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Desporto

Só o Eusébio das balizas conseguia parar o Damas dos balázios

Uma história de companheirismo.

Eusébio da Silva Ferreira disputou Taças dos Campeões Europeus com Di Stéfano e George Best, ganhou no duelo com Pelé e marcou a Yashin. Mas por cá, a maior rivalidade teve-a com um rapaz magrinho a quem chamariam “o Eusébio do Sporting”.

Em campo, os jogadores tratam dos

touchdowns

, dos triplos e dos

home runs

. Os adeptos tratam do resto: as comparações entre equipas e entre jogadores são inevitáveis e os fãs fazem delas verdadeiros campeonatos paralelos às competições oficiais. Sim, o Larry Bird ganhou neste ano e o Magic Johnson ganhou no seguinte — mas quem era melhor?

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Tudo se torna mais difuso quando começamos a comparar contextos históricos e culturais distintos: Michael Phelps e Mark Spitz, Roger Federer e Bjorn Borg, ou, claro, Cristiano Ronaldo e Eusébio. E se no caso dos primeiros podemos medir as suas glórias através de conquistas individuais (sejam medalhas ou

grand slams

), no futebol preocupamo-nos mais com aspectos muito específicos, como as médias de golos e assistências, a velocidade, o porte físico, a finta, a visão de jogo, os penalties defendidos. No entanto, na maioria destes casos estamos a equiparar jogadores que fizeram história ocupando posições semelhantes dentro do campo. Porquê? Porque queremos verdades absolutas, porque acreditamos na superioridade irrefutável de Zico sobre Zidane para desempenhar tarefas idênticas, ou vice-versa. Mas e se eles não competirem entre si por um lugar no onze titular dos nossos sonhos molhados? Nesse caso, teremos sempre um duelo de mastodontes às medidas de Beckenbauer e Cruyff, ou um desafio mais poético e subtil como um Maier vs. Panenka.

E em Portugal? Em finais dos anos 60 e no início da década seguinte, enquanto Eusébio ia ajudando o Benfica a debelar toda a oposição interna, apenas o Sporting conseguia bater o pé ao bicampeão europeu dessa década. Alguns desses méritos deviam-se a Carvalho, o experiente guarda-redes (titular no Mundial de 66), mas a sua carreira aproximava-se então da curva descendente e em breve cederia a posição que fora sua durante dez anos. Para o seu lugar, o Sporting apostaria em Vítor Damas, um jovem muito alto, esguio e com agilidade felina que, por acaso, até gostava mais de jogar a avançado. Pouco demorou até que a imprensa visse nele “o Eusébio do Sporting”, o que já na altura não era dizer pouco. Mas Pedro Gomes, seu colega de equipa, preferia outro epíteto:

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“Yashin era o Aranha Negra. Damas era o Homem-Aranha.”

 Escolhi quatro

derbies

 em que o Homem-Aranha e a Pantera Negra deram cabo do juízo um ao outro.

1969/70: Sporting 1-0 Benfica (Campeonato)

Eusébio diz que foi a melhor defesa da vida de Damas. Em mais um jogo grande de uma época em que o Sporting viria a ser campeão, o Benfica visita Alvalade e Damas deixa Eusébio a seco. Augusto Inácio estava lá e conta como foi: “Ainda era miúdo, tinha 12/13 anos e vi Damas fazer uma espectacular defesa com um golpe de rins a remate de Eusébio. Ao longo da minha carreira, nunca vi nada igual. Foi uma defesa impossível que pôs o estádio em delírio. Como grande senhor, Eusébio cumprimentou o Damas logo a seguir e felicitou-o pelo facto.” Ainda assim, no final da época, o melhor marcador é — surpresa, surpresa — Eusébio.



Eusébio da Silva Ferreira disputou Taças dos Campeões Europeus com Di Stéfano e George Best, ganhou no duelo com Pelé e marcou a Yashin. Mas por cá, a maior rivalidade teve-a com um rapaz magrinho a quem chamariam “o Eusébio do Sporting”.



Em campo, os jogadores tratam dos 

touchdowns

, dos triplos e dos 

home runs

. Os adeptos tratam do resto: as comparações entre equipas e entre jogadores são inevitáveis e os fãs fazem delas verdadeiros campeonatos paralelos às competições oficiais. Sim, o Larry Bird ganhou neste ano e o Magic Johnson ganhou no seguinte — mas quem era melhor?





Tudo se torna mais difuso quando começamos a comparar contextos históricos e culturais distintos: Michael Phelps e Mark Spitz, Roger Federer e Bjorn Borg, ou, claro, Cristiano Ronaldo e Eusébio. E se no caso dos primeiros podemos medir as suas glórias através de conquistas individuais (sejam medalhas ou 

grand slams

), no futebol preocupamo-nos mais com aspectos muito específicos, como as médias de golos e assistências, a velocidade, o porte físico, a finta, a visão de jogo, os penalties defendidos. No entanto, na maioria destes casos estamos a equiparar jogadores que fizeram história ocupando posições semelhantes dentro do campo. Porquê? Porque queremos verdades absolutas, porque acreditamos na superioridade irrefutável de Zico sobre Zidane para desempenhar tarefas idênticas, ou vice-versa. Mas e se eles não competirem entre si por um lugar no onze titular dos nossos sonhos molhados? Nesse caso, teremos sempre um duelo de mastodontes às medidas de Beckenbauer e Cruyff, ou um desafio mais poético e subtil como um Maier vs. Panenka.





E em Portugal? Em finais dos anos 60 e no início da década seguinte, enquanto Eusébio ia ajudando o Benfica a debelar toda a oposição interna, apenas o Sporting conseguia bater o pé ao bicampeão europeu dessa década. Alguns desses méritos deviam-se a Carvalho, o experiente guarda-redes (titular no Mundial de 66), mas a sua carreira aproximava-se então da curva descendente e em breve cederia a posição que fora sua durante dez anos. Para o seu lugar, o Sporting apostaria em Vítor Damas, um jovem muito alto, esguio e com agilidade felina que, por acaso, até gostava mais de jogar a avançado. Pouco demorou até que a imprensa visse nele “o Eusébio do Sporting”, o que já na altura não era dizer pouco. Mas Pedro Gomes, seu colega de equipa, preferia outro epíteto:

“Yashin era o Aranha Negra. Damas era o Homem-Aranha.”

 Escolhi quatro 

derbies

 em que o Homem-Aranha e a Pantera Negra deram cabo do juízo um ao outro.






1969/70: Sporting 1-0 Benfica (Campeonato)


Eusébio diz que foi a melhor defesa da vida de Damas. Em mais um jogo grande de uma época em que o Sporting viria a ser campeão, o Benfica visita Alvalade e Damas deixa Eusébio a seco. Augusto Inácio estava lá e conta como foi: “Ainda era miúdo, tinha 12/13 anos e vi Damas fazer uma espectacular defesa com um golpe de rins a remate de Eusébio. Ao longo da minha carreira, nunca vi nada igual. Foi uma defesa impossível que pôs o estádio em delírio. Como grande senhor, Eusébio cumprimentou o Damas logo a seguir e felicitou-o pelo facto.” Ainda assim, no final da época, o melhor marcador é — surpresa, surpresa — Eusébio.






1970/71: Benfica 5-1 Sporting (Campeonato)


Na época seguinte, o Benfica volta a conquistar o título e, pelo meio, no derby da Luz, atropela o Sporting. Damas salva o Sporting de um cataclisma maior e Eusébio “só” marca um. No dia seguinte, a imprensa é unânime: Damas foi mesmo o melhor em campo, apesar dos cinco golos sofridos.






1970/71: Sporting 4-1 Benfica (Taça de Portugal)


Este vídeo é apenas um excerto do filme “Eusébio – A Pantera Negra”, mas permite ver, finalmente a cores, alguns lances entre Eusébio e Damas. De acordo com a

utilizador que colocou este vídeo no YouTube

(e a quem pertence todo este acervo), quis-se dar a entender que Eusébio marcou dois golos sem resposta, o que não sucedeu. Ainda nesse ano de 1971, o Benfica chega campeão ao Jamor e o Sporting tenta fazer o que o Benfica lhe fizera na época passada: evitar a dobradinha do rival. Num jogo em que Damas não parece ter tido grande trabalho, ainda assim, não há-de faltar o golo da praxe de Eusébio, de penalty. Com um

4-1 final

, a taça seguiu para Alvalade.




[daily_motion src='http://www.dailymotion.com/embed/video/xgn892' width='640' height='480']



1971/72: Benfica 3-2 Sporting (Taça de Portugal)


Na quarta final da Taça consecutiva em que o Benfica participa, e pela terceira vez seguida contra o Sporting, um jogo muito duro e quente vai dando um empate a 2-2 ao fim de 90 minutos. O sofrimento prossegue prolongamento adentro e a dois minutos do final dos 30 minutos extra, o Pantera desfaz o nó e marca o terceiro do Benfica, o terceiro da sua conta nessa tarde. Na época seguinte, já com 31 anos, voltará a ser o melhor marcador do campeonato, com 40 golos — quatro deles num só jogo, o derby da primeira volta. Por incrível que pareça, estes dois lá continuaram amigos, como sempre.

1970/71: Benfica 5-1 Sporting (Campeonato)

Na época seguinte, o Benfica volta a conquistar o título e, pelo meio, no derby da Luz, atropela o Sporting. Damas salva o Sporting de um cataclisma maior e Eusébio “só” marca um. No dia seguinte, a imprensa é unânime: Damas foi mesmo o melhor em campo, apesar dos cinco golos sofridos.

1970/71: Sporting 4-1 Benfica (Taça de Portugal)

Este vídeo é apenas um excerto do filme “Eusébio – A Pantera Negra”, mas permite ver, finalmente a cores, alguns lances entre Eusébio e Damas. De acordo com a

utilizador que colocou este vídeo no YouTube

(e a quem pertence todo este acervo), quis-se dar a entender que Eusébio marcou dois golos sem resposta, o que não sucedeu. Ainda nesse ano de 1971, o Benfica chega campeão ao Jamor e o Sporting tenta fazer o que o Benfica lhe fizera na época passada: evitar a dobradinha do rival. Num jogo em que Damas não parece ter tido grande trabalho, ainda assim, não há-de faltar o golo da praxe de Eusébio, de penalty. Com um

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, a taça seguiu para Alvalade.

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1971/72: Benfica 3-2 Sporting (Taça de Portugal)

Na quarta final da Taça consecutiva em que o Benfica participa, e pela terceira vez seguida contra o Sporting, um jogo muito duro e quente vai dando um empate a 2-2 ao fim de 90 minutos. O sofrimento prossegue prolongamento adentro e a dois minutos do final dos 30 minutos extra, o Pantera desfaz o nó e marca o terceiro do Benfica, o terceiro da sua conta nessa tarde. Na época seguinte, já com 31 anos, voltará a ser o melhor marcador do campeonato, com 40 golos — quatro deles num só jogo, o derby da primeira volta. Por incrível que pareça, estes dois lá continuaram amigos, como sempre.