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religião

A Madre Teresa meio que não tinha coração

Madre Teresa foi beatificada pela Igreja Católica, mas ela não era santa – de várias maneiras.
Madre Teresa num encontro Pró-vida. Foto via Wikimedia Commons.

Antes de Carly Fiorina, antes dos vídeos falsos sobre o Planned Parenthood, havia Madre Teresa de Calcutá. Graças à propaganda da Igreja Católica, pensamos na freira como uma santa moderna, mas a história conta uma história diferente.

Os católicos ignoram essas alegações há várias gerações. Até hoje, a igreja e seus seguidores amam Madre Teresa de paixão: Cerca de 300 mil pessoas compareceram ao Vaticano para ver o Papa João Paulo II beatificá-la (o primeiro passo para transformar um morto em santo).

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Antes de sua morte em 1997, a freira ganhou seu culto de seguidores abrindo 517 missões, muitas delas em Calcutá, a capital do Estado de Bengala Ocidental, na Índia; no entanto, alegações de corrupção financeira e médica caem sobre as missões de Teresa há pelos menos vinte anos. Serge Lerivée e Genevieve Chenard, do Departamento de Psicologia da Universidade de Montreal, e Carole Sénéchal da Universidade de Ottawa, publicaram um trabalho em 2012 detalhando os crimes de Teresa: quando médicos visitaram suas missões, eles descobriram que um terço dos pacientes ficava "deitado esperando a morte, sem receber tratamento apropriado".

O mesmo trabalho afirma que os médicos encontraram negligência e falta de alimentos e analgésicos, apesar de Teresa ter levantado milhões de dólares para a Igreja. A Slate também descobriu que, mesmo com todo o dinheiro conseguido por Teresa, suas missões parecem tão ruins agora como eram quando ela estava viva. (Durante a própria doença, Teresa ficou em clínicas da Califórnia, segundo a Slate.) As condições nas missões eram tão terríveis que as instalações foram comparadas uma vez a fotografias do "campo de concentração nazista Bergen-Belsen".

Quando confrontada com essas alegações, segundo Christopher Hitchens, Madre Teresa disse: "Tem algo de belo em ver os pobres aceitarem sua sorte, sofrerem como na Paixão de Cristo. O mundo ganha muito com o sofrimento deles".

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Mas se tinha um grupo que Teresa queria desesperadamente proteger do sofrimento eram os fetos. Segundo o New York Times, Madre Teresa usou seu discurso na entrega do Prêmio Nobel para falar contra o aborto. "Para mim, nações que legalizam o aborto são as nações mais pobres", ela afirmou. "O grande destruidor da paz hoje é o crime contra crianças não nascidas." (Pesquisas mostram que abortos acontecem com a mesma frequência, isso sendo legalizado ou não; no entanto, mulheres têm 34 vezes mais chance de morrer num aborto em países onde o procedimento é restringido.)

Em 1994, Teresa viajou para Washington, onde fez um discurso no National Prayer Breakfast, com o presidente Bill Clinton e o vice Al Gore no público. Nele, ela insistiu que se opor ao aborto era tão importante quanto evitar a fome entre crianças. "Muitas pessoas se preocupam com as crianças da Índia, com as crianças da África que morrem de fome, e assim por diante", ela reiterou. "Muitas pessoas também se preocupam com toda a violência neste grande país que é os EUA. Essa preocupação é muito boa. Mas, frequentemente, essas mesmas pessoas não estão preocupadas com os milhões sendo mortos pela decisão deliberada das próprias mães. E esse é o grande destruidor da paz hoje – o aborto que leva as pessoas a essa cegueira."

No mesmo ano, os jornalistas Christopher Hitchens e Tariq Ali produziram um documentário para a televisão chamado Hell's Angel sobre Madre Teresa; nele, Hitchens a acusava de ser "uma demagoga, uma obscurantista e uma serva dos poderes da Terra" que preferia denunciar o aborto e a contracepção a ajudar os pobres. De acordo com o Washington Post, o filme também detalha a amizade entre a freira e Charles Keating, um financista que se tornou notório por seu envolvimento com a crise de poupanças e empréstimos dos anos 90 nos EUA, e Jean-Claude Duvalier, o ditador haitiano conhecido como Baby Doc, famoso por sequestrar e torturar pessoas. Apesar de suas missões parecerem pobres, Teresa teria aceitado dinheiro desses dois homens, que arruinaram milhares, se não milhões, de vidas.

Nas décadas seguintes, Madre Teresa encorajou países e políticos a apoiar códigos morais perigosos e ultrapassados. Ela pediu que a Irlanda votasse contra a lei permitindo o divórcio em 1995 e, no ano seguinte, ligou para o candidato republicano Bob Dole para agradecê-lo por ajudar a proibir abortos tardios. Quando as fitinhas da AIDS se tornaram moda, ela se gabou de ter ajudado milhares de vítimas – apesar de odiar camisinhas, que poderiam ter salvado muita gente. Não é surpresa que essa futura santa quisesse simultaneamente combater a AIDS e o uso de camisinhas, considerando seu longo histórico de hipocrisia total.

Essa matéria foi originalmente publicada no Broadly.

Tradução: Marina Schnoor.

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