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O MOBA de Mesa Brasileiro

O estilo de jogo mais querido da garotada atualmente não pode ser tão facilmente explicável, especialmente em águas brasileiras.

O avassalador sucesso de jogos como League of Legends, DOTA 2 e outros inúmeros títulos do gênero Multiplayer Online Battle Arena – mais conhecido como MOBA, o estilo de jogo mais querido da garotada atualmente – não pode ser tão facilmente explicável. Existem, no entanto, dois traços característicos que ajudam esses games a prosperar no infindável oceano dos jogos eletrônicos. Um deles é o fato de você não ter de comprar o jogo, já que ele faz parte dos famosos free to play. A renda da empresa responsável pelos jogos não vem da venda dele, mas de microtransações em que o jogador pode comprar individualmente, dentro do game, bônus, personagens, chapéus, etc. para melhorar ou simplesmente individualizar sua experiência nesse universo virtual. O outro motivo que joga a favor do crescimento desse nicho é o ambiente de competição que há entre os jogadores: existe um número impressionante de profissionais que vivem dessas disputas virtuais. Neste ano, inclusive, eles chegaram à televisão norte-americana pelo canal ESPN, que transmitiu a final do campeonato internacional de DOTA 2.

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Curiosamente, Gladiadores de Belathron, o próximo MOBA brasileiro, não foca nesses dois aspectos que levaram o gênero ao sucesso que ele conquistou hoje em dia por um motivo bem simples: ele é um jogo de tabuleiro. O pessoal da Behold (responsável pelo "meta-RPG" de sucesso Knights of Pen & Paper e pelo futuro jogo baseado em seriados japoneses de super-heróis, Chroma Squad), empresa da qual eu já falei nesta humilde coluna, está com um projeto novo – e ele não é para um jogo eletrônico, mas de tabuleiro. No Brasil, quando se fala de jogos de tabuleiro, logo se lembra dos clássicos da Estrela e da Grow que habitavam as mesas da sala de jantar dos anos 80 e começo dos 90: Detetive, Jogo da Vida, Banco Imobiliário, War e outras pérolas que você desengavetava quando estava chovendo na casa de praia emprestada da sua tia-avó. Parece que não se desenvolveu, ao menos até agora, uma cena forte de jogos de tabuleiro no Brasil, como indica Saulo Camarotti, sócio-fundador da Behold que está por trás desse título. Quando lhe perguntei por que produzir um jogo focado no público brasileiro, já que o mercado para um produto desses em inglês seria bem maior, ele respondeu: "Acreditamos que o Brasil ainda não é bem servido de jogos de tabuleiro em português de qualidade. Então, resolvemos focar em produzir pra cá. O produto é físico, mandá-lo pelo mundo não é fácil também".

Fora daqui, jogo de tabuleiro não é necessariamente coisa de criança como costumamos associar. Na Alemanha, por exemplo, existe uma longa tradição de títulos do gênero que pode ser traçada até o século XIX com o Kriegsspiel. Literalmente um jogo de guerra em alemão, ele tinha o sugestivo título original de Instruções para a Representação de Manobras Táticas sob a Aparência de um Jogo de Guerra. Embora a tradição de utilizar jogos para ensinar táticas de guerra não parece ter vingado, o gênero continuou se desenvolvendo. Foi a partir de um desses jogos de guerra que (um então jovem) Gary Gygax, com muito Senhor dos Anéis na cabeça, inventou, nos anos 70, o Dungeons & Dragons. É na Alemanha também que está a empresa que irá produzir, se conseguir financiamento, o Gladiadores de Belathron, como explica Saulo: "Fomos atrás dos melhores. A Panda Game Manufacturer é uma empresa alemã na China que produz jogos de excelente qualidade. Eles produzem tudo, montam tudo e deixam pronto para o consumidor". Isso explica o preço aparentemente salgado do projeto no Catarse: R$ 92 mil. Mas se você der uma olhada, está tudo explicadinho lá para justificar o custo de sua realização.

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O game em si parece como um bom jogo de tabuleiro: difícil de explicar, mas fácil de jogar. Separados em dois grupos de duas ou três pessoas, os jogadores se enfrentam em um mapa muito parecido com os dos MOBAs mais famosos, com caminhos que ligam duas bases. A ideia é destruir a base dos inimigos passando por torres, monstrinhos da facção oposta, monstros sem afiliação que podem dar bônus de dinheiro ou experiência, além dos próprios heróis adversários. Saulo diz que a mudança do suporte digital para o físico implica em uma diferença básica. Perguntei se o título perde ao se tirar o aspecto competitivo: "Eu acho que, na verdade, ganha. A possibilidade do tabuleiro de tirar o aspecto competitivo é deixar o aspecto interativo mais presente: aproveitar a presença dos amigos, rir das situações, etc. Tabuleiro é bom por causa disso". Parece mais simpático mesmo para uma pessoa como eu, que nunca tentou jogar MOBA direito por causa da molecada maluca com sede de vitória se xingando em gírias especializadas.

Os protótipos dos heróis controlados pelos jogadores.

A arte de convidar amigos para visitar a sua casa parecia perdida, mas a crescente onda de jogos modernos de tabuleiro, que, embora devagar, começa a chegar no Brasil, parece que tenta mudar um pouco isso. A ideia de transportar os MOBAs para o tabuleiro parece bem interessante nesse sentido; e, se você tem interesse em adentrar esse mundo louco dos jogos modernos de tabuleiro, recomendo dar uma apoiada nos meninos lá no Catarse. Não tenho certeza se o público-alvo do Gladiadores de Belathron é o mesmo de, por exemplo, League of Legends, que, neste ano de 2014, beira o faturamento de 1 bilhão de dólares. No entanto, se um pouco dessa energia (e grana toda) escorrer para os lados do pessoal da Behold, parece que veremos um MOBA físico em breve.

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