É isso que acontece quando um fotógrafo do Instagram passa para o filme

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É isso que acontece quando um fotógrafo do Instagram passa para o filme

Com mais de 100 mil seguidores, o fotógrafo Jayscale construiu um perfil impressionante fotografando paisagens urbanas incríveis, de tetos de cidades do mundo inteiro – incluindo em sua cidade natal, Toronto.

Todas as fotos por Jamal Burger, a.k.a. Jayzcale.

Na fotografia hoje, erros catastróficos são coisa do passado. Tirar uma foto muito escura, muito clara ou simplesmente porcaria pode ser completamente evitado, ou remediado facilmente com as câmeras modernas e tecnologia de edição. Quem sabe o básico de qualquer espertofone tira fotos bem impressionantes.

Mas fora do reino das selfies e fotos de comida, a tendência de instagramar e ganhar likes com fotografias artísticas e cinematográficas é gigante. Sendo parte dessa cultura ou não, você provavelmente já viu o nome Jayscale mais de uma vez na sua TL. Com mais de 100 mil seguidores, ele construiu um perfil impressionante fotografando paisagens urbanas incríveis, de tetos de cidades do mundo inteiro – incluindo em sua cidade natal, Toronto.

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Jayscale é Jamal Burger, um ex-estudante da Universidade de Toronto que largou o curso de cinesiologia, explodiu no Instagram e ano passado passou a fotografar em tempo integral para marcas como LG, Budweiser e Heineken. Agora ele é parte de um pequeno coletivo de fotógrafos do Instagram que não apenas tira fotos impressionantes, mas que ganha a vida fazendo isso.

Apesar de seu sucesso, Burger ainda se considera só um morador de Toronto. Até recentemente, você encontrava o cara trabalhando na Livestock – uma loja de streetwear e tênis na Chinatown de Toronto, onde ele começou fotografando produtos de empresas como Adidas e Nike. Agora ele começou o desafio de fotografar um projeto inteiramente em filme em três cidades: Toronto, Nova York e Tóquio. Conversei com Burger sobre o que ele aprendeu partindo para o lado old school e o que sua carreira o ensinou.

VICE: O que te atraiu na fotografia?
Jayscale: Quando era mais novo, eu era fascinado por vídeo, por mídia em geral. Estudei isso durante o ensino médio e estava interessado em mídia esportiva, o que eventualmente me fez entrar para a ciência esportiva [cinesiologia]. Na época senti que a mídia talvez não fosse meu caminho. Na faculdade, eu estava estudando ciência esportiva, mas cheguei num ponto onde percebi que a faculdade não era uma prioridade para mim, então comecei a procurar por algo que pudesse ser uma prioridade.

Em casa éramos só eu e minha mãe – agora ela não paga por nada, estou cuidando de tudo, porque essa é a casa de uma mãe solteira. E num ponto pensei: "Sabe de uma coisa, não vou gastar outros $10 mil [na faculdade], mesmo que eu esteja quase concluindo, porque isso não é o que quero fazer". Decidi tirar um ano de folga e tentar algumas coisas para ver onde isso me levava. Na época o Instagram ainda era supernovo, e a fotografia parecia algo legal de se fazer, então comecei a tirar fotos, só no meu celular na época. Eu usava minha conta antiga, com fotos de família e coisas assim. E num ponto as pessoas começaram a dizer que minhas fotos eram boas, então decidi fazer uma conta só para a fotografia. Isso foi em janeiro de 2013.

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Quando você fez o @jayscale?
Sim, foi o Jayscale.

Vi suas fotos do começo e notei que mesmo nessa época você tinha um olho incrível para a fotografia. É impressionante porque muitas pessoas não mostram esse tipo de progresso quando fotografam.
Acho que há prós e contras nisso, porque quando isso acontece tão rápido, você é jogado no fogo. Especialmente quando tem esse tipo de seguidor, porque o que faço é analisado o tempo todo, tipo "Ah, você deveria estar fazendo isso em vez disso". Sem dúvida é um desafio, porque no Instagram, você não pode dar uma pausa, você não pode deixar de postar fotos por um tempo se quiser continuar relevante.

Sua conta é mais conhecida pelas fotos de lugares altos. Quando começou, você tirava fotos das ruas e eventualmente passou a trabalhar em fotos de telhados de prédios?
Quando comecei a tirar fotos, eu queria fotografar coisas legais nas ruas. A ideia do Jayscale era mostrar fotos em grayscale [preto e branco]. Eu só estava tentando tirar fotos em preto e branco no meu celular para ver onde isso me levava. Um dia pensei: "Vou tentar ver a cidade de um ponto de vista diferente".

Queria ver a cidade de um novo ângulo, de um lugar onde nem todo mundo pudesse ir, então deixei minha curiosidade me levar até esse nível, essas alturas, e comecei a ver a cidade dessa perspectiva. Era muito legal, e acho que isso foi o que realmente começou as coisas para mim, porque percebi que tinha muita gente fotografando a cidade do alto antes, mas ninguém fazendo isso realmente prestava atenção no estilo de vida das ruas. Senti que eu podia combinar meu amor por tênis e altura de maneira interessante e única.

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Consegui ter acesso a paisagens incríveis – lugares onde poucas pessoas podem subir, com tênis que nem todo mundo consegue ter. Foi divertido por um tempo, mas isso saiu de controle, porque às vezes as pessoas começavam a sair do conceito e não estava mais necessariamente na forma verdadeira.

O que você quer dizer com outras pessoas "saindo" do conceito das fotos nos telhados?
Eu fazia isso apenas para combinar vistas legais e tênis legais, mas assim que as pessoas começaram a postar fotos de telhados ou usar a mesma hashtag, eu não queria mais estar associado a isso. Isso podia ser um par de Vans ou um Converse, ou tênis velhos, mas eu não estava fazendo isso por causa disso. Eu estava tentando fotografar tênis legais com vistas incríveis, e senti que isso estava sendo maculado de um jeito ou de outro.

Não tinha pensado nisso assim: pessoas fotografando tênis escrotos em telhados.
Sim, tudo tem uma data de validade, especialmente com o Instagram e outras redes sociais. Se algo ganha muita popularidade, isso vai ser derrubado rápido. Tipo, todo mundo agora está no Snapchat do DJ Khaled e usando as citações dele, mas isso não vai mais ser relevante em duas ou três semanas. É assim que as coisas funcionam.

Você deve ver coisas e pensar "Isso é inspirador, isso é legal, gosto disso", mas ao mesmo tempo não quer ficar preso numa tendência. Como se manter à frente das coisas que estão ganhando popularidade?
Simplesmente fico fora disso. Se vejo algo que parece ser uma tendência, simplesmente evito. Isso me coloca numa bolha, numa caixa, nessa posição onde sou obrigado a encontrar algo novo para fotografar, e me faz pesquisar mais e cavar mais fundo. Tenho que colocar mais esforço no que estou fazendo. Se vejo algo que se torna tendência, evito isso completamente ou dou meu próprio toque, mas muitas vezes me vejo perdido. Você vai me ver deixando de compartilhar meu trabalho, ou ficando fora do Instagram por uma semana ou duas. Acontece. Não dá para elevar seu nível todo dia ou melhorar constantemente. É um processo, e às vezes você tem que dar um passo para trás para dar um passo para frente. Você não pode continuar dirigindo até ficar sem gasolina.

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Isso é interessante. Como fotógrafo, às vezes quero dar um tempo do Instagram, mas me sinto obrigado a postar porque quero continuar relevante, então posto coisas que não são necessariamente meu negócio ou que não representam minha visão, porque tenho que manter as pessoas conscientes de que ainda estou aqui. Como você sabe que precisa dar uma pausa?
Quando as coisas parecem demais, cara. Se sinto que estou forçando algo, ou não tenho nada no momento, dou um passo para trás. Se não posso dar um passo para trás, tento viajar. É realmente difícil estar nesta posição onde as pessoas esperam que eu vá melhorando e melhorando, porque sempre que melhoro, fica muito mais difícil produzir nesse nível. Se consegue se lembrar o quanto gostava disso no começo, você consegue superar. É só um processo de superar isso mentalmente.

Você sente que o Instagram influencia o que você quer realmente fazer com fotografia?
Isso me coloca numa mentalidade onde tenho que produzir continuamente, e com isso, não tenho tempo para me afastar e trabalhar em certos projetos que quero. Não posso parar por um tempo e dizer "Quero ir para esse lugar e só fotografar esse tipo de coisa". Isso me coloca numa mentalidade estruturada onde fico preso postando o mesmo tema e o mesmo tipo de foto porque as pessoas gostaram. Por isso me aventurei fora disso, e decidi fotografar em filme e coisas que não são necessariamente para o Instagram. Isso é um processo de aprendizado para mim.

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Você mencionou que cresceu numa casa apenas com a sua mãe, e eu sei que você começou a fazer sucesso quando fotografava produtos para a Livestock. Como isso influenciou onde você está agora?
Na época, eu tinha uma câmera, uma Fuji XT1. Vendi um monte de tênis para comprar aquilo. Eu tinha a câmera, mas queria sair do meu emprego [para fotografar], e sabia que [a câmera não era boa o suficiente] para conseguir trabalhos de qualidade. Foi aí que a Livestock me pediu para começar a fotografar tênis para eles. O dono da Livestock acreditava no que eu estava fazendo antes de todo mundo e me arranjou uma câmera melhor. Foi a primeira vez que senti que havia pessoas que acreditavam em mim. Eu não estaria fazendo o que faço hoje sem ajuda deles. Isso foi mais ou menos nesta época do ano passado.

Como as coisas mudaram desde então?
Eu meio que tive sorte, porque comecei a levar o Instagram a sério quando a maioria das pessoas não levava. Era só eu, Visionelie e alguns outros. Eu tinha uns 20 mil, 30 mil seguidores na época, e não havia muita competição, então as pessoas me notaram. As pessoas gostaram do que eu estava fazendo. Não vou dizer que gostei das fotos que tirei, mas eu estava fazendo isso na época e isso fazia sentido. Foi um processo de aprendizagem. Comparando com onde eu estava ano passado, foi um longo caminho.

Vamos falar sobre o seu projeto em filme. Comparado com quando você fotografava em digital, que tipo de coisa você precisa pensar diferente quando fotografa com filme?
Quer dizer, não comecei isso necessariamente como um projeto em filme. Eu só queria explorar a oportunidade de fotografar com filme, porque você vê muitos fotógrafos incríveis que nunca tiveram um computador, que nunca tiveram o equipamento que temos hoje. O fato é que com filme, você só tem uma chance de capturar aquele momento. Você se torna mais seletivo, fica mais atento, fica mais íntimo da foto que está tirando – você precisa ser cuidadoso porque não quer desperdiçar uma foto, porque filme custa caro. Isso acrescenta uma camada. Você leva isso mais em consideração porque seu timing tem que ser perfeito e sua posição tem que ser perfeita.

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O mais frustrante é perder uma foto que você provavelmente não perderia com a sua DSLR, e é isso que me faz apreciar o que os fotógrafos de filme fizeram vinte anos atrás, porque eles pegaram coisas muito loucas. Eles conseguiram capturar coisas que vi e testemunhei com meus próprios olhos, mas que perco porque não sou tão bom ou porque não tenho ainda os instintos certos.

Seu projeto vem de suas viagens para Nova York e Tóquio, e mesmo de Toronto. Quais as vibes que você sentiu nessas cidades diferentes?
Quando eu estava em Nova York, a coisa que eu queria capturar era o entusiasmo tácito que as pessoas têm, ou mesmo como é viver em Nova York. Acho que Nova York tem muitas qualidades únicas e interessantes, e acho que isso se converte através de como as pessoas parecem e se apresentam na cidade. Eu queria capturar esse tipo de mensagem misturadas e escondidas de oportunidade em toda parte.

Tóquio é uma cidade agitada e as pessoas são mais reservadas, mas há muitas emoções escondidas. Stress, diversão, amor. A cidade se move muito rápido, com as pessoas indo e voltando do trabalho, então elas não têm tempo de mostrar esse lado delas. Capturar o momento em que as emoções aparecem – alguém saindo da escola ou andando de trem – foi a chave. Além disso, o avanço do lugar – a cidade é de outro mundo, há muita tecnologia para integrar às fotos.

Sinto que Toronto é um lugar muito diferente. Há tanta cultura aqui que é difícil identificar o que nossa cultura realmente é. Quando estou fotografando em Toronto, é mais como se eu fosse livre. Não penso nisso, não há um tema. Se acho que algo dá uma boa foto, vou lá e fotografo. Vivi aqui minha vida inteira e sinto que tenho um entendimento do que é a cultura de Toronto, mas é difícil explicar isso. Isso está por toda parte. Gosto disso porque é algo constantemente renovado.

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Qual foi a principal coisa que você tirou do filme e que agora pode traduzir na sua fotografia em geral?
Damos muita coisa como garantida. Estamos num ponto onde você pode confiar mais no equipamento do que na sua habilidade, diferente de como os fotógrafos de filme provavelmente faziam. Falo da minha perspectiva, todo mundo é diferente. Com o digital, você pode tirar quantas fotos quiser num segundo. Com filme, você precisa alinhar todas as variáveis. O fato das câmeras de hoje serem tão poderosas significa que acabamos esquecendo que podemos não ser tão bons quanto achamos. Fotografar com filme e passar esse tempo confiando mais em mim mesmo realmente me ajudou com isso. Às vezes, quando perco uma foto e fico puto comigo mesmo, eu só penso "Foda-se, Olha, você não é bom. Melhore". Mesmo se você acha que é bom em alguma coisa, dar um passo para trás e explorar um caminho diferente do que você está acostumado pode ser incrivelmente valioso.

Essa entrevista foi condensada para dar mais clareza.

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Tradução: Marina Schnoor

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