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Por que homens matam as próprias mães

Nos EUA, o parricídio é o tipo de homicídio envolvendo familiares que mais cresce no país. Mas quais são os dispositivos psicológicos que motivam esses crimes brutais?
Norma Bates em 'Psicose', via Paramount Pictures.

Em 20 de agosto de 1989, o executivo de entretenimento Jose Menendez foi baleado à queima-roupa atrás da cabeça enquanto relaxava no sofá de sua mansão em Beverly Hills. Sua esposa, Kitty, que estava dormindo ao lado dele, acordou com os tiros. Numa tentativa fútil de escapar, ela correu para o corredor, mas foi atingida na perna por uma das balas. Ela escorregou no próprio sangue e caiu, continuando a se arrastar até que levou um tiro no peito, depois mais dez tiros na cabeça, antes de ter seu crânio esmagado pelos assassinos. Mais tarde, foi revelado que Jose e Kitty Menendez foram brutalmente assassinados pelos próprios filhos: Lyle, de 21 anos, e Erik Menedez, de 18.

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Incidentes de parricídio — o assassinato dos dois pais — continuam a fascinar psicólogos, criminólogos e o público. Matar os próprios pais é uma guinada muita abrupta da ideia aparentemente universal de que devemos amar nossos pais, especialmente agora, logo depois do dia das mães. Mas segundo o FBI, em 26% dos casos de homicídio em que os perpetradores são conhecidos das vítimas, os assassinos são membros da família. Um relatório de 2011 do Departamento de Justiça dos EUA mostra que assassinatos cometidos pelos filhos das vítimas estão em ascensão; de 9,7% dos homicídios familiares em 1980 para 13% em 2008, tornando o parricídio o tipo de homicídio envolvendo familiares que cresce mais rápido no país.

Lyle e Erik confessaram o assassinato dos pais logo depois, então o julgamento deles nunca foi uma questão de "culpados ou inocentes", mas de "por quê?" A defesa afirmou que eles tinham sido levados a matar depois de anos de abuso emocional e sexual cruel nas mãos do pai, e que sua mãe alcoólatra às vezes participava disso. A promotoria negou que o abuso tivesse ocorrido e sugeriu que os irmãos tinham matado os pais para ficar com a fortuna da família. O julgamento deles se tornou um espetáculo público, seguido de uma novela da vida real.

A maioria dos amigos e familiares de Lyle e Erik acreditavam nas alegações de abuso contra Jose, mas a equipe de defesa tinha um grande problema: Kitty podia não ser a mãe mais perfeita do mundo, mas as evidências não sugeriam que ela tivesse feito qualquer coisa para fazer com que seus filhos quisessem matá-la, especialmente de um jeito tão brutal. O que era ainda mais estranho, segundo as pessoas que conheciam a família, Erik e Lyle eram muito próximos da mãe.

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O Dr. William Vicary, um psiquiatra forense que tratou dos irmãos depois que eles foram presos, me disse sobre seu primeiro encontro com Erik: "tudo que ele queria era me dizer como seus pais eram maravilhosos — como seu pai era brilhante e incrível, e como sua mãe era amorosa, gentil e carinhosa". Um dos policiais que trabalhou no caso também me contou que, durante as investigações, eles encontraram registros telefônicos indicando que as conversas entre Lyle e Kitty duravam três, às vezes quatro horas. Se todo mundo ao redor enxergava uma relação idílica entre Lyle, Erik e a mãe, então o que poderia ter feito eles a matarem?

Há duas teorias principais sobre por que filhos assassinam as mães. Sigmund Freud, que passou muito tempo ruminando sobre as relações entre pais e filhos, dizia que um filho que assassina a mãe está se defendendo de impulsos incestuosos. (Em contraste, filhos que matam os pais estão eliminando a competição pela "posse da mãe".) Outros especialistas — como a Dra. Kathleen Heide, uma professora de criminologia na University of South Florida que já escreveu quatro livros sobre parricídio – acreditam que os filhos geralmente estão tentando reclamar o controle. Em seu livro Understanding Parricide, Heide sugere que "homens que cometem matricídio geralmente relatam que suas mães eram ambivalentes com relação a eles ou excessivamente dominadoras. Esses homens frequentemente descrevem a ideia de matar a mãe como uma maneira de manter sua masculinidade, ou como proteção contra emoções extremas desencadeadas pelo comportamento da mãe".

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O psiquiatra Fredric Wertham, um dos primeiros médicos a analisar mais profundamente o parricídio, misturava as duas teorias. Em seu livro de 1954, Seduction of the Innocent, ele escreveu que "muitos matricídios cometidos com força excessiva acontecem no quarto, e são precipitados por razões triviais. Esses crimes representam o ódio inconsciente do filho pela mãe, sobreposto a um desejo sexual por ela". A teoria de Wertham mostra paralelos sombrios com os casos de Michael Miller, condenado por estuprar a mãe, Marguerite, depois de fraturar o crânio dela até a morte, ou de Kevin Davis, um garoto de 18 anos do Texas, que admitiu ter enforcado, esfaqueado e atacado a mãe com um martelo antes de fazer sexo com seu cadáver.

Cerca de dois terços dos matricídios são cometidos por filhos adultos e em muitos dos casos de matricídio que pesquisei, os crimes eram sexualmente motivados de alguma forma. Em alguns casos, as mães eram apáticas com o abuso sexual sofrido pelo filho ou eram as responsáveis pelo abuso; em outros, ela tinha interferido num relacionamento romântico, ou o assassino tinha problemas associados com desvios sexuais. Assassinatos de pais — que são duas vezes mais comuns que matricídios — geralmente são resultado de brigas acaloradas, uma "ruptura" ou um cenário enfurecido que leva ao assassinato inadvertidamente. Nos casos em que os dois pais são assassinados, como com os Menendez, as motivações nem sempre ficam claras. Os catalisadores variam de acusações de abuso, ciúme, brigas arbitrárias, controle, ganância e puro narcisismo.

No testemunho de Erik Menedez durante o julgamento, ele chorou, estremeceu e soluçou descrevendo os momentos em que viu a mãe gemendo depois dos vários tiros que ele e o irmão deram em sua cabeça. Mais tarde, o júri condenaria Erik e Lyle por assassinato em primeiro grau dos pais e os sentenciaria à prisão perpétua sem direito à condicional. Poucas pessoas entendem a dicotomia de amar e querer matar os pais ao mesmo tempo. Mas talvez perguntas sem respostas já sejam esperadas.

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