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Edição Perfis

Meu Papai, o Fisiculturista

Uma entrevista com a fotógrafa Aneta Bartos e com o seu pai, Zbigniew, tema central do seu projeto 'Dad'.

A edição The Profiles da VICE incluiu um ensaio de fotografias de um velhote de 69 anos. Ele é pai da artista Aneta Bartos, conhecido simplesmente como Dad. Acompanho o trabalho de Aneta desde 2012, quando cobri pro blog LightBox da TIME uma exposição coletiva da qual ela participou. Conhecemo-nospessoalmente no ano passado, quando escrevi sobre sua exposição Boys pro blog Camera Club of New York. A exposição composta de polaroidesde rapazes se masturbando foi instalada num dos quartos de um decadente hotel Flatiron e me fez perceber que Aneta pensa seu trabalho de uma maneira mais abrangente do que a simples criação de imagens para serem compartilhadas – ela controla seu contexto cuidadosamente e tem uma habilidade quase artesanal em termos de cor e qualidade de impressão. A artista é sensível a seus temas e tem muito cuidado com a forma como as imagens desses temas são apresentadas.

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Há uns meses, ela me mostrou fotos do seu pai fisiculturista, na Polônia. Usando uma Kodak Instamatic com filme vencido, ela captou Dad em paisagens naturais: uma figura poderosa e impositiva contra um cenário pastoril de crepúsculos dourados. A estética das imagens resultantes oscila entre álbum familiar e postêres de propaganda soviética, mas a qualidade das fotos é sempre onírica. “Sua presença me leva de volta à minha infância, ao que parecia um infinito esticar-se dos dias num mundo sem preocupações ancorado pelo meu poderoso e amoroso pai”, conta Aneta. “Penso em como seu comprometimento com educação, preparo físico, comida orgânica e a simplicidade de uma vida frugal o mantiveram tão jovem e cheio de vitalidade”. Desde que publicamos estas fotos, ela voltou à Polônia e continuou a fotografar. Quando vi as fotos mais recentes, não pude deixar de pensar que a série Dad talvez seja o seu melhor trabalho até hoje. Mas queria saber mais sobre a relação entre fotógrafo e fotografado, porque ela não estava fotografando um modelo qualquer. A dinâmica de fotografar alguém muito próximo a você é diferente. Conversei com Aneta e seu pai, Zbigniew, pra entender melhor o processo.

VICE: Zbigniew, como você cuida da saúde?
Zbigniew Bartos: Antes de fazer 60 anos, eu comia de tudo, sem dietas especiais ou restrições. Durante esse tempo, a maior parte da comida na Polônia era natural e saudável, portanto perder umas três horinhas na academia três vezes por semana parecia ser o bastante pra ficar saudável e em forma.

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Depois que fiz 60, entretanto, comecei a prestar mais atenção à nutrição. Em primeiro lugar, toda a minha comida vem diretamente dos fazendeiros que eu conheço. Preparo eu mesmo a maior parte da minha comida. E também faço meu próprio vinho e minhas próprias tinturas (medicamentos naturais).

Como pequenas quantidades poucas vezes ao dia me certificando de que as refeições contenham um bom equilíbrio entre ácidos e alcalinos. Sempre consumo muita proteína, tanto de carnes quanto de vegetais. Como alho, cebolas, tomates e rabanetes diariamente e minhas frutas favoritas são maçã e mirtilo selvagem colhido na floresta.

Quanto à minha aventura com fisiculturismo, acredito que tenha começado a competir muito antes de qualquer fisiculturista no mundo. Ganhei minha primeira competição em 28 de fevereiro de 1964.

Minha experiência de 50 anos de fisiculturismo, que,aliás, sempre foi um hobby e não profissão, me deu muito prazer e energia, isso sem contar o simples fato de que isso moldou meu corpo muito próximo aos  ideais de masculinidade da Grécia Antiga.

Aneta, como os ensaios se desenrolam? Como é fotografar seu pai?  Tirei umas fotos dos meus pais e isso me fez ver o quanto eles estão velhos.
Aneta Bartos: Acabei de voltar pra Nova York vindo da Polônia, onde dei continuidade a esse projeto, que começou no verão passado. Consegui fotografar meu pai muito rapidamente e ainda era uma fase experimental. As possibilidades pareciam mais amplas dessa vez. Fotografei-o na sua academia, que fica nos fundos de uma igreja, na sua casa, possivelmente emseu porão (que contém suas poções mágicas que datam desde antes do meu nascimento)enas ruas da cidade. Se ele se classificar, adoraria fotografá-lo durante o campeonato mundial na Cidade do México, no outono.

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Antes das fotos que tirei no ano passado, nunca tinha fotografado meu pai. A ideia veio dele, na verdade, quando ele me pediu pra tirar umas fotos boas do seu corpo antes de fazer 70 anos. Quando decidi fazer todo um projeto ele não pareceu intimidado.

No primeiro dia do ensaio, meu pai começou a me dar lições sobre luz e o melhor momento pra capturar o tônus muscular. No começo achei engraçado, mas depois isso começou a interferir na minha direção do ensaio, daí enchi o saco e gritei:“Pai, você agora é só um modelo e modelos não falam! Não sou sua filha (agora) também, então fica quieto e faz tudo que eu mandar!”. Ele riu e fez uma cara suspeita. Mas a partir dali, ele tentou ouvir e ficou aberto pra se transformar em alguém que sempre esteve na frente das lentes de uma câmera. Ele estava fabuloso e eu fiquei impressionada com seu corpo ter se mantido em tão boa forma depois de todos esses anos.

Desde que era muito nova, ele estava envolvido em fisiculturismo, treinamento de times e apresentações públicas. Sempre lembro dele andando pela casa de sunga e vestindo calças jeans muito justas e regatas quando ia sair,fazer alguma coisa na rua. Em qualquer lugar ele criava uma espécie de espetáculo. Quando virei adolescente, isso parou de trabalhar ao meu favor. Ele aterrorizava os rapazes que chegavam perto de mim. Ainda bem que fui embora da Polônia aos 16 anos! [risos]

Como você pensa em desenvolver esse projeto?
Cada projeto leva tempo e pode evoluir para além da ideia original, é impossível prever como ele irá se desenvolver e o que ele vai virar. Me arrependo profundamente de não ter começado a fotografar há anos, quando ele tinha o dobro do tamanho e da força. Agora, infelizmente, isso parece uma luta contra o tempo. Apesar de tentar não pensar nisso, meu pai me alerta para o fato de que, nessa idade, um simples ano pode provocar mudanças drásticas no processo de envelhecimento, causando o declínio na saúde e até mesmo a morte. Ele inclusive mencionou há pouco tempo que um dos seus colegas com quem ele competiu há apenas dois anos tinha morrido recentemente.

Conte-me um pouco mais sobre o seu processo. Primeiro, que tipo de câmera e filme você usa pra alcançar esse efeito pictórico.
Estudei fotografia tradicional na faculdade e adorava filmes e câmeras escuras, e nunca consegui migrar pro digital. Tenho usado polaroides há uns sete anos, mas com esse projeto decidi usar algo diferente. De certa forma, não queria me sentir dependente de um único processo e gostava da ideia de esse projeto ser um pouco diferente do anterior e ainda manter um pouco da minha estética típica. Por fim, decidi usar uma Kodak Instamatic que é o que venho usando.

O que você sente ao ser fotografado, Zbigniew?
Zbigniew: Me sinto bem na frente da câmera. Não fico nervoso ou tímido. Apareci bastante na imprensa polonesa ao longo dos anos. Cogitaram que eu fosse ator no colegial. Fui aceito no teatro mais prestigioso da Cracóvia, chamado Old Theatre, e o o diretor Zygmunt Hubner me escolheu pra atuar numa adaptação moderna do proeminente drama de Tadeusz Różewicz, Left Home. Recusei, porque estava preocupado com os exames finais e nunca mais segui a carreira de ator.

Veja mais fotos de Aneta Bartos em seu site. Uma monografia de sua série Spider Monkeys será publicada ainda este ano.

Matthew Leifheit é o editor de foto da VICE. Siga-o no Twitter.