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Ocupas Esquentados e Barricadas em Chamas Não Vão Impedir a Gentrificação de Brixton

A comunidade que vivia há 32 anos num prédio da Rushcroft Road foi expulsa.

Uma rua ao sul de Londres virou uma bagunça composta por escombros e cacos de vidro anteontem, quando a polícia e oficiais de justiça enfrentaram ocupas entre barricadas improvisadas e caçambas de lixo em chamas.

Por volta das 6h30, os residentes da Rushcroft Road de Brixton estavam se preparando para defender seu lar de um pelotão de oficiais de justiça. Os fortões tinham sido mandados pelo Conselho da Região de Lambeth de Londres para chutar a comunidade que vivia ali há 32 anos.

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Quando cheguei ao local, identifiquei um grupo de oficiais de macacões e capacetes se preparando psicologicamente enquanto filmavam todo mundo que se aproximava. Eles estavam prestes a passar a maior parte do dia ouvindo a mesma pergunta sobre como conseguiam dormir à noite. Na verdade, é possível imaginar que essa é uma parte importante da existência de um oficial de justiça, e deve ser cansativo ser perseguido com perguntas tão mundanas e implacáveis do tipo: “Como você consegue dormir à noite?”,“Quanto eles te pagam?”,“Onde estão sua esposa e filhos?”.

Dito isso, o trabalho deles é mesmo chutar pessoas para o olho da rua, então, fodam-se todos eles e suas almas cinzentas.

Os ocupas, do outro lado, tinham conjurado várias maneiras engenhosas de mostrar que os oficiais de justiça não eram bem-vindos.

As propriedades eram algumas das últimas cooperativas habitacionais “provisórias” existentes — os prédios são tecnicamente do conselho, mas eram habitadas e mantidas sem a cobrança de aluguel há mais de 30 anos depois que uma série de políticas habitacionais cagadas dos anos 1970 deixou o conselho incapaz de pagar por sua manutenção. Agora, com o custo da moradia subindo vertiginosamente e medidas de austeridade abocanhando o orçamento de todo mundo, o conselho alega que precisa vender metade das propriedades com o intuito de levantar dinheiro para transformar a outra metade em moradias sociais.

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Estranhamente, os moradores do local não simpatizaram muito com essa ideia. Eles ficaram imaginando por que a prefeitura precisava usar a casa deles para equilibrar as contas depois de ignorar sua existência por três décadas? Há também a questão de que a injeção de dinheiro da venda desses prédios inevitavelmente virá dos yuppies intrometidos e pentelhos que já fizeram um ótimo trabalho subindo o preço do aluguel e mandando toda a classe trabalhadora para fora da área.

Os oficiais de justiça e os moradores haviam chegado a um desconfortável impasse — um pouco como o começo de um baile de colégio, isso se os bailes terminassem com gente colocando fogo em colchões e não vomitando vodca vagabunda. Nesse ponto, Richard (o cara de chapéu de palha) me convidou para dar uma olhada em seu apartamento.

O lugar era exatamente como sua mãe acha que uma ocupação é, lembrando vagamente uma casa normal, todavia, “decorada” por alguém que não precisa se preocupar com multas quando entregar o imóvel.

Esse é o John, cujo cochilo interrompi bruscamente enquanto ele tentava descansar de todo o stress das preparações daquela manhã. “Moro neste apartamento há seis anos”, ele me contou. “Eu morava no de cima, mas mudei para cá quando o velho que morava aqui quase morreu queimado depois de dormir com um cigarro aceso na mão. Eu salvei a vida dele, então, dei minhas chaves a ele e o resto é história. Estou triste com o que está acontecendo aqui hoje. Brixton se transformou muito desde que mudamos para cá e acho que não posso mais bancar morar aqui, então vou viajar.”

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Do lado de fora, trabalhadores da prefeitura vasculhavam a área e passavam por maus bocados nas mãos dos residentes e simpatizantes.

Os ocupas estavam espalhados pela rua e os vários prédios tinham levantado defesas de diferentes níveis de firmeza. Esse grupo tinha optado pela tática “pilha enorme de tralhas em chamas”.

Na verdade, muitos deles tinham decidido que essa era a melhor maneira de evitar que a polícia e os oficiais de justiça realizassem sua obra do demônio.

Um a um, os ocupas foram retirados pelos oficiais de capacete. E, apesar de se parecerem com iniciantes de um curso de escalada, a vantagem de se ser oficial de justiça é que, aparentemente, é OK atacar pessoas violentamente em plena luz do dia, mesmo quando se está cercado por policiais.

A ironia disso tudo é que o Conselho de Lambeth não é só mais um conselho, é o carro-chefe do movimento cooperativo de conselhos — uma tentativa do Partido Trabalhista de parecer um pouco mais legal e menos autoritário. A retórica do movimento de decisões de baixo para cima, o que daria poder à base do partido, até parece sedutora, mas é um sonho difícil de engolir quando se vê um oficial mandado pelo tal conselho estrangular um homem para fazê-lo sair de sua casa para sempre.

Pode me chamar de cínico, mas não fiquei muito convencido de que esse cara de óculos escuros sendo enforcado sente que tem algum poder de decisão em um processo de consulta significativo.

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As pessoas foram forçadas a empacotar suas vidas inteiras em um curto espaço de tempo, o que levou a uma sequência de cenas de partir o coração como a de cima.

Durante uma das calmarias, perguntei a uma pessoa que tinha sido despejada que tipo de comunidade existia ali durante a ocupação. “A maioria das pessoas tinha um trabalho e tentava levar a vida, sustentar a família”, ele me disse. “Mesmo que tivéssemos alguns bêbados, eles eram pessoas respeitáveis — eles guardavam isso para si próprios, sabe.”

Sempre que as pessoas não estavam sendo brutalizadas pela polícia, elas usavam a oportunidade para lembrar aos oficiais de justiça do tipo de ser humano terrível que eles são. Tão terríveis que nem o Michael McIntyre quis se apresentar pra eles, destacou habilmente um dos ocupas.

“Obrigado por mostrarem que o Conselho de Lambeth é horrível”, gritou outro cara. “Eles são uns escrotos!”

“Eles são uns escrotos do caralho”, disse mais alguém. Porque, às vezes, só “escrotos” não é o suficiente.

Enquanto os últimos prédios preparavam suas defesas, fui convidado para dar uma olhada no lugar. Na minha experiência limitada com fortes improvisados, já vi estruturas mais robustas do que gaveteiros mal equilibrados em cima de um colchão, mas não me senti em posição de criticar os valiosos esforços do pessoal contra os capangas contratados pelo conselho.

E, conforme o desenrolar dos acontecimentos, usar um colchão foi muito mais efetivo do que eu podia imaginar. O bloqueio improvisado rebateu o aríete dos oficiais de justiça de volta na cara deles quando ele quebrou a porta de vidro.

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Mesmo assim, a defesa caiu um pouco depois, como um triste castelo inflável furado. Eles tinham conseguido entrar.

Saí do prédio e testemunhei um homem sendo preso enquanto gritava: “Façam casas, não bombas! Façam casas, não bombas!”.

Infelizmente, acho que ninguém disse a ele que o Conselho de Lambeth vai vender os prédios para companhias de desenvolvimento que as transformarão em casas, não bombas. Mas é mesmo uma pena que eles não tenham conseguido pensar em nada melhor para levantar dinheiro do que jogar dezenas de pessoas no meio da rua e estraçalhar uma comunidade de 30 anos no processo.

Quanto aos oficiais de justiça, bem, o que posso dizer? Está complicado arrumar emprego na Inglaterra hoje em dia.

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