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Os portos e os métodos que garantem a entrada da cocaína na Europa

As instalações portuárias de Portugal, Espanha, Bélgica e Holanda são as mais utilizadas para a introdução de coca em território europeu, proveniente da América do Sul.

Este artigo foi originalmente publicado na nossa plataforma VICE News Espanha.

Não é nenhum segredo, filmes como El Niño falam disso e os meios de comunicação social costumam abordar o tema a propósito das grandes quantidades de droga apreendida, no entanto, ainda assim, e apesar das evidências, alguns dos maiores portos da Europa continuam a ser as grandes portas de entrada da cocaína no Continente. Isto mesmo pode depreender-se do relatório "O Tráfico na Europa", publicado recentemente pelo Observatório Europeu da Droga e Toxicodependências (EMCDDA) e que se refere à entrada da cocaína através de contentores como uma das principais vias marítimas de introdução deste estupefaciente na Europa. Um dado significativo, tanto mais se se tiver em conta que dois terços da cocaína apreendida no Continente terão viajado por mar.

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Holanda, Bélgica e Espanha são os países europeus líderes no que respeita ao tráfego de contentores portuários e, juntamente com Portugal, os seus portos são os mais utilizados para a introdução de cocaína. Para enganar os controlos, as redes criminosas utilizam diversos métodos engenhosos, que podem envolver empresas que desenvolvem actividades lícitas, ou, inclusive, encontrando formas de camuflar a droga dentro de mercadorias, como fruta, pranchas de surf, ou cilindros metálicos.

Os carregamentos desta substância psicoactiva procedente na maior parte das vezes de países como a Colômbia, Bolivia, ou Peru, costumam partit de portos brasileiros, ecuatorianos e venezuelanos, que se dirigem primeiro à zona Oeste da Costa africana (Cabo Verde, Madeira, Ilhas Canárias) e depois seguem as rotas também seguidas pelo tráfico de haxixe, que saí do norte de África em direcção a Espanha. A outra rota conhecida, liga a América do Sul ao Caribe e segue daí para os Açores, de forma a continuar depois o percurso até ao Norte da Europa.

Gráfico das diferentes rotas da cocaína produzida na América do Sul, com destino à Europa. (Imagem via EMCDDA).

Espanha, todavia, é um dos pontos mais quentes do tráfico. O País foi responsável por cerca de 70 por cento das apreensões realizadas na Europa em 2015, com 23 mil quilos de cocaína confiscada. A dimensão do tráfego de contentores e a corrupção nos portos holandeses, belgas e espanhóis ajudam a entender o porquê de os narcotraficantes se fazerem valer das instalações portuárias para introduzirem a mercadoria na Europa. A capacidade de controlo é muito limitada. No porto holandês de Roterdão, por exemplo, apenas 50 mil dos 11 milhões de contentores que por ali entraram em 2014 foram vistoriados para verificação das mercadorias que continham.

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"É uma selecção baseada em informações recolhidas por serviços de inteligência: são vistoriados os contentores exportados ou importados por empresas que não tenham grande fiabilidade, os que têm origem suspeita, ou aqueles sobre os quais tenhamos recebido algum tipo de alerta, ou denuncia", assegura à VICE News fonte oficial da Aduaneira espanhola, entidade integrada no Ministério das Finanças local.

Para além disso, devido aos grandes lucros gerados por este negócio, os narcotraficantes estão constantemente a actualizar os seus métodos e técnicas para contornarem e enganarem o controlo. "A coca é extremamente rentável e, consequentemente, a capacidade inventiva dos traficantes é alucinante", salienta a mesma fonte. Os cidadãos da união Europeia gastam 24 mil milhões de euros em drogas por ano e a cocaína representa 24 por cento do mercado de estupefacientes no Velho Continente.

Métodos para enganar os controlos portuários

Entre os métodos utilizados pelos traficantes para evitarem que os carregamentos sejam interceptados está o de esconder a droga em mercadorias perecíveis, como a fruta, porque, pela sua condição, eta categoria de produtos deve ser registada com maior celeridade para evitar que os produtos se estraguem. Os controlos, por isso, costumam ser menos restritivos.

Trabalhadores da Aduana espanhola encontram droga escondida dentro de peças de fruta transportadas num contentor para um porto de Espanha. (Video via Agência Tributária).

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Outra das técnicas é denominada de "gancho perdido" e baseia-se em colocar a droga num contentor de mercadoria lícita, sem o conhecimento da empresa exportadora, durante o seu carregamento no porto de saída e recuperá-la à chegada. Algo que, tal como explica o relatório, implica a colaboração de funcionários e trabalhadores portuários corruptos, que actuam ao serviço destas redes criminosas. "Trata-se de um dos métodos mais usados, porque os contentores aparentam estar limpos, já que são de empresas sérias", salientam fontes da Agência Tributária.

A incorporação de cocaína em materiais líquidos ou não orgânicos sólidos, mediante um processo químico que requere uma extracção posterior, tem sido ultimamente uma grande preocupação para as autoridades, de acordo com o documento do Observatório. Este método, que exige laboratórios no ponto de saída e de chegada é um dos mais sofisticados.. Nos portos espanhóis chegou a detectar-se, por exemplo, cocaína diluída em sumos de ananás. Por vezes, nem precisam de ser tão criativos e optam, simplesmente, por utilizar novos e originais esconderijos, como o interior de pranchas de surf, cilindros de metal, ou estatuetas de animais.

Uma operação contra uma red criminosa que enchia pranchas de surf com cocaína para passar os controlos portuários. Imagem via Agência Tributária.

Segue Maria Altimira no Twitter: @MariaAltimira