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Quando refugiados não podem usar piscinas públicas

A questão é se o debate foi superado pela histeria em 2013, ou se foi agora.

Matéria original da VICE Alemanha.

Em agosto de 2013, a Speigel Online informou que a cidade suíça de Bremgarten tinha recusado a requerentes de asilo acesso às piscinas públicas locais. Uma correção foi feita depois na matéria. Aparentemente, os refugiados não estavam completamente proibidos de usar as piscinas, eles só precisavam de "autorização oficial" para fazer isso. Mas a manchete da matéria continuou a mesma: "As piscinas públicas de Bremgarten são racistas". A introdução da matéria declarava que a cidade era "um modelo da desumana política de asilo suíça".

Sexta-feira passada, a mesma Spiegel Online, e quase todos os outros canais de notícia em alemão, informaram que outra cidade estava se recusando a deixar refugiados usarem as suas piscinas públicas. Bornheim, perto de Bonn, decidiu tomar essa medida depois de várias reclamações de mulheres de assédio sexual por parte de indivíduos refugiados.

É impossível comparar o tom da matéria com aquela de dois anos atrás. As medidas foram relatadas de maneira bastante séria. O chefe dos serviços sociais da cidade recebeu espaço para explicar que queria suspender a proibição assim que "a mensagem ficasse clara". E também mencionava que a proibição foi "recebida pelos refugiados com compreensão". Outros canais de notícias também publicaram a história sem o menor sinal de desgosto. A Focus Online foi quase elogiosa. "A cidade de Bornheim está tomando ações apropriadas depois dos ataques recentes".

Em termos de criticar a decisão, a maioria dos meios de comunicação se limitaram a citar indivíduos alemães. Por exemplo, o diário regional Kölner Stadt Anzeiger resumiu a opinião das pessoas numa matéria chamada "A reação da internet à proibição dos refugiados nas piscinas", sem oferecer a sua própria.

O Berliner Zeitung, um jornal local, publicou um dos únicos artigos de opinião sobre o assunto. Mesmo com o autor, Joachim Frank, considerando a proibição sem sentido, ele disse que também conseguia entender a decisão. "Você pode ver que os responsáveis não sabem como ajudar de outro jeito", ele escreveu. "Novamente, vemos o que significa ter tantas pessoas chegando até nós num período tão curto de tempo."

Diferente de alguns anos atrás com a Suíça, nenhum canal de notícia mainstream acusou a administração de Bornheim de racismo até agora; a cidade ainda está para ser declarada "um modelo da política de asilo desumana da Alemanha". As coisas mudaram muito desde 2013, o que levou a uma mudança no tom do debate — e é seguro dizer que os eventos da noite de Ano-Novo em Colônia contribuíram com isso consideravelmente. Parece que agora é OK discutir abertamente medidas que dois anos atrás seriam automaticamente condenadas como racistas.

Outro exemplo é a inundação de observações acadêmicas sobre "origem cultural", que supostamente seria responsável pela visão problemática das mulheres que muitos refugiados homens do Norte da África e do mundo árabe têm. Um exemplo importante é o artigo revoltado de Samuel Schirmbeck, ex-correspondente da ARD na Argélia, um dos maiores canais públicos da Alemanha. Ele apontou exemplos alarmantes de violência sexual cotidiana no país e relembrou seu encontro com "um Islã que é hostil contra mulheres, estrangeiros e o pensamento livre". Outros artigos não culpam necessariamente o Islã, mas sim as sociedades patriarcais e condições socioeconômicas dos países de origem dos refugiados.

Leia: Refugiados nos Contaram como É a Vida Depois de Chegar à Alemanha

Antes do Ano Novo, um debate dessa intensidade sobre o caráter de todo um grupo de refugiados e as consequências disso dificilmente seria imaginável. Na verdade, antes foi repetidamente enfatizado que os requerentes de asilo deveriam se orientar pelo nosso "sistema de valores". Mas as dificuldades concretas que surgiriam se eles não se assimilassem nunca foram completamente explicadas. Desde Colônia, todo mundo vem falando que sempre disse que as pessoas deveriam ter cuidado com esses homens. "Finalmente estamos falando abertamente sobre isso", explicou Alice Schwarzer para Ulf Poschardt no Die Welt, o maior jornal da Alemanha. Ela exigiu que "os refugiados" fossem "imediatamente colocados em teste".

A questão é se o debate foi superado pela histeria em 2013, ou se foi agora. A mídia por trás disso foi rápida demais em apontar o dedo para os "racistas" na época, evitando assim uma discussão séria — do tipo que estamos tendo agora? Ou o incidente em Colônia causou um retrocesso coletivo quando se trata de ser cauteloso com julgamentos apressados?

A verdade está em algum lugar no meio. Talvez fosse muito fácil acusar imediatamente qualquer prefeito sobrecarregado que tomava alguma decisão estranha de racismo. Também pode ser essa a razão para as autoridades de Colônia terem ficado de boca fechada por tanto tempo, antes de se abrirem sobre o suposto envolvimento de refugiados nos ataques. Isso também foi uma grande interferência nos relatos do que tinha acontecido na noite de Ano-Novo em Colônia.

Talvez faça mais sentido agora discutir os problemas que podem surgir quando tantas pessoas de uma esfera cultural diferente têm que encontrar sua própria orientação em outro país.

Ao mesmo tempo, é mais importante que nunca que o clima não se desequilibre para nenhum dos lados. Todo caso de um refugiado cometendo crime não é automaticamente notícia depois de Colônia. Não podemos fechar nossas piscinas públicas para todos os refugiados só porque alguns deles têm visões nada saudáveis sobre mulheres. Temos que achar maneiras de tornar esses espaços seguros para todos, sem excluir pessoas por causa do grupo a que pertencem. O blogueiro Sasha Lobo disse isso muito bem:

"Ser civilizado significa poder encontrar nove ruivas e todas serem babacas, mas nem por isso dar um soco na cara da décima ruiva."

Agora que sabemos que nem todos os refugiados são anjos, devemos manter nossa convicção de que todas as pessoas merecem chances iguais.

Tradução do inglês por Marina Schnoor.