FYI.

This story is over 5 years old.

Música

É pra esse cara que você liga quando quer fazer uma rave ilegal na Inglaterra

“Quando a polícia vem, eles não estão no controle, nós estamos no controle. Eu mando eles embora. Essa é uma das principais razões para fazer isso.”

A VICE UK lançou Locked Off, um documentário sobre a cena de raves ilegais na Inglaterra (e que esperamos ter legendado em pt-br em breve). O filme acompanha adolescentes de todo o país que, com ajuda de corta-cavilhas e de complexas brechas nas leis de ocupação de imóveis, transformam espaços sem uso e armazéns vazios em locais para festas insanas.

Um dos trechos do documentário acompanha Jimmy Whyte, um cara de 22 anos de Londres que funciona como um fixer (aquele produtor agilizadão que "faz acontecer") de raves, caçando espaços para os promotores dos eventos, depois usando sua experiência para invadi-los, lidar com a polícia e fazer a segurança. Antes do lançamento do filme, falamos com Jimmy sobre o que é preciso para fazer uma rave.

Publicidade

VICE: Como você explica o que faz? Você não é realmente um produtor de eventos…
Jimmy: Bom, eu era. Eu dava minhas próprias festas. Mas agora prefiro trabalhar mais nos bastidores, ajudando outros a organizarem suas festas. Alguém entra em contato comigo, pedindo um prédio ou algo assim, ou me pedem para falar com a polícia no evento para eles. Eles me dizem o que precisam e eu ajudo com o que for. Isso é conseguir um lugar, falar com a polícia, prestar tipo uma consultoria sobre o que eles precisam fazer.

Vamos entrar nas especificidades. Como você acha um armazém em desuso e garante o lugar para a realização da festa?
Se é um prédio pouco vigiado, vamos lá no dia e montamos tudo. Mas se é um local cinco estrelas, um lugar de alto nível, é bom deixar a polícia saber que estamos lá, porque aí eles precisam de ordens do tribunal para tirar a gente, então ocupamos por algumas noites antes da festa, o que nos dá um pouco de tempo. Mas pode acontecer de tentarmos entrar e foder tudo, aí ficamos sem prédio para fazer a festa. Depende realmente do tipo de prédio.

Quais foram alguns dos melhores lugares que você conseguiu?
Fizemos uma festa no QG da Burberry, em Piccadilly Circus. Eles deixaram uma janela aberta. Geralmente digo isso em sentido figurado, mas naquela vez eles literalmente deixaram uma janela aberta. E sabe o SE1, o clube que fechou um tempo atrás? Também entramos. Assim que o lugar fechou, invadimos e fizemos uma festa lá.

Publicidade

Então na maioria das vezes a polícia aparece?
Sim, e eu mando eles embora. Muitas e muitas vezes a polícia chega e eu deixo eles sem fala. Eles simplesmente não sabem o que fazer. Eles têm que ligar para a porra do inspetor chefe para saber o que fazer. Essa é uma das partes mais engraçadas da noite. Às vezes curto mais falar com a polícia que a festa em si.

Quando a polícia chega, às vezes eles simplesmente deixam a rave acontecer?
Bom, eles não podem vir e desligar tudo, porque dizemos não. Me dê uma boa razão. Há muitos buracos nisso por causa da lei de ocupação. Com essa lei, você tem permissão de ter até 500 pessoas num prédio antes que a festa seja considerada ilegal. Mas quando 500 pessoas estiverem no prédio, vai ser difícil acabar com a festa.

E pode ser perigoso dispersar 600 pessoas…
Bom, veja o que aconteceu com a Scum Tek no Halloween. A polícia surtou, os ravers surtaram.

O que é preciso para que eles realmente consigam acabar com uma festa?Violência, overdose ou algo assim precisa acontecer para que eles possam entrar. A Seção 63 [do Código de Justiça Criminal inglês] basicamente diz que você precisa ser convidado para entrar no lugar.

Como vampiros?
Rá! Isso mesmo.

"Quando a polícia vem, eles não estão no controle, nós estamos no controle. Eu mando eles embora."

Mas você não está desobedecendo alguma lei?
Claro, o que estamos fazendo é ilegal, mas faço o possível para não me meter em nada muito sério. Por exemplo, vou analisar o prédio e encontrar o jeito menos criminoso de entrar.

Publicidade

Quantas vezes você foi preso ou formalmente acusado durante ou depois de um evento?
Nunca.

E você faz isso há seis anos…
Sim, e nesse tempo só sei de uma pessoa que foi presa, e porque ela fez merda numa rave. Mas só sei de um caso. Nunca vi nenhum tipo de acusação formal, e fico bem chocado com isso. Porque com todos os danos, prejuízos, lavagem de dinheiro, evasão fiscal — muita gente deveria ir pra cadeia.

E por que isso nunca aconteceu, na sua opinião?
Porque a polícia não sabe de quem ir atrás. Se o promotor da festa for meio óbvio sobre quem está fazendo a rave, então a polícia vai bater na porta dele e dizer "te aconselhamos a não dar essa festa". Eles não dizem "Não dê essa festa ou vamos te prender". É que há muitos buracos na lei, se não a polícia prenderia os promotores de cara e os acusaria de "conspiração para realizar uma rave ilegal". Mas eles não fazem isso. Eles apenas aconselham. Se o governo não quisesse que essas coisas acontecessem, eles teriam tapado esses buracos.

As pessoas falam sobre reclamar espaços em desuso como uma ação política. Você descreveria suas raves como um ato de resistência?
É isso que faço. Gosto de acompanhar o lado político das ocupações. Organizei um protesto grande em Shoreditch, o protesto pela liberdade de fazer festas. Me orgulho disso. Ver a polícia parada lá, sem poder fazer nada para impedir. É disso que gosto. Curto mais o lado político da coisa que realmente fazer a festa. Por isso as raves eram tão grandes nos anos 80, porque o clima era mais político. Não era apenas uma balada, era sobre tomar uma posição.

Publicidade

O que não entendi direito é o que você ganha com isso. Por que você se coloca em risco para organizar essas festas para outras pessoas?
Claro, há sempre aquele lado de uma mão que lava a outra. Há custos que precisam ser cobertos, porque estou colocando o meu na reta. Mas honestamente, faço isso principalmente por um motivo: gosto de anarquia. Adoro. Faço isso para poder dizer foda-se para o sistema.

O que você vê como anarquia?
Sentir que estou acima do sistema, não sendo um cidadão de bem o tempo todo. Quando a polícia vem, eles não estão no controle, nós estamos no controle. Eu mando eles embora. Essa é uma das principais razões para fazer isso.

No começo do filme, você esconde o rosto e diz que não quer escrutínio por causa das "coisas que já fez na cena". Mas no final, você quis mostrar o rosto porque queria que as pessoas soubessem que era você. Por quê?
Tenho orgulho do que faço, independente de qualquer coisa. Quando meus netos nascerem, vou poder dizer: "Eu fiz isso, eu fiz aquilo". Não dou a mínima para o que acontecer depois, mesmo se a polícia tentar usar a filmagem como evidência — não tem nada ali que possa realmente me incriminar, porque eu disse as coisas certas. Não faço mais nada que seja incriminador na minha vida cotidiana. Já tive vários empregos. Não sigo uma vida de crime. Só que desde que me envolvi nisso, me apaixonei. É como meu alter ego. Você pode frequentar esses lugares e é muito diferente do estilo de vida normal.

Obrigado, Jimmy. Te ligo da próxima vez que meus vizinhos reclamarem do barulho.

Todos os pedidos da VICE de comentários da polícia para o documentário Locked Off foram negados.

Para quem segura bem um inglês, o documentário Locked Off da VICE UK pode ser assistido aqui.

Tradução: Marina Schnoor