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O Poder Ultrajovem

É como se eles fossem o Cthulhu, He Who Must Not Be Named. Ou o Voldermort mesmo, já que os membros do MPL são estudantes secundaristas.

Fotos Por Ingrid de Andrade e Lucas Conejero

Em Natal os manifestantes pularam fogueira e nem era São João. [Ingrid de Andrade]

Como você sabe que o Movimento Passe Livre fez alguma coisa? Você lê ou vê na TV que “milhares de estudantes vândalos depredaram propriedade pública e/ou entraram em confronto com policiais e/ou fecharam as ruas da capital brasileira X”. É como se eles fossem o Cthulhu, He Who Must Not Be Named. Ou o Voldermort mesmo, já que os membros do MPL são estudantes secundaristas.

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É uma molecada que está botando pra quebrar, literalmente, e mesmo que seja impossível ler isso na grande mídia local, 2011 foi o ano deles. Eles – e é meio estranho falar eles, já que os núcleos são locais e independentes, sem muitos congressos ou encontros nacionais – abriram o ano arrebentando na Bahia logo no dia 3 de janeiro, tomando as ruas de Salvador por três dias por conta dum aumento de 20 centavos nas passagens de ônibus. Foi a segunda Revolta do Buzu – a primeira foi em 2004, parou a capital baiana por dez dias e inspirou o movimento no resto do país. Daí que a relação com a polícia foi até que tranquila, provavelmente pelo medo da cidade ficar parada de novo.

A coisa toda do MPL é tão utópica que não tem como não simpatizar: é tudo apartidário, sem lideranças, e a molecada jovem briga pela estatização e gratuidade do transporte público. É que se nos últimos dez anos o Brasil cresceu com uma maior distribuição de renda, o acesso aos bens públicos ainda é separado pelo simples acesso a eles. E é aí que a coisa fica legal, porque eles agitam um lance que não é só para eles, e eventualmente acaba colando um monte de gente além da turma do colegial.

Festejando e protestando nas ruas de SP [Lucas Conejero]

Em São Paulo eles organizaram muitos atos, o maior deles com quatro mil pessoas e confronto com a polícia, além de participarem de outros tantos. Vale lembrar que polícia de São Paulo é das mais violentas do país – pra você ter uma ideia, a polícia do Estado matou 6% mais que polícias dos EUA todos entre 2005 e 2009 (a população do estado de São Paulo é quase oito vezes menor que a dos EUA, OK?) – gás lacrimogêneo, balas de borracha, cassetetes e policiais sem tarjas com identificação e muita disposição para reencenar o MMA que assistiram na TV são itens garantidos. Dá pra entender quem não frequente: o medo de acabar num sistema carcerário violento, superlotado, com número elevado de casos de AIDS e tuberculose e no qual a tortura é método recorrente é possivelmente uma das coisas que eu descreveria como paralisante.

Em junho o MPL do Espírito Santo parou a cidade por três dias. Teve pneu queimado em frente ao palácio do governo, avenidas interditadas, muitos hematomas e escoriações, 30 presos e quatro mil balas de borracha disparadas – tudo com apoio da população local e alimentado pela conquista de 2005, quando fecharam a cidade e conseguiram diminuir o preço das passagens. Dessa vez não deu certo, mas ano que vem tá aí.

No mesmo mês, em Natal, capital do Rio Grande do Norte, aproveitando a desaprovação da prefeita Micarla de Souza, auto-intitulada “A Prefeita Borboleta” (enquanto escrevo isso há pesquisas apontando 90% de rejeição da população pelo seu governo), os MPL se uniram ao pessoal que tomou as ruas. Oito quilômetros de passeata e uma reação contrária da mídia depois, os estudantes marcharam até a Câmara dos Vereadores local e, protesto vai, protesto vem, acabou que ocuparam o lugar, montando barracas e transmitindo tudo via Twitcam. Os acampados chegaram a encontrar baseados e camisinhas usadas plantadas na ocupação, curiosamente quando uma equipe da TV local Ponta Negra (de propriedade da Borboleta) apareceu por ali. Lá fora, as passeatas continuaram e o apoio de personalidades locais, como o neurocientista Miguel Nicolelis, garantiu que não houvesse violência na desocupação.

Agosto foi vez de Teresina, onde a garotada pode ter vontade de arrancar os próprios olhos de tanto que a policial local usou spray de pimenta durante os cinco dias de insurreição. De brinde, vários atropelamentos a manifestantes que respondiam com pedras, paus e barricadas de fogo em alguns bloqueios nas vias que cortavam a principal avenida da capital do Piauí. O primeiro dia começou com dois mil manifestantes, no dia cinco somavam 15 mil. Muita pancadaria, vias fechadas e ônibus queimados depois, a prefeitura recuou e diminuiu as passagens.

Em Manaus, cerca de três mil estudantes protestaram na frente da Câmara contra um reajuste de preço na passagem de ônibus em setembro. Eles derrubaram o portão de acesso à Câmara e bombardearam o edifício com garrafas, pedras e tijolos. Sobrou tijolada até pra repórter da TV local.