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Adam Kotsko: No início estava inspirado para escrever um livro sobre "awkwardness", mas depois tive a ideia de escrever uma trilogia sobre personagens com características negativas. Começou tudo com uma piada - um colega meu ia escrever uma trilogia sobre esse tema e eu estava super céptico. Então pensei: "Oh, se ele consegue escrever uma trilogia eu também consigo", e a verdade é que acabei mesmo por escrevê-la. Aconteceu o seguinte: assim que comecei a falar sobre awkwardness, foi mais ou menos inevitável não falar de creepiness, porque o maior medo de uma pessoa awkward (estranha) é ser vista como um creepy (esquisitóide).
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A minha pesquisa foi basicamente conversar com diferentes pessoas em vários contextos sobre a sua própria definição de creepiness, e principalmente sobre as personagens de televisão que achavam ser creepy. Digo isto também no livro, mas por exemplo, a mascote do Burger King é uma espécie de exemplo creepy com o qual toda a gente está de acordo.Falemos então do "creepy King": o que é que faz dele um clássico creep?
Parece que o segredo para a sua creepiness é que ele combina muitas características diferentes. Antes de mais, ele é invasivo. Está sempre a tentar entrar em casa de alguém ou a arrombar qualquer coisa. Dá a impressão que está sempre a tentar impingir-nos alguma coisa. Não quer roubar, ele apenas quer dar-nos um hambúrguer. Mas a cena mais creepy é que tu não sabes o que é que ele quer ou o que é que ele ganha com isso, porque usa uma máscara que esconde totalmente as suas expressões faciais. Tem também uma espécie de sorriso permanente.Há também um elemento sexual, certo?
Certo. O desejo sexual parece irromper por áreas que não lhe dizem respeito. Nos anúncios, a forma como colocam os hambúrgueres, ou seja lá o que for, faz lembrar um pouco a pornografia. E, à partida, não devemos ter qualquer desejo de fazer sexo com uma sandes.Dá-me, então, um bom exemplo de alguém (da televisão actual) que seja um creep?
Em Girls, a personagem da Lena Dunham's é bastante creepy, pelo menos no início da série, apesar de eu pensar que é um bocado exagerada. Um bom exemplo que mostra que ela é realmente creepy é, talvez, a forma como a sua nudez é retratada na série. Parece que está a ser empurrada para o espectador. Não é uma série normal da HBO, na qual se espera que a nudez apareça mais como pano de fundo, e também a sua relação com o namorado, Adam, que por si só já é um creep. Têm uma relação incrivelmente estranha e degradante no que diz respeito ao sexo, e está claro que ela tenta despertar nele esse lado degradante, para que ela possa escrever uma autobiografia super excitante. Não é que ela goste ou queira directamente fazê-lo, mas a verdade é que dá a impressão que sim, e isso é um bocado creepy.
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Sim, Peep Show, claro que sim! Quer dizer, ambos são extremamente creepy - Super Hans incluído. Por exemplo: quando Jeremy quer doar esperma - ou qualquer coisa do género - e tem que masturbar-se, mas não tem à mão nenhum tipo de pornografia, tira uma fotografia do bolso e começa a masturbar-se com a imagem da rainha (quando esta era jovem). Espero que isso conte como creepy. Há também aquela primeira cena do episódio, quando o Mark se senta num autocarro, põe a mão no assento do lado, e deixa lá a mão quando a Sophie se senta. Ah, e o Super Hans, que sempre que aparece no ecrã é fácil perceber o quão creepy ele é.Uma vez disseste que uma das coisas que torna uma personagem creepy é quando esta não se consegue encaixar na "hierarquia da sociedade" e por isso infringe determinados tipos de limites. Como é que isso funciona na televisão?
Penso que há um padrão geral, por exemplo, um personagem - que costuma ser masculino - é obcecado com uma mulher, que joga num campeonato muito diferente do seu. Se ele não desistir, assim logo à primeira, se continuar a insistir, penso que isso faz dele um creep, porque aquela relação nunca vai acontecer. Penso que o Steve Urkel a dar em cima (continuamente) da sua vizinha - desde a adolescência - é um exemplo perfeito.Então por que é que os argumentistas continuam a recorrer à figura do creep?
Com o creep existe uma espécie de tema duplo. Porque normalmente uma personagem creepy serve de bode expiatório. Ou é rejeitada, ou punida de uma forma também ela creepy, e por isso as pessoas tendem a rejeitá-la. As pessoas acham piada a isso. Mas quando o creep aparece, por vezes também vemos que, afinal, alguém conseguiu o que queria. O seu desejo, mesmo estranho ou pouco convencional, é aceite, e penso que existe um fascínio por isso também. Então, as pessoas têm prazer em ver alguém realizar esta coisa meia transgressora que elas próprias não fariam, e sentem-se satisfeitas. Mas também ficam satisfeitos com a sua rejeição. É estranho. Acho que o creep começa a surgir como uma estranha válvula de libertação na sociedade contemporânea.Achas que estamos a projectar as nossas próprias tendências esquisitas numa personagem creepy da televisão?
Sim, há sempre um elemento de projecção na cena creep. Por exemplo, se imaginares o típico rapaz neurótico que tem receio de aproximar-se de uma rapariga, ou que pensa que "elas só gostam de idiotas", ou "ela nunca irá reparar em mim", ele está a projectar o seu próprio desejo sexual - o desejo sexual que o assusta - neste outro idiota que fica sempre com a rapariga. Existe sempre um desejo de nos dissociarmos de outro elemento nosso e isso é o que gera esta estranha dinâmica de creepiness.Segue Huw e Adam no Twitter.