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O que pode acontecer se o Estatuto do Desarmamento ror revogado

"O cidadão de bem pode, se ele quiser, ter o direito a ter uma arma de fogo para a sua proteção", defendeu o deputado federal Laudívio Carvalho, relator do projeto de lei que pede o relaxamento de requisitos para o porte de arma de civis.
Senhora empunhando pistola

Foto por Matias Maxx, publicada originalmente nesta matéria aqui.

A revogação do desarmamento civil está cada vez mais próxima após a aprovação do texto-base do PL nº 3722/2012 por uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados na semana passada. O projeto de lei propõe novas regras para adquirir porte de arma e revoga o Estatuto do Desarmamento de 2003.

Relatado pelo deputado Laudívio Carvalho (PMDB – MG) por escolha do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, o projeto é chamado de Estatuto do Controle de Armas de Fogo e afrouxa diversos requisitos que determinam quem poderá adquirir o porte de arma.

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A idade mínima para o pedido de porte, por exemplo, passará a ser a de 21 anos, e não 25 anos como vigora hoje. Além disso, esse PL estende o porte permitido para deputados e senadores, acaba com a proibição de que pessoas que respondam a inquérito policial ou a processo criminal adquiram armas e também permite que o país importe armas, peças e munições, desde que a indústria nacional não ofereça uma alternativa semelhante.

Com 19 votos favoráveis e 8 contrários, o texto-base foi aprovado em clima de tensão e muita treta entre os parlamentares, com direito a bate-boca pesadíssimo entre o deputado favorável à revogação, João Rodrigues (PSD-SC), e o que estava contra ela, Jean Wyllys (PSOL-RJ).

Uma das justificativas utilizadas por Carvalho é devolver ao "cidadão de bem" o direito de poder garantir a própria defesa e a de seu patrimônio. Junto a isso, o relator menciona o que o Estatuto do Desarmamento, promulgado em 2003, não fez seu papel em reduzir o número de homicídios no país.

A aprovação rendeu comentários preocupados sobre a revogação do Estatuto do Desarmamento de nomes como os doex-presidente Fernando Henrique Cardoso, dopresidente do Senado Federal, Renan Calheiros, e do criminologista Túlio Kahn, que contou para a Ponte sobre o sucesso do Estatuto no combate a homicídios e suicídios no país.

"Do ponto de vista [de uma projeção] para o que pode acontecer em relação à violência, a expectativa é muito ruim", explica à VICE André Zanetic, cientista político, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP e associado ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública. "E, quando se somam outras medidas reacionárias, como a redução da maioridade penal, para lidar com esse tipo de problema, é ainda pior."

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Para o cientista político, os deputados favoráveis à concessão do porte de arma para civis não levam em consideração que apenas a presença física da arma já aumenta a probabilidade de mortes. "O Estatuto do Desarmamento não tirou arma de circulação apenas – ele foi além disso. Onde a lei foi efetivamente aplicada, quem estava portando uma arma de fogo irregularmente passou a ficar com mais medo de andar armado e sofrer o custo da lei. Então, as pessoas pensavam duas vezes antes de sair com a arma, o que diminuiu a probabilidade de alguma coisa acontecer por causa da presença física da arma", destaca.

Sem sombra de dúvida, a probabilidade de revogar a proibição do porte veio com um gostinho de vitória para a indústria de armas no Brasil. Atualmente, são duas empresas que monopolizam a indústria privada de armamentos e munições. A Forjas Taurus e a Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC) são apontadas como grandes doadoras em financiamentos das campanhas eleitorais de 2014.

Cerca de 70% dos candidatos ao legislativo que receberam doações da indústria de armas foram eleitos em outubro de 2014. São 21 empossados, sendo 14 deputados federais e 7 deputados estaduais. Além disso, estima-se que uma parte da comissão que aprovou a revogação do Estatuto do Desarmamento seja financiada pelas empresas. O deputado Alberto Fraga (DEM–DF) declarou abertamente em uma das comissões que não tem vergonha de ter recebido R$ 80 mil da Taurus no ano passado.

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Não que a Forjas Taurus ache um problema ser tão explícita sua influência no legislativo. A companhia estava passando por alguns maus bocados em 2014; entretanto, após a aprovação do PL (o qual amplamente defendeu nas suas redes sociais), ela registrou umaumento de 13,68% nas suas ações no mercado de investimento.

O lucro, como aponta Zanetic, é obviamente uma explicação para tamanho lobby político. "É lamentável ver as pessoas se venderem para defender questões do pior nível de padrão ético possível. (…) Muitas pessoas estão arrecadando muito dinheiro às custas de alimentar esses problemas para sociedade, que já são gigantescos e só irão aumentar com essa medida."

De acordo com as projeções publicadas pelo Mapa da Violência de 2015, a redução da circulação de armas pelo país poupou mais de 160 mil vidas entre 2004 e 2012. Para Laudívio, a revogação seria apenas o cumprimento do seu papel para atender "os anseios do povo brasileiro" que votou pelo "não" no referendo feito em 2005 sobre o comércio de armas de fogo.

"O cidadão de bem pode, se ele quiser, ter o direito a ter uma arma de fogo para a sua proteção", defendeu o deputado em uma entrevista.

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