Fotografando a Marcha do Orgulho Crespo

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Fotografando a Marcha do Orgulho Crespo

Com a realização da 2º edição da marcha no começo de agosto, mulheres falam como a estética afro-brasileira se tornou um importante símbolo de resistência.

Foto por Hudson Rodrigues.

Em 2012, uma pesquisa realizada pela Kantar WorldPanel revelou uma realidade assustadora: apesar de 51,4% das brasileiras terem cabelos cacheados ou crespos, apenas 30% assumem as madeixas naturais. Este é só um dos motivos que levou a jornalista Neomisia Silvestre, idealizadora do projeto Hot Pente e a blogueira Nanda Cury, do Blog das Cabeludas, a criarem a Marcha do Orgulho Crespo Brasil. "Não há espaço para o nosso tipo de cabelo, na rua nós incomodamos, nos transportes públicos, em ambientes de trabalho, até em entrevistas de emprego isso ainda pode ser levado em consideração. Nossa missão é fazer com que isso nunca mais aconteça", desabafa Neomisia.

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A primeira Marcha aconteceu em 26 de julho de 2015, na cidade de São Paulo, um dia após o Dia da Mulher Negra Latino-Americana e o palco foi a Avenida Paulista. Rolou uma grande homenagem ao cabelo da mulher negra e cerca de mil pessoas foram às ruas para dizer não aos padrões de beleza. "A ideia veio basicamente dessa necessidade de resgatar a identidade e a autoestima dessa mulher negra e também ser um meio de representatividade e combate ao racismo através desse cabelo crespo", conta Silvestre.

O evento foi um sucesso e logo a imprensa, representantes políticos e vozes de coletivos estavam falando sobre a importância do encontro. "Foi tudo muito rápido, logo após a passeata em Sampa, o evento se expandiu para outros estados: Distrito Federal, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Bahia e Pernambuco", relembra a jornalista Neomisia Silvestre. "A marcha é mais do que um grito, também é local de aprendizado, rola oficina de turbantes, tranças, debates e muita música". Com a expansão do projeto, minas no Brasil todo estão sendo incentivadas a celebrar a cultura negra e a fortalecer a estética afro-brasileira como símbolo de resistência.

Foto por Hudson Rodrigues.

A sensação de pertencimento ao coletivo e a abertura da porta de entrada para as questões negras no Brasil tem começado cada vez mais cedo, como explica a trançadeira Paola Ferreira, "'Tornar-se negro' está acontecendo cada vez mais cedo. É por isso que cada vez mais pessoas estão aceitando os seus cabelos naturais. Se entendemos o que é o empoderamento, podemos compreender que este mesmo processo não se valida pela moda, mas da construção de referências diretas dentro e fora de casa."

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Foto por Hudson Rodrigues.

Este ano, o movimento cresceu e a 2ª Marcha do Orgulho Crespo Brasil voltou a invadir a Avenida Paulista no dia sete de agosto. E para aumentar ainda mais o alcance, as organizadoras contaram com o apoio da Feira Cultural Preta, maior evento de afroempreendedorismo da América Latina. "Falamos sobre as negras como agendes da economia criativa. Precisamos desses espaços, desse tipo de diálogo, a luta precisa ser de dentro para fora, sempre", detalha Neomisia. "Hoje, somos empreendedores, criamos e vendemos produtos para os nossos cabelos", explica Paola.

A presença da rapper MC Soffia, de 11 anos, conhecida por cantar músicas sobre o empoderamento das minas negras, também levantou mais um ponto de debate: a desconstrução do preconceito a partir da família. Participar deste tipo de lance, ajuda (e muito!) os pais, a mulher,e a realidade dentro da própria casa: "É bem importante para a família participar para que as crianças aceitem os seus cabelos, né? Pra que usem os produtos certos, para os cabelos delas, e não os que podem machucar a cabeça, que podem matar", comenta Soffia.

As próximas marchas devem revisitar os estados de 2015, além de incluir o Rio de Janeiro. A rápida recepção e repercussão da Marcha do Orgulho Crespo Brasil representa que o grito das minas está sendo ouvido e que não se trata só de entender a causa e fazer parte do coletivo, mas sim de dar o primeiro passo. "A melhor coisa é ouvir das pessoas depois o quanto a marcha foi importante. Como aquilo mudou uma determinada visão que a pessoa tinha e já não tem mais. Se as pessoas que participarem do evento saírem de lá sentindo-se orgulhosas do cabelo que elas têm, isso já será o melhor dos começos", conclui Neomisia. O fotógrafo Hudson Rodrigues foi na mais recente Marcha do Orgulho crespo e nos mandou as lindas fotos desta matéria.

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