n Roll, em Londres, é um testemunho do poder duradouro do punk em Myanmar, antiga Birmânia, bem como da força de vontade das pessoas envolvidas no movimento. Falámos com Hartmann sobre as mensagens mais fortes da obra.

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i-D: O que é que te atraiu no punk birmanês em geral e na história de Kyaw em particular?
Andreas Hartmann: Por volta de 2011, depois de 50 anos de ditadura militar, parecia que o país estava a mudar. No entanto, as violações dos direitos humanos continuavam, a guerra civil ainda não tinha terminado e as minorias étnicas continuavam a ser perseguidas.

Eu estava interessado em perceber de que forma é que a juventude, o futuro do país, estava a lidar com a situação. Nessa altura, Kyaw Kyaw sonhava com uma cena punk próspera e estava a tentar fazer com que os seus desejos se concretizassem, através de uma filosofia muito interessante que ligava ideias do budismo ao punk.

Porque é que ele usa o punk como meio de transmissão da mensagem?
Ele e os amigos nasceram e cresceram numa ditadura militar. No punk, encontraram uma forma de se expressarem e de se rebelarem contra a ditadura e a opressão. A Birmânia foi um país fechado durante tanto tempo, que o punk chegou com 20 anos de atraso.

Segundo Kyaw Kyaw, a cena punk começou nos anos 90, quando um marinheiro voltou a casa depois de viajar pelo Mundo e trouxe na bagagem um monte de CDs de bandas punk hardcore. Depois, um dos amigos de Kyaw, começou a estudar aprofundadamente o movimento. Antes da entrada do novo milénio, o punk na antiga Birmânia era completamente underground.

Hoje, a cena está a crescer. Kyaw Kyaw e os seus amigos sentiram-se inspirados a fundar a banda Rebel Riot, durante a chamada "Revolução Açafrão", que ocorreu em Setembro de 2007, quando milhares de pessoas, lideradas por monges budistas, protestaram nas ruas contra o regime militar opressivo.

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Como é que o Budismo aparece nesta equação?
Kyaw Kyaw não estava interessado no Budismo enquanto religião. Para ele, o Budismo oferece-te um caminho, o punk oferece-te outro caminho e ambos ligam-se na sua forma pessoal de vida. Ele diz que há duas espécies de liberdade: a primeira é a liberdade física e materialista e a segunda é a liberdade verdadeira, a liberdade mental.

Ao sentir que tinha atingido a liberdade física quando o seu país se tornou uma democracia, ele tenta agora atingir a verdadeira liberdade mental, através da meditação.

Houve alguma coisa que te tenha surpreendido no movimento? Talvez, a política de não às drogas?
Bom, foi de facto muito especial testemunhar essa pureza. A minha imagem do punk foi completamente renovada enquanto andei com eles. Foi impressionante ver como se dedicam aos seus ideais e à sua forma de vida. Têm esta regra não escrita de que ninguém deve desperdiçar o seu tempo a consumir drogas, ou a beber demasiado. É óbvio que nem toda a gente cumpria na íntegra e havia alguns conflitos dentro do grupo.

Mas o constante activismo surpreendeu-me. É preciso não esquecer que foram eles que inventaram a versão birmanesa do movimento internacional "Food Not Bombs", fundado nos anos 80 nos Estados Unidos, como forma de alimentar aqueles que necessitam.

As autoridades locais colocaram-te alguma dificuldade durante as filmagens?
Filmei sem qualquer autorização oficial. Como o país estava cheio de turistas e jornalistas durante o processo de mudança política de 2012, foi fácil passar despercebido. Se tivesse pedido autorização oficial teria sido impossível fazer este filme.

Qual é a importância do estilo neste movimento?
Kyaw Kyaw e os amigos viajaram pelo país para promoverem o movimento e conheceram muitos jovens que queriam saber mais sobre o punk, mas, na sua maioria, o que lhes interessava era a parte da moda, das roupas, dos cabelos. Esses jovens ficavam, depois, bastante surpreendidos com a profundidade dos ideais do punk.

Gostas da música deles? És fã de punk?
Em geral, não, mas gosto da música deles, porque consigo entender a mensagem e a energia que está por detrás. Eles usam a música para espalhar a palavra e inspirar a mudança.

Podes encontrar mais informações sobre "My Buddha is Punk" no Facebook.