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"Mad Max: Estrada da Fúria" É o Filme de Ação Feminista que Você Estava Esperando

Um belo filme de ação, distopia, sororidade e sobre a queda do sistema patriarcal. Não deixe o feminismo te assustar e vá ver o filme que chega aos cinemas no dia 15 de maio.

Mad Max: Estrada da Fúria é, como você já deve esperar, um filme pós-apocalíptico frenético, cheio de estradas poeirentas e desertos sem fim com um tornado de fogo ocasional. São duas horas de bandidos em veículos loucamente turbinados tentando atropelar a gangue variada de Imperator Furiosa (Charlize Theron), Max Rockatansky (Tom Hardy) e cinco mulheres duronas que querem escapar de seu destino como "procriadoras" para o tirano Immortan Joe. Se você achou que parece divertido – e é –, então devia assistir.

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Para minha surpresa, Estrada da Fúria também é um filme explicitamente feminista, com Furiosa e Max juntando forças para derrubar um patriarcado literal. Enquanto o ponto de vista se centra principalmente em Max, a protagonista é claramente Furiosa, que, com seu objetivo mortal, a prótese no lugar da mão e uma vontade de ferro, vai arrastando Max, o outro mocinho, e todos os muitos vilões em seu caminho. Mais tarde no filme, encontramos uma sociedade matriarcal de mulheres mais velhas que fornecem fogo à moda sniper aos protagonistas. O filme passa facilmente no teste de Bechdel apesar de um dos meus diálogos favoritos entre as mulheres ser "sobre" homens: na cena, uma mulher mais velha discute sua habilidade de usar apenas uma bala por morte. Numa era do cinema em que o retrato e o marketing de "personagens femininas fortes" são cada vez mais discutidos, especialmente quando se trata de filmes de ação e de super-heróis, Estrada da Fúria é excepcional.

Trailer oficial de Mad Max: Estrada da Fúria.

Para quem só se lembra de Mad Max 3: Além da Cúpula do Trovão, esse tipo de envolvimento sério com temas de patriarcado e poder numa franquia de ação pode parecer deslocado. Mas os primeiros dois filmes, Mad Max e Mad Max 2: A Caçada Continua, são duas obras de alto conceito. Assisti recentemente aos três títulos de novo e fiquei impressionado com o diferente nível artístico dos dois primeiros. Mad Max, o original, foi líder do movimento Australian New Wave, com os envolvidos acrescentando conscientemente arte e complexidade a um filme sobre perseguições de carro e motoqueiros selvagens. Esse é um filme paciente: Max não fica tão louco até os últimos dez minutos da película, quando o enredo de vingança surge. Para mim, o resto do filme parece um tanto baboseira pré-apocalíptica, com conversas sobre aonde ir, o que comer, o que dirigir e viagens para se buscar sorvete.

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Quando o diretor George Miller decidiu fazer A Caçada Continua, com um orçamento muito maior e surpreso com o impacto do primeiro filme, ele invocou O Herói de Mil Faces, de Joseph Campbell. Ele pensou que Max deveria se tornar um herói universal. Encontramos o protagonista no meio de sua jornada do herói, o estranho de uma terra devastada chegando ao que sobrou da civilização, a protegendo e aprendendo lições com aqueles à sua volta; depois, ele retornava à sua terra devastada no final da história. Mas, diferentemente do herói arquetípico de Campbell, Max nunca consegue voltar até sua casa, porque ela não existe mais.

Trailer de Mad Max (1979).

Além da Cúpula do Trovão teve um tipo de impacto diferente. Muitos fãs dos dois primeiros filmes acharam que a profundidade foi sacrificada pela bagunça de grande orçamento do terceiro, mas outros – especialmente décadas depois – associam a frase "Mad Max" a "Dois homens entram, um homem sai". Assim, cortamos para o clipe da Tina Turner na MTV, que chegou ao topo das paradas no mundo inteiro. O filme pode não ter a mesma profundidade dos dois primeiros, mas sem dúvida ajudou a estabelecer Mad Max como um marco cultural, mesmo para gente que não viu nenhum dos outros títulos.

E aí esperamos 30 anos por Estrada da Fúria.

Nos últimos anos, e entre muitas críticas consistentes, personagens femininas fortes apareceram em alguns grandes filmes de ação. Algumas eram mestres de artes marciais, outras usavam mágica, atiravam com fuzis ou pilotavam espaçonaves. No entanto, quando a única função de uma personagem num filme é ser atraente para os personagens masculinos (ou para o público masculino), ficar em perigo e ser resgatada ou ser passiva e respeitosa com o protagonista homem, isso não é feminismo. Quando a cientista social Katy Gilpatric pesquisou mulheres violentas em filmes de ação de 1991 a 2005, ela descobriu que, apesar da abundância de mulheres duronas, elas eram principalmente relegadas a papéis submissos e envolvimentos românticos, mesmo sabendo lutar kung fu.

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Mas algumas obras do cinema serviram como precursoras notáveis para Estrada da Fúria. A série Alien, por exemplo, não só tinha a icônica Ellen Ripley (Sigourney Weaver) e a supersoldado Vasquez (Janette Goldstein) como um enredo baseado na limpeza dos cacos da cultura patriarcal tanto no exército como nas empresas. Em Exterminador do Futuro 2, Sarah Connor (Linda Hamilton), aquela dos bíceps incríveis, está cercada de homens que não acreditam nela. Enquanto isso, ela ensina ao eventual salvador da humanidade (seu filho) tudo que ele precisa saber sendo uma mãe forte, além de ainda achar tempo para lutar contra o apocalipse robô.

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O paralelo mais direto, até porque foi inspirado em películas como Mad Max, é Tank Girl. O filme não só tem Ice-T como membro de uma gangue de cangurus geneticamente modificados mas também Lori Petty fazendo uma heroína sexualmente liberada que pilota um tanque numa era pós-apocalíptica. Ela derrota o vilão amante de poesia Kesslee (Malcolm McDowell) e sua empresa maligna Água e Energia. O traço comum desses três filmes é a natureza do inimigo (macho, corporativo e que despreza a heroína de maneiras chauvinistas) e a clareza com que essas heroínas planejam e executam seus ataques. Não existe filme de ação feminista acidental.

E é assim com Estrada da Fúria. O diretor George Miller pediu a Eve Ensler, autora de Monólogos da Vagina, para se encontrar com o elenco e a equipe, especialmente com as mulheres interpretando as reprodutoras em fuga. Miller queria que as atrizes aprendessem sobre mulheres exploradas ao redor do mundo; além disso, ele trabalhou com Ensler para replicar as características e dinâmicas de tal grupo. A exploração sexual das mulheres por Immortan Joe é apenas a consequência mais óbvia da tirania patriarcal. Em Estrada da Fúria, todo mundo é apenas partes de um copo: úteros e seios para as mulheres (bandidos bebem muito leite humano), músculos e sangue para os homens.

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O patriarcado pode parecer empoderar a masculinidade, mas só limita os homens a seus papéis frequentemente (auto)destrutivos. Alguns dos guerreiros no exército de Immortan Joe lutam na esperança de morrer em batalha e chegar ao Valhalla; outros, por sua vez, são meros "sacos de sangue", e seus fluidos corporais são usados para manter vivos guerreiros mais valiosos. (No começo do filme, o status de Max como doador universal tipo O é o que o torna cobiçado.)

Tenho medo de que algumas pessoas se desanimem com o título sabendo de seu contexto feminista. O que seria uma pena, porque o filme é fantástico, calibrado perfeitamente para agradar fãs do gênero de ação e da franquia Mad Max em particular. Mas são esses temas que trazem significado às acrobacias insanas e máquinas de guerra absurdas, além de nos fazerem torcer, enquanto os personagens sofrem, lutam, triunfam e morrem.

Sendo assim, aproveite o filme. E não deixe o grande F te assustar.

Mad Max: Estrada da Fúria chega aos cinemas no dia 15 de maio.

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Tradução: Marina Schnoor