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A firma é bico seco: áudio de Renan só mostra que ele é o verdadeiro PMDB

Mesmo gravado na intimidade, o presidente do senado não se incrimina demais e ainda deixa entrever o processo político que levou ao impeachment.

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil

Como já anunciado pelo Netflix dos vazamentos, além do áudio com o semi-ex-ministro-interino do Planejamento Romero Jucá (PMDB-RR), o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado também tinha gravado conversas com o presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL) e com o ex-presidente da República José Sarney (PMDB-MA) – ou seja, era questão de tempo ter acesso também a esses papos.

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Nesta quarta-feira (25) foi a vez do colóquio de Machado com Calheiros ser divulgado pela Folha de S. Paulo. São duas conversas rápidas, provavelmente no gabinete de Renan. Para além das manchetes, que falam sobre mudanças na lei 12.850/13, que versa sobre as delações premiadas, o que transparece na conversa é que Renan, bem ao seu estilo, é mais liso que bagre ensaboado.

O primeiro lero, mais longo, parece ter sido gravado antes da conversa de Machado com Jucá. Nela o ex-presidente da Transpetro discute as "saídas" para o governo Dilma, uma vez que a Lava Jato (e a crise econômica, mais que tudo) corroeu a sua popularidade e estabilidade. Na verdade, Machado fala duas vezes mais que Renan, tentando achar alguma coisa para incriminar o senador – fala em impeachment, xinga o Procurador Geral da República Rodrigo Janot, tenta levantar algum B.O.

Mas Renan é impassível, e demonstra saber que não pesa nada contra ele, apesar da chapa do amigo estar esquentando. Para arrefecer a Lava Jato, sua única proposta é tentar uma mudança legislativa que não permita a delação premiada sob prisão preventiva, prática comum na operação. Para além disso, Renan enrolou, falou que Lula sabe estar sob risco, chama Delcídio de "rebotalho" e critica a relação de Michel Temer com Eduardo Cunha.

Mas, ao longo do papo, vamos conseguindo olhar por trás das cortinas do processo de impeachment. Renan, por exemplo, teria conversado com Dilma, e ela teria dito que Ricardo Lewandowski, presidente do STF, só queria falar sobre o aumento do judiciário.

A segunda conversa é mais rápida. Voltam a falar de um possível semi-parlamentarismo (com Lula como primeiro ministro, como indicado na conversa anterior) como alternativa ao impeachment. Renan revela que existiram conversas com poderosos da mídia brasileira – Otávio Frias Filho, da Folha de S. Paulo, diz que seu grupo teria cometido "exageros", enquanto João Roberto Marinho se desculpou com Dilma, que havia reclamado na disparidade da cobertura, dizendo que havia um "efeito manada" contra a presidente.

Já Machado acha que o PSDB, principal oposição ao governo petista desde 2002, deveria ser "mais racional" e que "não sobra ninguém" – provavelmente se as investigações continuarem. Renan dá razão, afirmando que Aécio Neves estaria "morrendo do medo".

As duas conversas mostram que a resiliência de Renan no poder emana da sua capacidade camaleônica – ele é a verdadeira alma centrista do PMDB. Se recusou a votar no impeachment, demonstra trânsito entre imprensa, a presidente afastada, o próprio partido e a oposição. Essa aura de conciliador parte do princípio de que ele tem a certeza absoluta que nada pesa contra ele, e que Janot vai ter que cavoucar bastante para incrimina-lo – a própria repercussão do áudio, menor que a do caso Jucá, mostra isso.

Calheiros se equilibra num espaço exíguo e muito especial. De um lado, tem a capacidade de articulação política de um Eduardo Cunha, de outro, a certeza de santidade de saber que a PGR está bem longe dos seus esqueletos. Com toda a raposidade, mas mais sujo que pau de galinheiro, Cunha caiu. Munida da mais absoluta certeza da inocência, mas com a capacidade de negociação de um atendente de telemarketing, Dilma caiu também. Entre eles, Renan sai vivo do tiroteio e até da arapongagem – se deixar, se reelege senador. Se a política brasileira fosse kung fu, Renan seria seu novo Bruce Lee.