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Ativistas Estão Lutando para Tirar o Dinheiro da Indústria Petroleira das Instituições Culturais Britânicas

Muitos acham que, no contexto das mudanças climáticas e dos combustíveis fósseis destruindo o meio ambiente, é moral e eticamente repreensível que alguns dos maiores tesouros nacionais do Reino Unido sejam patrocinados pela BP.

Não é coincidência que a artista e ativista Mel Evan tenha publicado seu livro, Artwash: Big Oil and the Arts, no dia 20 de abril, cinco anos depois do desastre na Deepwater Horizon da BP ter vazado 206 milhões de galões de petróleo no Golfo do México.

Nos últimos cinco anos, uma coalizão crescente de ativistas, artistas, amantes da cultura e organizações – incluindo o grupo de arte e pesquisa Platform e as trupes de performance de intervenção Liberate Tate, Reclaim Shakespeare Company e Shell Out Sounds – têm pedido a retirada do patrocínio da indústria do petróleo das instituições culturais britânicas. Essas pessoas sentem que, no contexto das mudanças climáticas e dos combustíveis fósseis destruindo o meio ambiente, é moral e eticamente repreensível que alguns dos maiores tesouros nacionais do Reino Unido (a Tate Britain, a National Portrait Gallery, o Museu Britânico e a Royal Opera House) sejam patrocinados pela BP.

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Considerando que, em dezembro de 2014, um tribunal norte-americano multou a BP em US$ 18 bilhões e descreveu a empresa como "imprudente" e "grosseiramente negligente" em relação ao caso Deepwater Horizon, é fácil entender por que o logotipo da BP estampado nos espaços culturais britânicos é percebido como extremamente inapropriado. Na verdade, há uma sensação de que o patrocínio das petroleiras às artes vai pelo mesmo caminho do patrocínio das marcas de cigarro: em rumo de virar fumaça.

Artwash: Big Oil and the Arts mostra a jornada dos ativistas, investiga os motivos para BP e Shell terem se agarrado a grandes instituições culturais e detalha o impacto do patrocínio da BP na reputação delas, além de mostrar funcionários e artistas da galeria Tate questionando quem realmente se beneficiou nesses 25 anos de parceria.

"Entendo por que as pessoas querem tanto proteger o financiamento, que isso é precioso, mas conheço profissionais de artes que querem tomar decisões éticas e se certificar de que há um processo idôneo para decidir o que entra num espaço público", explica Mel. "O logo de uma petroleira numa galeria define o espaço e deveríamos poder dialogar sobre isso."

"The Gift", da Liberate Tate, um protesto artístico em resposta ao patrocínio de petroleiras à galeria Tate.

A narrativa comum é que o patrocínio corporativo nas artes é fundamental para o acesso generalizado. Quando passei um sábado de setembro observando a intervenção Black Square no Turbine Hall do Tate Modern, falei com visitantes da galeria sobre o patrocínio da BP à galeria, e o consenso foi: "Não é ideal, mas se isso significa que podemos entrar de graça, que seja".

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Porém, isso é um mito. "O dinheiro da BP não tem nenhuma relação com o acesso grátis à Tate", diz Mel. "A Tate tem um acordo com o governo e recebe dinheiro do Departamento de Cultura, Mídia & Esporte. Isso é dinheiro dos contribuintes – nosso dinheiro – sob a condição de manter o acesso gratuito.

"Quarenta por cento do financiamento da Tate vem do governo. Ela recebe lucros enormes de seus cafés e livrarias, renda considerável de seus 100 mil membros e ainda mais dinheiro público via Arts Council, além de doação de indivíduos. O patrocínio da BP é menos de 0,5% da renda anual da Tate. A empresa contribui virtualmente nada."

Mel sabe disso, porque, no ano passado, ativistas venceram uma batalha legal contra a Tate, forçando a instituição a revelar os números do patrocínio da BP. Esse patrocínio variou de US$ 227.500 por ano entre 1991 e 2000 a US$ 500.500 de 2002 a 2007, uma média minguada de US$ 364 mil por ano.

GlenTarman, que submeteu a requisição de Liberdade de Informação inicial em 2011, destaca por que esse patrocínio é desconfortável para tantas pessoas: "Não é trabalho da Tate levantar a indústria dos combustíveis fósseis e fazer isso no nosso nome – o trabalho da Tate é promover a apreciação pública das artes. As mudanças climáticas estão causando danos gigantescos, e um dos principais culpados usa nossa arte nacional para se vender como socialmente responsável".

O patrocínio das artes pela BP é considerado "artwashing" ("lavagem pela arte"), como o título do livro de Mel indica. "Isso fornece às empresas petroleiras uma licença social para atuar", ela frisa. "É uma estratégia de Relações Públicas cuidadosa, porque a indústria percebe que, para sobreviver, é preciso encontrar aceitabilidade fazendo algo que as pessoas acham inaceitável, e as artes têm um papel central nisso.

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"Patrocínio compra muito mais do que propaganda – é uma associação com instituições de prestígio que são centrais na imaginação e história da cultura britânica. Esses patrocínios são essenciais para suas operações diárias; sem isso, essas empresas são estrangeiras, corporações multinacionais em paraísos fiscais."

Arte e cultura refletem e modelam nossa imaginação, e não há dúvida de que as mudanças climáticas são uma questão grande e importante. Então, a possibilidade de que grandes instituições culturais possam – mesmo que subconscientemente – estar limitadas em explorar criticamente as mudanças climáticas, como resultado de sua relação com a BP, é uma preocupação legítima.

Esse é um sentimento ecoado por figuras culturais importantes como os atores Mark Rylance e Emma Thompson, o dramaturgo Mark Ravenhill, o músico Matthew Herbert e o artista plástico Raoul Martinez, que descreveu o comportamento das empresas de combustíveis fósseis como "um crime contra a humanidade em pé de igualdade com o genocídio".

Os ativistas temem que a posição de Lorde John Browne como presidente dos Curadores da Tate possa minar discussões internas sinceras sobre o patrocínio da BP. Lorde Browne, que era diretor da Cuadrilla (a empresa que defende o fraturamento hidráulico na Inglaterra) até há algumas semanas, começou a trabalhar para a BP em 1969 e foi o chefe-executivo da empresa de 1995 a 2007.

O movimento de desinvestimento que floresce nas universidades e em grupos religiosos do Reino Unido é mais uma evidência de que a associação com a indústria de combustíveis fósseis está se tornando tóxica. Kevin Smith, da Liberate Tate, destaca por que isso é um marco: "Quando universidades e instituições culturais se desvinculam da indústria de combustíveis fósseis, isso cria uma distância entre essas empresas e a sociedade mainstream. Isso mina sua legitimidade social e base de poder, e estigmatiza as companhias petroleiras".

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Entrei em contato com a assessoria de imprensa da BP para perguntar se, em vista do movimento de desinvestimento, a empresa tinha confiança em manter sua parceria com a Tate, a National Portrait Gallery, o Museu Britânico e a Royal Opera House e para saber se a companhia temia que o patrocínio da indústria petroleira se tornasse socialmente inaceitável, assim como o patrocínio da indústria do cigarro.

A resposta da BP foi um tanto confusa: "Rahul, temos patrocinado as artes há décadas porque as instituições de arte se beneficiam e desejam isso, e, assim como elas, a BP tem um papel nas atividades culturais e de negócios do país – empregamos 15 mil funcionários aqui, investimos milhões de libras em empregos e fornecendo energia que as pessoas consideram como garantida".

Então, enquanto consideramos o trabalho duro da BP como algo garantido, 2015 pode ser um ano fundamental na batalha contra o petróleo nas artes, já que neste ano ficará decidido se essas instituições vão renovar os acordos de patrocínio com a BP, que acabam em 2016.

"Não vamos desistir", garante Mel. "É algo inspirador e emocionante – é um tempo de possibilidades. Sou de uma comunidade de artes; então, o fato de termos tantos artistas, ativistas, dramaturgos, visitantes de galeria, a equipe do Tate, membros e curadores envolvidos, pensando no que está acontecendo aqui, é muito importante."

Ver um grupo disparatado de pessoas comuns se organizando, participando de um movimento formidável para desafiar o papel de uma das corporações mais controversas do planeta no coração da vida cultural de um país, mostra que a democracia ainda está viva.

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"É mesmo um ato de democracia", concorda Mel. "A urna não é o suficiente. Se esses espaços são realmente públicos, então nós, o público, devemos poder mudá-los."

Graças ao trabalho incansável dos ativistas, a questão não é se o patrocínio da indústria do petróleo vai acabar, mas quando.

Siga o Rahul no Twitter.

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Tradução: Marina Schnoor