O outro lado do funeral de Eusébio
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Fotografia

O outro lado do funeral de Eusébio

O dia em que o céu chorou baba e ranho por Eusébio da Silva Ferreira.

A minha perspectiva holística do Universo faz-me acreditar que, naquele final de tarde, no Cemitério do Lumiar, onde o mítico ex-jogador do SL Benfica foi devolvido à terra, o céu chorou… e muito. Tanto, que cheguei ao ponto de não ter nem um pedaço de lenço de papel seco para limpar a objectiva da câmara que usei nesse dia. O dia do meu baptismo como fotojornalista.

E vocês perguntam: mas então, não tinhas um guarda-chuva, ou uma dessas capas protectoras?

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Tinha, mas depois de ter estado três horas à espera, no mesmíssimo sítio, (privilegiado, pensava eu) e de, entretanto, começar a enterrar os pés na lama (pura areia movediça) que se formou com a chuva torrencial, misturada com a terra cavada e removida para enterrar o caixão do Rei, não consegui aguentar o guarda-chuva na mão e atirei-o para qualquer lado, porque, o que realmente me ocupava a mente não era uma, mas sim duas coisas.

Primeira, o meu material estava tão molhado como se o tivesse dado à minha sobrinha de dois anos para tomar banho com ele na sua banheira cor-de-rosa. Segunda, tenho os meus colegas da Reuters, AFP, AP, RTP, SIC e por aí fora, a gritar que não posso chegar assim e meter-me à frente deles. Isto, depois das tais três horas de pé, a guardar um lugar ao ladinho deles, que desapareceu em segundos quando começou a chegar o carro fúnebre e, com ele, a multidão, tanta e tão emocionada, que não havia espaço para todos.

A única maneira de caberem era empurrar os que já lá estavam. No meio da confusão, capas impermeáveis e afins, rasgadas e desaparecidas. Lá consegui chegar a um posto, por acaso favorável, não posso queixar-me, depois de (não poderia chamar-lhe caminhar) desenterrar-à-força-o-pé-passo-a-passo. Não era a única nesta situação e tenho a certeza que os meus colegas estarão de acordo comigo quando digo que, é por estas e por outras que amamos este ofício.

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Naquele dia o céu chorou baba e ranho por Eusébio da Silva Ferreira e nessa chuva fui baptizada.