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O Veneno Antipirataria dos Games

Fazer cópias ilegais dos joguinhos é uma prática quase tão antiga quanto os próprios cartuchos. Mas alguns fabricantes encontraram saídas criativas pra ferrar os picaretas.

Meados dos anos 90. Eu estava jogando o que viria a ser um dos meus jogos preferidos de computador, Dark Sun: Shattered Lands. Fugia da arena da cidade-estado de Draj, onde os escravos eram obrigados pelo rei-mago Tectuktitlay a duelar com monstros até a morte. Após me esgueirar pelos esgotos de Draj, meus ex-escravos estavam prontos para respirar o ar livre e puro do deserto de Athas, mas eis que ao tentar subir até o ar livre algo terrível aconteceu:

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O ar ao seu redor crepita com descargas mágicas enquanto a inconfundível presença de um dragão se aproxima. Ele cria uma ligação telepática e o desafia.

“Você não seguirá em frente a não ser que responda a minha pergunta… A segunda palavra da página 10, linha 6, começa com a letra ‘h’. Que palavra é esta?”, pergunta o aviso.

Você (jogador) pega o seu maravilhoso manual do jogo que veio dentro da caixa, folheia até a página 10, checa a linha e conta até a segunda palavra e escreve “humans”.

“Você disse ‘humans’, esta é a sua resposta final?”. Digo “sim”. Ele volta: “A sua resposta é suficiente. Vou deixá-lo por enquanto, mas não tenha dúvida de que eu retornarei”.

E você pode seguir jogando.

A proteção contra cópias ilegais de software é tão velha quanto a pirataria, que é tão velha quanto os softwares. Nada como copiar um joguinho do seu amigo e jogá-lo de graça, e isso fode com o pessoal que levou meses, às vezes anos, para conseguir desenvolver esse maravilhoso passatempo digital. Até os piratas mais conscientes estimulam a galera que baixa suas cópias hackeadas a comprar o jogo caso curtam o produto, ajudando assim o pessoal a pelo menos continuar fazendo seus joguinhos preferidos.

Hoje em dia o esquema de proteção de cópia é conhecido por uma alcunha que não define apenas os jogos: DRM (abreviação de Digital Rights Management). O uso mais comum envolve ter de se conectar à internet para poder liberar o jogo usando um código que identifica a sua cópia. Serviços de loja e distribuição digital de jogos como o Steam, Desura e Good Old Games também servem nesse sentido para os games adquiridos através deles. Algumas medidas não tão populares também já foram utilizadas, como a obrigatoriedade de você jogar conectado à internet, mesmo em um jogo de uma pessoa. Nos últimos tempos teve o maravilhoso caso do mais recente Sim City, que obrigava todos a se conectar para poder jogar o maldito game. O resultado: nos primeiros dias, talvez semanas, os servidores não estavam prontos para o número de jogadores que queriam jogar o bagulho, o que deixou inúmeros nerds do mundo todo incomensuravelmente putos com o sistema de proteção. Algo parecido aconteceu com o Diablo 3, que, ao menos no PC e Mac, não permite que o jogo fique offline. Isso emputece.

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O jogo do Michael Jackson: The Experience de nintendo DS dispara um monte de vuvuzelas tocando em cima das músicas se o jogo foi pirateado.

Mas nem sempre foi assim. Sabe disso quem já teve que identificar sua cópia de Diablo 2 com o CD-Key que vinha impresso na caixa do CD-ROM para poder jogar online. Se você perguntar para um saudosista dos bons e velhos tempos dos videogames, é possível que ele diga: “Os jovens de hoje em dia mimimi, não é mais como antigamente bébébébébé, não existe mais criatividade na proteção contra pirataria mumumumumu…”, o que é mentira, já que a galera continua criando formas divertidaças de combater a pirataria.

Um exemplo é o jogo Serious Sam 3. Quando você roda uma cópia identificada como ilegal, logo na primeira fase já enfiam um escorpião antropomorfico gigante cor-de-rosa super-rápido e invencível, que persegue o personagem atirando com duas metralhadoras superpoderosas até a inevitável morte. Outro exemplo é um que eu já citei em outro texto neste website, do jogo Game Dev Tycoon, que simula uma empresa desenvolvedora de jogos. Nele, se você está jogando a versão pirata, logo os novos joguinhos da sua empresa, mesmo sendo um sucesso de público e crítica, param de dar lucro por causa da pirataria, e uma mensagem aparece: “Chefe, parece que embora muitos jogadores joguem nosso novo jogo, eles também nos roubam baixando uma versão crakeada em vez de comprar legalmente. Se os jogadores não comprarem seus jogos preferidos, iremos à falência. :-(“ Que jogada antipirataria mais passivo-agressiva.

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Boa sorte aí, seu pirateiro.

O que provavelmente não teremos mais, com o crescente declínio da venda de cópias físicas dos jogos, são as interações entre o material impresso nos manuais e as traquitanas que às vezes vinham dentro das caixas dos games. Um belo exemplo dessa época de ouro é Sam & Max Hit the Road, adventure da época de ouro da produtora Lucas Arts. O sistema de proteção de cópia é um joguinho em que você tem que vestir os heróis com divertidas fantasias encontradas nas páginas do próprio manual. Teve até um maluco do Deviant Art que fez um jogo em flash desse metajogo e dá pra brincar aqui de vestir o cachorro e o coelho.Abaixo, um GIF que fiz com todas as fantasias do manual.

Na minha era 16 bits, eu nunca esbarrei com muitos jogos pirateados e estava limitado pela minha pequena biblioteca de cartuchos para Megadrive (e o que estava disponível nas locadoras perto da minha casa), mas foi justamente nesta época que fizeram o melhor e mais cruel sistema antipirataria. A maravilhosa – e meio cult – série de RPGs Mother, idealizada por Shigesato Itoi, é reconhecida pelo seu enredo de ficção científica e por abordar temas pesados como a morte dentro de um universo contemporâneo de ficção científica. A série também é famosa pelo humor japonês bizarro que muitas vezes é lindo pelo simples fato de nós, meros ocidentais, não entendermos suas nuances e pirações.

No segundo jogo da série, EarthBound, lançado para Super Nintendo, se sua cópia fosse identificada como pirata, o game todo ficava mais difícil, com muito mais inimigos para enfrentar em toda a sua jornada. Se mesmo com a dificuldade aumentada você conseguisse chegar no fim, logo antes da batalha contra o chefão final, sabe o que acontecia? Ele travava – e o único jeito de continuar era dando um reset. Você vai carregar seu jogo salvo, e o que aparece? Nada. Todos os seus jogos salvos são deletados e você tem que começar do zero. Seu pirata safado, vai comprar o original, caralho!

Outra relíquia dos anos de ouro dos manuais e táticas de quebra-cabeça para proteger o software é este site. Ele contém um compêndio dos mecanismos utilizados pela clássica Sierra Games, que inclusive anuncia sua voltacom o remake de um de seus maiores sucessos, King’s Quest, previsto para 2015. Vamos ver se até lá eles conseguem um jeito de impedir a pirataria de seus joguinhos.