O Calor de SP Criou uma Luz Sinistrona

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O Calor de SP Criou uma Luz Sinistrona

Os fotógrafos Bob Wolfenson, Fernando Laszlo, Renato Stockler, Marcos Vilas Boas e Marcos Muniz estão desnorteados com os tons artificiais do céu da poluída capital paulista.

O calor está horroroso e o sol brilha sem nuvens, mas o céu de São Paulo já não é mais azul. Uma névoa espessa de poluição dissipa a luz, como um permanente véu tóxico sobre nossas cabeças. Aos poucos, nos acostumamos não apenas com a falta de água e de ar na capital, mas também com a perda da luz.

Falamos com vários fotógrafos profissionais para ouvi-los sobre o pantone louco que se abateu sobre São Paulo com a recente onda de calor, secura e poluição. Alguns deles começaram a comentar espontaneamente sobre a luz âmbar que interferia nas imagens, como se Deus tivesse lançado um enorme filtro ruim sobre tudo. Para quem trabalha com imagem esse ruído visual tem efeito semelhante ao que uma sirene estridente e constante talvez causasse nos ouvidos dos músicos.

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Foto por Marcos Muniz. 

"Não se compara à China onde o pôr-do-sol tem sido projetado em uma tela gigante na praça pública para que os chineses possam vê-lo, mas São Paulo tem essa bruma que parece que pode ser cortada com um canivete", comparou Marcos Muniz, artista e fotógrafo que faz pesquisas estereoscópicas e de Ilusão óptica quase tão narcotizantes quanto o horizonte infernal desses dias quentes.

"Essa semana tive a sensação de estar no passado do que o BladeRunner dizia que seria o futuro. O céu prognosticado pelo diretor do filme, Ridley Scott, para 2019 chegou quatro anos antes do previsto a São Paulo. Nossa vantagem sobre a cidade do filme é que conseguimos naturalmente produzir um céu tão apocalíptico e artificial que nem precisamos dos efeitos especiais", disse o fotógrafo Fernando Laszlo, que, junto com o músico Arnaldo Antunes e o poeta Walter Silveira, brinca com fogo, luz e calor e poesia concretista, num recente trabalho chamado "Luzescrita".

"Me lembro de ser difícil buscar uma luz mais suave em São Paulo; é sempre muito dura, muito suja. Ela continua suja, mais suja ainda, só talvez um pouco menos dura com essa névoa de fuligem e poeira. Eu diria que estamos com um filtro "soft" da Hoya na lente, e um RoscoGel-Strall no refletor de luz de lâmpada tungstênio, assando o coco e as idéias. Bom cenário para refilmar um "Não Matarás" do Kiéslowski?", opinou Marcos Vilas Boas, que desde 1997 fotografa a linha do horizonte em longa exposição em praias vazias do litoral norte de São Paulo, e mais recentemente iniciou um trabalho de arqueologia urbana nas margens do Rio Tietê, transpirando entre o sol e a poluição do rio morto.

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Foto por Marcos Muniz. 

"A luz anda triste, tingindo tudo de cinza, enevoando os nossos temas fotográficos. Às vezes é bom que os encubramos com o artifício da bruma, talvez não resistissem à limpidez de uma luz cristalina. A fotografia não imita a vida, talvez o que seja bom pra ela, não é definitivamente bom para a vida", transpirou o fotógrafo Bob Wolfenson, paulistano do Bom Retiro, já acostumado a este ar nem sempre puro de São Paulo. Em A Caminho do Mar, um de seus ensaios pessoais, Wolfenson fotografou as paisagens nebulosas e poluídas do centro industrial de Cubatão durante a noite.

Foto por Helena Wolfenson. 

"Nossa maior companheira não atravessou o horizonte denso. Acabou deixando nossas sombras flácidas, sem alma. Pareceu uma cajuína em pó jogada do alto do Altino Arantes. Uma trama, um mormaço constante na vista. A testa suada e os olhos doídos pela poeira, a mesma que rasga nossa pele há tempos, viram estranheza. Me fez pensamento e estranheza pelo horizonte. Gosto de andar e sentir isso. Mas deixou o aconchego do dia se indo num desconforto amarelo. Tempo denso, um bafo amazônico que virou pó e pairou massudo. Só, abandonado e sem chuva, sem nada pra lavar e trazer o brilho no asfalto molhado pelo sol que vai descansar. A noite caiu diferente esses tempos", disse Renato Stockler, paulistano que "tenta respirar andando pelas ruas na busca de cenas, cenários e protagonistas". Jornalista graduado, começou a fotografar em 2000, "na crença de que as relações humanas dizem mais de nós do que nossas próprias ações e trocas". Stockler "precisa de luz, água e ar", diz sobre si mesmo.

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"Uma vez fui trabalhar em Pequin por 10 dias. Era impossível encontrar o sol no meio do fog. Curiosos também eram os contrastes dos medidores de poluição - o governo considerava as condiçōes do ar satisfatórias, já o app da Embaixada americana registrava índices altíssimos. Fotografar o céu azul em setembro e outubro em São Paulo foi complicado. Aprimorei minha correção de cor na pós-produção. Ou melhor, aprimorei minha criação de cor na pós", nos contou o diretor de cinema, publicidade e TV David Feldon, que tem 12 anos de transpiração atrás das câmeras, 7 deles em direção.

Marcos Muniz

Marcos Muniz

Anna Mascarenhas

Fernando Laszlo

Helena Wolfenson

Helena Wolfenson

Marcos Muniz

Marcos Muniz

Marcos Munzi

Marcos Muniz

Marcos Muniz

Marcos Muniz

Marcos Muniz

Felipe Larozza

Felipe Larozza

Felipe Larozza

Felipe Larozza