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Fernando Rodrigues: É muito difícil dizer com precisão se algum dia nós saberemos todas as picaretagens que possam ter sido cometidas por esses correntistas do HSBC na Suíça, inclusive os do Brasil. A razão é a seguinte: a parte jornalística da apuração tem limites fixados pela lei. Os jornalistas podem ir até onde o ofício permite. A partir daí, a outra parte sempre terá de ser apurada pelos órgãos de controle do governo. Quais dessas contas foram declaradas à Receita Federal do Brasil? Ninguém tem resposta a essa pergunta, com exceção do governo. O governo é quem tem os meios para pesquisar.
Eu não posso te falar sobre nenhum dos empresários, banqueiros, artistas, esportistas, intelectuais que estão na lista. Senão, você vai começar a me perguntar por nomes. Então, prefiro não dizer. Agora, numa lista de quase nove mil clientes, você pode imaginar que uma parte considerável da elite brasileira esteja nela.
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Conversei com o ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel. Pedi que ele especulasse o seguinte: o senhor acha que existe uma razão para alguém do Brasil ter uma conta numerada, sem que apareça o nome, na Suíça, para depois declarar essa conta no Imposto de Renda? 'Seria um situação muito inusitada. Ter uma conta numerada na Suíça é um indício muito grande, justifica a abertura de uma investigação', ele respondeu. Eu não posso afirmar de maneira peremptória, mas posso suspeitar que a maioria abriu uma conta na Suíça para não declarar ao fisco brasileiro. Essas pessoas podem ter cometido um crime.Por que você divulgou alguns nomes e outros não?
Porque há interesse público. Digamos que o José da Silva, que mora na Capela do Socorro, não ocupa cargo público, não é dono de concessão de ônibus, e tem US$ 50 mil, digamos.Claro, mas você mesmo disse que é a elite que está lá. O José da Silva não vai estar lá.
Mas eu não trabalho para fazer reportagem sobre a elite, trabalho para fazer reportagem que tenha interesse jornalístico. Então, se eu puder provar que José da Silva não pagou Imposto de Renda, aí tem interesse público.Se ele for financiador de campanha, há um interesse público. E se ele é empreiteiro, provavelmente ele é financiador de campanha.
Exato. É empreiteiro? Tem obra pública? Tem expressão nacional? Se não, por que eu vou ligar para o José da Silva? Ela não vai falar, porque é um assunto privado. E de fato é. Digamos que ele seja o único dos nove mil que pagou Imposto de Renda. Pelo resto da vida esse desgraçado vai ser chamado de 'José da Silva, aquele que tem conta na Suíça'. E eu serei o responsável, não os professores de jornalismo que querem que eu divulgue o nome do José da Silva de forma indiscriminada e irresponsável. Eu não vou fazer isso.
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Por que eu divulguei primeiro as 11 pessoas ligadas à Lava Jato? Porque é o assunto que as pessoas estão vendo mais. É um critério jornalístico. Se eu achar mais, eu vou divulgar.Não estão Renan Calheiros nem Eduardo Cunha na lista?
Se tivesse um presidente ou ex-presidente da República, esse nome já teria sido publicado.Ou o presidente do Congresso e o presidente da Câmara.
É. Eu não vou falar que tem ou não tem, mas você acha que, se tivesse, eu teria publicado já?Sim.
É uma boa inferência.O que está em debate nesse caso é a qualidade ética do jornalismo feito hoje no Brasil?
O Brasil é um país infantilizado no qual a maioria das discussões são quase sempre rasteiras, epidérmicas e inúteis. Então, acho que não. Ninguém tem vontade de discutir isso com seriedade.Sua apuração tem um padrão ético superior à apuração do caso Wikileaks?
Depende. Eu tive acesso ao material do Wikileaks no Brasil e não publiquei nada sem checar antes, sem ligar, entender, contextualizar, apurar. Então depende de quem publica.
Cite uma que me envolva.Não estou falando que você tenha sido menos criterioso no passado.
Então eu acho que a sua observação é generalista.Bom, o Lava Jato é um exemplo.
Não existe 'a mídia'. É como falar 'o mercado'. Quem publicou? Eu acho, por exemplo, que a cobertura que parte da mídia vem dando à Operação Lava Jato é correta. As pessoas vão lá, em juízo, e prestam um depoimento, esse depoimento tem valor de notícia, tem interesse público. É mentira? Verdade? Não sei, mas a mídia não vai divulgar? Alguns professores de jornalismo questionam 'vai divulgar uma delação premiada?'. Eu digo, 'ora, vai esconder uma delação premiada?'
Eu respondo por mim. Tudo o que eu estou fazendo está de acordo com as regras do bom jornalismo. Nas próximas semanas, publicarei muitos nomes. No Lava Jato é completamente diferente. Nela, a Justiça Federal, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal estão muito à frente. Os agentes públicos entraram na história muito antes dos jornalistas. No HSBC, os jornalistas entraram antes dos agentes. A ordem das coisas altera o produto. São coisas completamente diferentes. Comparar banana com laranja está errado. Tentei estabelecer uma colaboração em nome do bom jornalismo e do interesse público com agentes do Estado que poderiam colaborar na investigação do Swissleaks. Fiz isso de boa fé, fazendo bom jornalismo e fazendo propostas absolutamente legítimas para estes agentes que foram protagonistas de desídia, preguiça e talvez má-fé. Essa minha tentativa foi um fracasso. Eu fracassei. Quem perdeu mais foi o Estado por ter maus funcionários, mal preparados e talvez desleais e criminosos.Você se sente injustiçado, pensando em tudo o que você fez como repórter, nos casos que você revelou, nos casos semelhantes de corrupção do passado?
Não. Isso sempre teve. O Brasil é um país muito caipira, subdesenvolvido e atrasado.