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Μodă

Olhar para trás e ver o presente

O mau gosto tem mais importância do que aquilo que se pensa.

No que diz respeito à moda, quase sempre partimos do pressuposto de que é uma área dedicada ao supérfluo, onde o trabalho é mais físico do que intelectual e onde até mesmo o trabalho criativo se foca mais no aspecto visual das roupas do que no seu aspecto conceptual ou na sua funcionalidade. Muitos não têm a noção dos vários factores que contribuem para o desenvolvimento do conceito por trás de uma colecção e um desses factores-chave, as tendências, têm uma componente de análise sociológica, histórica, económica e artística muito forte. Tudo isto para estabelecer a relação do retro com a moda; pode parecer-nos recente esta valorização do guarda-roupa que remonta à juventude dos nossos pais ou dos nossos avós, com o respectivo boom de lojas de roupa vintage ou de influência retro quando na verdade o passado sempre esteve presente nas passarelles e nas revistas — tanto como referência como "artefacto", vulgo, a peça de roupa da tia-avó ou aquele vestido original dos anos 80 com umas ombreiras inimagináveis comprado no mercado de Portobello em Londres. Quantas dezenas de designers não foram buscar influência ao cinema noir dos anos 40 para as suas femme fatales contemporâneas de silhuetas aguçadas? Designers icónicos como Alexander McQueen que regride nos séculos em busca de influências, ou como as memoráveis mini-crinis da Vivienne Westwood — uma adaptação contemporânea das crinolinas do século XIX que marcou a carreira desta mítica criadora. As definições para termos como vintage retro, que entretanto se tornaram ubíquos no nosso vocabulário, variam ligeiramente mas parecem concordar em vários pontos; vintage implica que o artigo em questão terá pelo menos 20 anos de existência (ou 50, ou pelo menos terá de ser velho o suficiente para deixar de ser considerado só um artigo usado) enquanto que retro poderá ser utilizado para objectos recentes mas que têm uma aparência pouco moderna ou fora de moda. Dominar a arte de bem usar peças retro ou fora de estilo implica ter-se também o domínio do chamado “mau gosto”. Durante toda a nossa vida impõem-nos uma série de chavões no que toca à forma de nos vestirmos que cria todo uma rede de complexos e limitações absurdas, desde combinações de cores pouco recomendáveis — "azul e verde, escarro na parede" — a cortes, padrões ou tipos de peça e calçado que nem mortos deveríamos usar. Ora bem, para usufruir de todo o potencial deste tipo de peças temos forçosamente de abrir os nossos horizontes estilísticos e predispor-nos a quebrar com todas essas limitações que criámos na nossa cabeça e nos nossos hábitos de consumo de moda. Experimentar com o dito mau gosto, com o piroso, com o kitsch pode ser uma experiência profundamente libertadora que nos pode levar a descobrir coisas que nos assentam que nem uma luva que nunca ponderaríamos usar antes. Isto não quer necessariamente dizer que de repente vamos estar super confortáveis vestidos como a Fran Drescher ou a Cher todos os dias, mas certamente iremos encontrar elementos que nos vão dar um destaque na massa de estilos homogéneos característica das ruas portuguesas. Quem sabe não encontraremos um par de meias com abacates que ficam uma riqueza a espreitar por baixo das calças quando nos sentamos, um lenço numa cor de queimar a retina que nos ilumina o rosto e apaga os sinais de uma noite de farra ou uma camisa com um padrão capaz de fazer o George Clinton parecer uma freira aborrecida, mas que com um blazer neutro torna-te só na pessoa mais cool do teu escritório. Se sentem que os meios em que circulam no vosso dia-a-dia são demasiado castradores nesse aspecto e não vos permitem explorar essas possibilidades, uma viagem a solo poderá ser um óptimo meio para o fazerem. Caso o orçamento ou tempo não cheguem para alargar horizontes além fronteiras, podem sempre procurar festas ou eventos temáticos onde se sentirão mais à vontade para poder experimentar com vestimentas mais arrojadas a ver o quanto arrasam, ou não (e sim, isto é uma dica para não faltares aos nossos eventos). Este texto está presente na nossa Cutty Mag. Ainda não conheces? Que tal passares nos eventos da 5.ª à Avenida?