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Tecnologia

Pesquisadores Criaram uma Rede Social Falsa para se Infiltrar na Censura Chinesa

"Nós criamos nossa própria rede social chinesa; compramos uma URL, pagamos um domínio e contratamos uma das plataformas de software mais populares da China."
Crédito: Tim Quijano / Flickr

Todos sabem que a China censura e controla as informações trocadas entre seus cidadãos, principalmente na internet. Porém, só pudemos entender o funcionamento desse filtro recentemente, quando pesquisadores de Harvard se infiltraram no sistema chinês.

Pesquisadores de Harvard publicaram na revista Science, com o apoio da Universidade de San Diego, um estudo que mais lembra um livro de espionagem do que um artigo científico.

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Para conseguir adentrar o notório filtro de censura chinesa, o pesquisador Gary King e sua equipe criaram dezenas de contas falsas e postaram centenas de mensagens nas principais redes sociais da China; depois foi só esperar e ver o que não passaria pelo pente fino. O grupo foi além e criou sua própria rede social falsa para ter acesso aos programas utilizados pelos censores e descobrir o seu funcionamento interno.

"Nós criamos nossa própria rede social chinesa; compramos uma URL, pagamos um domínio, contratamos uma das plataformas de software mais populares da China, colocamos nossa página no ar, revisamos nosso projeto, publicamos e censuramos nosso próprio conteúdo", disse King.

O GOVERNO ESTÁ INCENTIVANDO A INOVAÇÃO E COMPETIÇÃO DENTRO DO SETOR DE TECNOLOGIA DE CENSURA

"Tínhamos acesso completo ao software de censura; seus documentos, fóruns de usuários e apoio ao consumidor; recebemos, inclusive, dicas para censurar nosso próprio site de acordo com as normas do governo", continuou.

Esses são os dois métodos básicos de censura. Crédito: Science

Após fazer uma série de testes no Weibo (O Twitter da China) e em sua rede social fictícia, King e seu time chegaram a uma conclusão surpreendente: é tranquilo criticar o governo chinês, desde que você não esteja incentivando algum tipo de revolta.

O país, segundo ele, está preocupada com possíveis revoltas, protestos e outras ações efetivas; não com críticas ao governo. Muitos desses posts são bloqueados automaticamente por um filtro de palavras-chave ou deletados por censores, que tem à sua disposição dezenas de formas de banir IPs e usuários, e deletar determinados posts.

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A China é basicamente uma autocracia "responsiva", segundo King. Isso significa que o governo não liga muito para críticas aos líderes locais. Na verdade, essas críticas podem até ser benéficas para o governo.

"Saber que um líder local ou algum funcionário público estão recebendo críticas severas – talvez por incompetência ou envolvimento em corrupção – é muito importante para o governo", escreveu. "Esse líder pode ser substituído por alguém que possa manter a estabilidade, o que caracteriza o sistema responsivo."

É por isso que críticas são toleradas, mas ações reais não: os posts mais censurados são aqueles que contêm palavras como "massas", "incidente", "terror", "ir para as ruas" e "protesto".

Uma lista das várias opções de censura. Crédito: Science

O que torna o estudo de King realmente notável é o foco nos métodos de censura chinesa, campo que deu origem a uma espécie de Vale do Silício da censura: o governo chinês permite que cada rede social desenvolva seu próprio sistema de censura.

"Concluímos que o governo está incentivando (talvez intencionalmente) a inovação e competição dentro do setor de tecnologia de censura", escreveu King. "A descentralização da implementação de políticas padronizadas como forma de promover o crescimento é uma técnica comum na China."

Se você pensar um pouco, essa estratégia faz sentido. A China mantém a ilusão de liberdade de expressão, visto que a censura está sendo feita por diferentes empresas espalhadas pelo país. Ao mesmo tempo, as empresas sabem que são obrigadas a censurar qualquer conteúdo inflamatório, o que permite que o governo chinês mantenha seu povo sob controle sem expor os seus métodos de manipulação.

Tradução: Ananda Pieratti