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Música

O Disco é Bom - Baxter Dury - It's a Pleasure

Dez temas, cinco do lado A e cinco do lado B.

O Disco é Bom.

Baxter Dury – It's a Pleasure (PIAS, 2014)

Tinha eu 10 anitos quando me chegou às mãos um single que me marcou profundamente e nunca abandonou a minha colecção de "vinis para herdar". Eram os tempos do auge do punk na Inglaterra, e do disco sound nos Estados Unidos. O disco chamava-se ​Hit me with your r​hythm stick e conseguia misturar subtilmente os dois géneros, sem se parecer com nada do que se ouvisse por aquele então. Saía nas compilações de "O melhor do Punk e da New Wave" do Círculo de Leitores e dançava-se nas festas de Verão nos pátios dos clubes recreativos depois do Heart of ​Glass da Blondie ou do Le ​Freak dos Chic. Eu já nessa altura levava alguns discos comigo para tentar infiltrar-me nas "cabinas do disc-jockey" com os "grandes". O "Hit Me…" fez-me marcar muitos pontos.

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(Capa do single Hit me with your rhythm stick, de Ian Dury and the Blockheads)

O responsável daquele estranho objecto musical era ​Ian Dury com a sua banda, os ​Blockheads. Mais tarde vim a saber do êxito enorme que esse disco teve em todo o mundo. Não é de estranhar.

Nessa altura Baxter tinha mais ou menos a minha idade e já tinha aparecido na capa do disco mais famoso do seu pai, "New Boots and Panties", de onde saiu um dos hinos intemporais da música pop/rock, o pouco interessante "Sex & Drugs & Rock & Roll"

​(Capa do disco New Boots and Panties !!, de Ian Dury)

Com tal "pedigree" não é de estranhar que o nosso rapaz viesse a fazer estragos.

Depois de dois discos que passaram completamente desapercebidos para um comum mortal, mais entretido em decifrar os códigos da IDM do novo século, no final de 2011 chega-me às mãos "Happy Soup" e fico em estado de choque. Mas então o Ian Dury não tinha morrido? Como é possível alguém herdar uma voz única e inimitável? Será que a data do disco está errada? Descobriram e remisturaram gravações inéditas do senhor Dury? É que a sua estrutura, a sua forma e a sua simplicidade não concordam com o que se faz e se ouve no séc XXI: Dez temas, cinco do lado A e cinco do lado B (os discos deviam continuar a ser todos assim).

Mas não. Nada disso. Era o disco do "pequeno" Baxter, que já não tem nada de pequeno e depois de andar pela vida aos solavancos e de ter ganho barriga e juízo, colocou todo o seu génio na confecção de temas pop assentes numa simplicidade rítmica e melódica herdeira do melhor dos anos 60, e recheada de um lirismo subtilmente "Gainsbourguiano" capaz de chegar aos corações mais duros ou talvez só mais maduros.

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Foi, juntamente com o ​Channel Orange do Frank Ocean, o meu disco de cabeceira de 2012. E foi também a razão da minha maior arrelia do ano quando tive de ouvir ao longe todo o concerto do meu "querido" Baxter na tenda de acreditações do Primavera Sound de Barcelona, pois os computadores não tinham "sistema" e ficámos para ali retidos, debaixo de um calor insuportável. O meu estado de nervos era tal que tive direito a ser atendido por um rapazote de dois metros da equipa de segurança. Até me vieram as lágrimas aos olhos, não porque ele me tenha dado uns açoites, mas porque ouvia ao longe e ao sabor do vento o "Leak at the Disco" sem poder fazer parte do coro final.

E em 2014…ele voltou. Com mais material duma simplicidade esmagadora. É como comer Peixe Fresco Grelhado naqueles restaurantes que ainda existem ao lado das lotas que ainda estão abertas, com os pés na areia daquelas praias em que ainda nos deixam entrar: It's a Pleasure! Mais dez temas, cinco do lado A e cinco do lado B. Uma capa tão má que não dá para acreditar que não foi de propósito. Umas letras que parecem um despropósito. E aquela voz.

Então e que tal o disco?

O disco é bom.

(A hora de concerto acústico que acompanhou a escrita deste artigo).