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Na Real, A Maioria dos Venezuelanos Não Quer Derrubar o Governo

Enquanto as tensões se aprofundam, trazendo a certeza de mais violência, uma mudança de regime parece improvável, já que uma proporção significativa dos venezuelanos se opõe aos protestos e apoia o governo.

Mais três pessoas foram mortas nos enfrentamentos na Venezuela quarta-feira passada, elevando o número de mortos para 25 desde que a instabilidade no país começou há um mês.

As vítimas — um estudante, um oficial do exército e um homem que foi atingido por uma bala perdida quando pintava um prédio — morreram no estado central de Carabobo, enquanto as rebeliões continuam a surgir pelo país.

Em vez de diminuírem, os protestos vêm crescendo em intensidade e violência — apesar de não contarem com um número tão grande de pessoas saindo às ruas. Cada lado tem, repetidamente, culpado o outro pela violência e vem evoluindo em suas táticas: de barricadas e gás lacrimogêneo a explosivos improvisados e munição real.

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Mas com dois campos firmemente alinhados, juntamente com linhas de classe, os protestos permanecem confinados a uma minoria mais privilegiada. Mesmo que as coisas na Venezuela estejam ficando mais feias, parece menos provável que eles consigam derrubar o governo.

Muitos manifestantes — que, inicialmente, pediam por reformas — exigem agora a renúncia de Nicolás Maduro. Maduro, que anteriormente rotulou os manifestantes de “fascistas”, os chama agora de “terroristas criminosos” e jogou uma guarda nacional cada vez mais impaciente contra eles.

“Tomarei medidas drásticas contra todos esses setores que estão atacando e matando o povo venezuelano”, o presidente disse na quarta-feira, depois da luta diária entre a polícia e manifestantes na Praça Altamira, um dos principais campos de batalha de Caracas.

Também na quarta, Maria Corina Machado, a líder da oposição que vem liderando os protestos desde o começo, disse à BBC que os manifestantes exigem uma mudança de governo.

Mas enquanto as tensões se aprofundam, trazendo a certeza de mais violência, uma mudança de regime parece improvável, já que uma proporção significativa dos venezuelanos se opõe aos protestos e apoia o governo.

“Como não conseguiram se livrar de Chavez, eles estão tentando se livrar de Maduro, mas não podem, porque o povo está com ele”, disse Ulises Bravo, morador do bairro Nuevo Horizonte em Caracas, à VICE News. “Tudo o que eles querem é se livrar de Maduro, eles não ligam que agora as pessoas podem comer ou que elas têm educação.”

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Muitos venezuelanos têm receio dos protestos, dizendo que eles estão cheios de “estudantes de universidades particulares” de classe média e alta e “infiltrados” pró-Estados Unidos e Colômbia. As pessoas temem que uma mudança de governo possa devolver o país às mãos das elites econômicas, que o comandavam antes de Chavez.

Para a maioria dos venezuelanos, há somente uma revolução, e essa não é aquela que luta nas ruas hoje.

“Setenta por cento dos venezuelanos; temos nossa consciência livre, nosso comandante abriu nossos olhos”, disse Bravo.

Não há pesquisas para comprovar os números de Bravo e as últimas eleições presidenciais — nas quais o líder da oposição Henrique Capriles perdeu para Maduro — foi apertada. Mas os chavistas venceram a maioria das eleições da última década, incluindo a eleição regional de dezembro passado, uma amostra clara do apoio a eles no país.

“Não podemos nunca perder essa revolução”, ele acrescentou, referindo-se à revolução de Chavez. “Vamos ensinar isso para nossos filhos, e nossos filhos vão ensinar aos filhos deles. Essa revolução vai continuar até o fim do mundo.”

Apesar de ainda enfrentarem a pobreza, além do aumento da violência e da escassez crônica que levou muitos manifestantes às ruas, a maioria dos venezuelanos teme a volta das profundas desigualdades do passado e que isso arranque o progresso econômico e social alcançado sob o chavismo.

O desemprego despencou durante o mandato de 14 anos de Chavez e, apesar do crime e da inflação terem disparado, a maioria dos venezuelanos diz estar melhor hoje do que antes das reformas.

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“Aqui na Venezuela, conhecemos muito bem a fome, a miséria e o abuso daqueles que se acham superiores”, disse Tony Rodriguez, coordenador de um dos colectivos do país. “Não queremos que isso se repita.”

Rodriguez disse que os manifestantes são “egoístas” e que sofrem de “complexo de superioridade”. “Não queremos tomar as coisas que eles têm, pelo contrário, queremos que todos consigam uma vida melhor”, ele acrescentou. “Queremos superar a pobreza, queremos superar a marginalização, queremos superar a injustiça.”

Mas os manifestantes dizem que os colectivos — que datam dos movimentos de guerrilha urbana dos anos 1960, e que se reinventaram como defensores da revolução de Chavez — são grupos paramilitares que, em geral, viajam em motos, armados pelo governo para silenciar os manifestantes. Eles acusam esses grupos, assim como a guarda nacional, de causar muitas das mortes nas semanas anteriores.

Milícias pró-governo, conhecidas como “colectivos”, supostamente chegando em Valência em motos e disparando a esmo.

Rodriguez nega que os coletivos são financiados pelo governo e disse que eles têm sido “demonizados” injustamente.

“Há colectivos de trabalhadores, de artistas, de pescadores”, ele disse. “Estamos apenas trabalhando por uma sociedade melhor.”

Pegos entre os manifestantes que pedem por mudança e aqueles prontos para defender Maduro de uma suposta tentativa de golpe, os venezuelanos normais estão cansados da escassez e do crime, mas também das barricadas e dos enfrentamentos que paralisam o país há semanas.

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“Tanto a oposição quanto os chavistas são muito radicais”, disse Luis Itanare, um instrutor de faculdade dos arredores de Caracas. “Não quero sair às ruas e socar a cara de quem pensa diferente.”

Outros criticam a oposição — e líderes como Machado, Leopoldo Lopez e Henrique Capriles — por cooptar o que nasceu como um movimento espontâneo.

“No começo, essas eram mobilizações autônomas e civis”, disse a artista Gala Garrido. “Depois, Lopez e Machado apareceram e colocaram uma bandeira nelas.”

Na quarta-feira, ministros estrangeiros de várias nações sul-americanas se encontraram no Chile para discutir a deterioração da situação na Venezuela. De volta a Caracas, alguns sugeriram que a única solução é a união.

“Acho que a única maneira de sair dessa situação deve ser algo além do chavismo e além da oposição”, disse Garrido. “Espero que aprendamos algo com esses protestos, como sociedade.”

Foto via Flickr.

Siga a Alice Speri no Twitter: @alicesperi