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Como é a vida de um 'sugar baby'?

O acordo pode incluir estar disponível uma vez por semana, ser pontual, não fazer barulho a comer, falar sempre com clareza e manter uma aparência e linguagem corporal profissionais.

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Nem toda a gente estará de acordo. Fotografia via Flickr, do usuário

Jaysin Trevino

Este artigo foi originalmente publicado na VICE US.

Scott é canadiano e tem como objectivo de vida ser CEO do seu próprio negócio de media quando tiver 37 anos. Hoje tem 29. Está desempregado e não pode estudar devido a umas dívidas pendentes. Mas, ao contrário de outras pessoas de 20 e poucos anos com grandes sonhos e uma conta bancária bem mirrada, Scott não está muito preocupado. E porquê? Porque os seus "sugar daddies" são bastante generosos.

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Nos últimos quatro anos, o ex-estudante da Universidade de Toronto, no Canadá, saiu com homens mais velhos e com isso já arrecadou mais sete mil dólares canadianos [cerca de 4.500 euros] em dinheiro e presentes, além de conselhos profissionais que, diz ele, o ajudam bastante na concretização dos seus objectivos como empreendedor. "Espero não estar a parecer interesseiro, ou preguiçoso", salienta ao descrever o seu estilo de vida. E acrescenta: "O dinheiro é o que faz o Mundo girar e se consegues encontrar alguém que tem dinheiro, óptimo!".

Scott não é o único a seguir este plano. Vários jovens da cidade, cansados de namorar gajos falidos da mesma idade que eles, acabam envolvidos com os chamados "sugar daddies", homens mais velhos, e geralmente ricos, que podem concretizar os seus desejos mais caros.

Quando pensas neste tipo de arranjinho, a imagem que te vem à cabeça é, provavelmente, a de uma universitária de 20 e poucos anos a lutar para pagar a mensalidade, e que encontra a ajuda de um homem rico, com idade para ser seu pai (ou avô). Sites como o "Seeking Arrangement" e "What's Your Price", permitem que "babies", "daddies" e até "mommas" consigam "benefícios mútuos" com esquemas deste género. Os "sugar babies" colocam anúncios com o que pretendem ganhar e os "sugar daddies" e "mommas" fazem as suas ofertas, incluindo património líquido e rendimentos.

Segundo a representante do "Seeking Arrangement", Brook Urick, 10% dos utilizadores do site canadiano definem-se como LGBT. Actualmente são cerca de 52 mil "sugar babies" LGBT e 3.700 "sugar daddies" e "mommas" LGBT registados no Canadá. Urick diz que as inscrições estão a aumentar em todas as comunidades, porque este tipo de arranjo está a tornar-se, digamos, mais mainstream.

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"Muitas raparigas e rapazes que estão no site namoram pessoas que não estão no mesmo nível que eles, mas não é obrigatório que assim seja", explica Urick. "Aqui eles podem ir além do seu grupo de colegas e encontrar alguém que realmente lhes ofereça um certo estilo de vida, ou até que lhes sirva como mentor".

Mas nem sempre é assim tão fácil. Os "sugar babies" homens que entrevistei para este artigo revelaram que esta troca por dinheiro, presentes e orientação, muitas vezes resulta num controlo extremo por parte do "pai".

AS REGRAS

Scott teve o seu primeiro "sugar daddy" em 2012 e tem entrado e saído deste tipo de relacionamentos desde então. Há três anos conheceu Peter, dono de um salão de cabeleireiro de 40 anos, num site de encontros. Foi o "daddy" com quem esteve mais tempo.

Desde o começo, Peter deixou claro que ofereceria a Scott jantares caros e presentes, além de orientação profissional, mas que sexo estava fora de questão. "Ele tinha vários relacionamentos sexuais e não era disso que estava à procura no meu caso. Ele queria alguém de quem pudesse ser mentor", conta-me Scott. Apesar da atracção que sentia por Peter, Scott aceitou esse limite e manteve os outros benefícios. "Ele disse-me: 'vou dar-te apoio financeiro, mas tens que fazer tudo o que eu disser, porque isto não é de graça'".

As regras de Peter incluíam estar disponível uma vez por semana, ser pontual, não fazer barulho a comer(!), falar sempre com clareza e manter uma aparência e linguagem corporal profissionais. "Às vezes chegava atrasado e ele não ficava nada contente. Não podes atrasar-te, se a pessoa está a ajudar-te financeiramente", diz Scott. Peter criticava as suas roupas, confiscava carboidratos do seu apartamento, obrigava-o a manter o cabelo bem aparado e proibia-o de usar sapatilhas. O relacionamento acabou ao fim de dois anos, porque Peter foi à falência. "Eles querem mesmo ajudar", garante Scott. E acrescenta: "Ao mesmo tempo, não querem ser vistos com alguém desleixado".

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Scott afirma ter consciência do controlo que cede, sempre que um "daddy" estala o chicote. Admite que isso pode ser algo "muito castrador". Ainda assim, logo depois de dizer isto, e como se tivesse ligado repentinamente um interruptor, os olhos brilham ao realçar que acredita mesmo que os "sugar daddies" são a sua melhor opção. "Neste Mundo precisas de dinheiro para fazer dinheiro", conclui.

NÃO SOU TEU FILHO

Elijah, um estudante de 20 anos do George Brown College, sempre se sentiu atraído por gajos muito mais velhos. Começou a sair com um "sugar daddy" há alguns anos e já teve quatro desde então: um advogado, um contabilista, um profissional de segurança informática e um professor.

"Queria sair com homens mais velhos, porque eles pareciam mais interessados num relacionamento", explica Elijah. E conclui: "Sentia que os gajos mais jovens só queriam sexo e pronto". Conheceu três desses homens no "Grindr" e um no "Scruff". Eram generosos no que diz respeito a dinheiro e, mesmo não tendo problemas para pagar as contas, Elijah sabia que assim podia conseguir um extra. Eles davam-lhe dinheiro para o táxi e para gastar nos seus tempos livres, além de jantares luxuosos e presentes caros.

Ao contrário de Scott, os relacionamentos de Elijah foram sexuais e não duraram muito. De todos os "daddies", o contabilista foi quem ofereceu a Elijah a experiência mais extravagante — mas também era o que exercia mais controlo. Depois de semanas a mimar Elijah, tornou-se super-protector.

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"Sempre que me ligava ou enviava mensagens, se eu não respondesse logo continuava a insistir, com mensagens, e não parava de ligar até que eu atendesse", conta Elijah. Chegou a um ponto em que o "sugar daddy" tratava Elijah como se fosse seu filho. Foi quando o estudante acabou tudo. Tinham-se passado dois meses e meio. "Acho que [os sugar daddies] ficam realmente possessivos, porque percebem a quantidade de dinheiro que estão a gastar contigo", salienta.

PROBLEMAS COM A FIGURA PATERNA? NÃO É ASSIM TÃO SIMPLES

Durante a minha entrevista com Elijah, ele sugeriu que a falta de uma figura paterna na sua vida podia ser a razão do seu interesse por homens mais velhos. Quando perguntei a Scott sobre a sua relação com o pai, ele disse que não falou com ele durante quatro anos quando era adolescente e que ainda está a tentar resolver as coisas. "Nunca tive uma relação muito forte ou próxima com nenhum dos homens ou figuras paternas na minha vida", considera Elijah. "Não quero culpar ninguém, mas acho que muitos homens gay mais jovens têm problemas com o pai".

Alex Borovoy, um psicoterapeuta de Toronto que trabalha com casais e solteiros LGBT e hetero, concorda que essa atracção pode ser amplificada pela falta da presença paterna, mas não colocaria essa hipótese sobre todos os relacionamentos com "sugar daddies". "Há um desejo de orientação, de um mentor, de receber a atenção de um homem mais velho", diz Borovoy. "É algo simplista — possivelmente uma simplificação excessiva — mas faz sentido".

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Borovoy também vê o lado dos homens mais velhos quando se trata da possível ausência de um pai. Esse tópico surgiu várias vezes nas minhas conversas com "sugar babies" e, mesmo sendo impossível generalizar as coisas a uma comunidade inteira, a ideia parece comportar um certo peso.

Barry, um homem de Toronto que preferiu não me dar o seu apelido, há anos que procura um "sugar daddy". Apesar de estar num relacionamento longo com uma mulher, sente-se atraído pela ideia de ter um homem mais velho para tomar as decisões e para o mimar. Ele também me falou sobre o seu relacionamento com o pai: "O meu pai morreu quanto eu tinha cinco anos, o que me faz pensar se isso terá alguma coisa a ver com a minha atracção por uma figura paterna".

Barry tem 55 anos, note-se. Quando o contactei através de uma página de "sugar daddies" no Facebook, assumi que ele era um "sugar daddy". Mas o outro lado do espectro pode variar muito em idade e, depois de se ter relacionado com homens mais velhos no passado, Barry está interessado em ter um "sugar daddy" — se conseguir deixar a sua actual parceira, claro. E garante que não está preocupado com os inconvenientes. "Não consigo realçar com força suficiente o quão bom seria ser bem tratado para variar", justifica.

UMA JAULA DE OURO

Quando Scott e eu tivemos a nossa última entrevista, no dia em que completava 29 anos, pareceu-me feliz. Na altura estava solteiro e activo no "Seeking Arrangement". Alguns meses antes tinha conhecido um homem mais velho que lhe apresentou a possibilidade de o ajudar a pagar as mensalidades da faculdade.

Sentada à sua frente no Hazelton Lanes, uma zona comercial cara de Toronto, lugar escolhido por Scott para o nosso encontro, reparei que tinha o cabelo mais comprido e que estava de sapatilhas. Se ainda estivesse com Peter, isso não poderia acontecer. Chegou 20 minutos atrasado e, como já sabemos, um "sugar daddy" não ficaria nada satisfeito.

Quase como se me estivesse a ler os pensamentos, Scott admite que está sempre atento aos perigos deste tipo de combinações. "O meu medo é sentir-me preso", confessa. "A última coisa que quero é que alguém super rico me enfie num apartamento, que trate de todas as minhas necessidades, que me tranque numa jaula. Sim, está bem, é uma jaula de ouro de 24 quilates, mas, ainda assim, é uma jaula."

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