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Uma Breve História de Protestos Envolvendo cocô

Examinamos a tendência de utilizar armas fecais em protestos, lógicos e ilógicos.

No mês passado, uma série de protestos teve início nos campus universitários da África do Sul, cujo foco abarcava, principalmente, a continuação das realidades da desigualdade racial e do privilégio branco no mundo pós-apartheid. Tudo começou na Universidade da Cidade do Cabo, onde os estudantes vandalizaram uma estátua do colonialista (e o homem que forneceu as terras à faculdade em 1918) Cecil Rhodes, considerado um símbolo ofensivo de opressão; em seguida, os protestos se espalharam para a University of KwaZulu-Natal e a Rhodes University, incluindo agora táticas como ocupações. Mas, enquanto alguns temem que esse movimento possa sinalizar um surto de confronto racial na nação, a maioria dos meios de comunicação se fixou numa das táticas usadas pelos manifestantes: jogar fezes humanas na estátua de Rhodes durante os primeiros protestos, em março.

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"A questão do cocô é muito metafórica para nós", disse o líder dos estudantes, Chumani Maxwele, para a Al-Jazira. "Estamos usando metáfora para explicar nossa dor coletiva. Mostramos, assim, nosso desgosto coletivo."

Dada a maneira como os protestos estão sendo cobertos mesmo um mês depois do início (se é raro encontrar uma manchete que não destaque o cocô, fica mais difícil ainda encontrar um artigo que não faça referência a isso), você pode achar que protestos baseados em merda são raridades. Mas tivemos pelos menos dois outros grandes exemplos de dissidência diarreica apenas em março de 2015:

Nos EUA, o general da Marinha Josh Kelly teria dito a um comitê de senadores que os detidos de Guantánamo estão começando a usar misturas de fluidos corporais, incluindo cocô, contra os guardas. Enquanto isso, no distrito de Latehar, Estado de Jharkhand, Índia, manifestantes adivasi (uma tribo nativa) organizaram um cagaço público, usando como penico cópias da nova lei de terras do governo central, que eles acreditam prejudicar ainda mais a comunidade já marginalizada.

Os dois casos parecem estar de acordo com a filosofia do ativismo anal (porque, sim, as pessoas já filosofaram sobre isso), que descreve o uso desses materiais como ferramentas de protestos, constituindo uma ação de extremo de desespero. Ato único de depravação, quase um tabu universal, isso é visto como uma medida extrema. É assim que Abhay Xaxa, líder do protesto adivasi em Jharkhand, vê isso também: segundo Xaxa, eles partiram para a tática depois que um protesto de 30 mil adivasis no Estado vizinho, Chhattisgarh, foi praticamente ignorado, os fazendo buscar outros métodos.

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"Protestos com cocô não são uma forma nova de agitação", Xaxa falou ao India Resists. "Na verdade, na história, sempre que massas oprimidas usaram sua merda como arsenal, os governantes tremeram, porque isso geralmente marca o começo de um levante social."

No entanto, essa análise elevada pode estar dando crédito demais à humanidade. As pessoas parecem recorrer a seus sólidos em disputas pessoais com frequência – e quase sem pensar.

Apenas na área de Nova York, o site Gothamist registrou na última década pelo menos quatro disputas triviais que acabaram em brigas fecais. Em 2006, um morador de Manhattan perseguiu uma menina de 13 anos que não pegou o cocô de seu chihuahua e esfregou a merda no cabelo e no uniforme escolar dela, supostamente como uma lição. Em 2010, um homem de Staten Island foi acusado de comportamento criminoso e pichação (parece que essa é a classificação legal que tipifica o delito de se passar cocô nas coisas) por esfregar sua merda na porta do vizinho depois de uma briga. (Um episódio similar se desenrolou entre um escultor de Bowery e a galeria de arte vizinha no ano seguinte.) Em 2013, uma mulher de Hoboken, puta com uma multa de estacionamento, pegou cocô da rua e jogou na cara do oficial que tinha acabado de escrever a citação.

Essa vontade humana de recorrer a armas retais pode explicar os numerosos casos de protestos, lógicos e ilógicos, relacionados a cocô que vimos nos últimos anos:

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Em 2011, pelo menos um manifestante achou que seria uma boa ideia cagar em cima de um carro da polícia nos protestos do Occupy Wall Street (apesar de toda crítica que eles estavam recebendo por causa da pouca higiene nos acampamentos e independentemente da variedade de outros meios de dissidência mais eficientes que estavam disponíveis).

No ano seguinte, membros do Exército Republicano Irlandês Continuidade presos na instalação de segurança máxima de Maghaberry, nos arredores de Belfast, lançaram um "protesto sujo" contra os novos protocolos de revista de corpo inteiro da cadeia, lambuzando suas celas com merda. Isso foi um retorno à estratégia dos prisioneiros do IRA mantidos em condições desumanas na prisão de Maze, Norte da Irlanda, no começo dos anos 80. Nos Eua, teve aquele maluco que cagou numa cruz também.

Em 2013, manifestantes da Cidade do Cabo, África do Sul, talvez tenham plantado a ideia na cabeça dos estudantes atuais ao terem lançado um movimento (intestinal) em massa, jogando bosta no prédio legislativo da província, no aeroporto internacional, no ônibus que transportava o premiê regional e em assentamentos pobres, tudo para protestar contra as péssimas condições de higiene e a desigualdade econômica na cidade. No mesmo ano, uma tática similar se espalhou pelo Zimbábue, onde um homem desencadeou uma discussão sobre liberdade de expressão depois de usar um cartaz de campanha do ditador/presidente Robert Mugabe como papel higiênico.

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Até texanos parecem ter se juntado ao movimento, pois há relatos, altamente contestados, de que, naquele verão, 18 potes de fluidos foram confiscados de manifestantes pró-escolha do lado de fora do Senado do Estado, que debatia novas restrições ao aborto na época.

Mas 2014 leva o prêmio como o ano em que deu mais merda (em protestos). Em janeiro, um criador de cavalos francês, acusado de usar fezes de animais em protestos anteriores, levou um caminhão cheio de bosta de cavalo até a Assembleia Nacional em Paris e despejou tudo na frente do prédio, como um grande foda-se ao novo imposto sobre atividades equestres. Em março, na cidade de Brest, noroeste da França, um homem (que já tinha mijado nos computadores do correio local) enfiou suas fezes nas aberturas de dinheiro de 17 caixas automáticos, aparentemente para protestar contra O Sistema. Alguns meses depois, em agosto, uma dissidente egípcia (que fugiu do país em 2011, depois que fotos nuas dela num protesto a colocaram em problemas com as autoridades, e acabou na Suécia, envolvida com o grupo radical feminista Femen) chegou às manchetes por menstruar numa bandeira do Estado Islâmico, enquanto outra mulher de hijab preto, de costas, defecava sobre o símbolo do ISIS. Dois meses depois, num caso mais particular de ultraje, um anão da cidade inglesa de Hull decidiu demonstrar sua frustração com a falta de instalações públicas especiais, cagando na recepção de um prédio municipal. E finalmente, em novembro, o Cards Against Humanity decidiu protestar contra o consumismo do Black Friday vendendo caixas de bosta de vaca (bullshit), que estavam explicitamente rotuladas assim. Eles venderam seu estoque de 30 mil caixas em meio dia.

(A menção honrosa de 2014 vai para um grupo de Hong Kong que, em agosto, decidiu demonstrar sua frustração com os turistas chineses, que permitem que suas crianças se aliviem em público, se fantasiando, desfilando por armadilhas de turistas em Harbor City e fazendo cocôs falsos diante do público local e de visitantes, atraindo a atenção da mídia.)

No entanto, voltando mais que isso, começa a ficar difícil encontrar casos de protesto com cocô. Dois casos emergiram em 2008, mas, no geral, tais demonstrações só aparecem ocasionalmente – os protestos do IRA na prisão sendo o caso mais notório. Isso pode significar que a mídia mainstream não estava acompanhado uma tendência mundial de ativismo intestinal até recentemente. Ou que estamos vendo uma explosão de ação com excrementos nos dias de hoje. De qualquer maneira, os protestos fétidos da Cidade do Cabo certamente não são sem precedentes, especialmente na história recente. E é bem provável que vejamos muito mais merde nas manchetes sobre movimentos sociais nos próximos meses e anos.

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Tradução: Marina Schnoor