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Fotos

Uma Dúzia de Roses: Robert Melee Fala sobre Fotografar sua Mãe

O Robert Melee resolveu fazer uma extensa série de fotografias da sua mãe. Da mãe dele, não da sua.

Robert Melee geralmente incorpora um elemento do cotidiano ou pessoal mesmo em seus trabalhos mais formais. Por exemplo, suas pinturas sobre tampinhas de garrafa fixadas no gesso, que são explorações sérias da cor, ainda geram a pergunta: "Ele bebeu todas essas cervejas sozinho?" Em seu corpo de trabalho multimídia, Melee já usou painéis de madeira falsos, bandejas de prata, festão, filmagens de relação sexual, filmagem de um bêbado desavisado feita através de um olho mágico, queijo líquido, chapeuzinhos de festa, seus amigos, ele mesmo e, no que provavelmente são suas obras mais conhecidas, sua mãe.

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Como o título da exposição sugere, a dozen Roses, que aconteceu na galeria Higher Pictures ano passado, apresentava doze imagens da mãe de Melee, Rose. Nessas fotos, escolhidas de uma extensa série que o artista realizou entre 1993 e 2004, encontramos o tema envolvido em uma variedade de cenas peculiares. Numa das fotos, ela está nua numa floresta coberta de neve, usando muito delineador, com os lábios pintados de preto e o rosto coberto de pó branco. Em outra, ela está arrumada como uma drag queen, se divertindo no banco do carona de um conversível num passeio pelo cemitério. Também testemunhamos Rose de quatro, posicionada em cima de uma mesa de cozinha usando uma lingerie sensual, com panelas, tampas e uma chaleira empilhadas nas suas costas.

Falei com Robert sobre a gênese do seu trabalho, como é voltar a ele agora e como ele convenceu sua mãe a participar.

VICE: Acho que nos conhecemos num salão de Matthu Placek em 2011. Mais tarde naquele ano, você me convidou para me apresentar na sua abertura na Andrew Kreps, e fomos gradualmente nos conhecendo mais depois disso. Eu sentia falta das apresentações originais envolvendo sua mãe, então estou feliz em poder ver essa exposição.
Robert Melee: É, nos conhecemos num dos salões do Matthus.

Antes esses trabalhos eram exibidos entre instalações, vídeos e, às vezes, sua própria mãe em carne e osso. Como você se sente revisitando essas imagens hoje e as visualizando como fotografias puramente?
Quando estava experimentando com fotos e vídeos no começo dos anos 90, eu sabia que elas seriam um dos muitos elementos em minhas esculturas. Não tiro uma foto da minha mãe há mais de dez anos, mas tenho montado uma monografia desse trabalho desde o ano passado. Nunca tive uma exposição de fotos emolduradas individualmente. Mas pareceu natural mostrá-las depois do livro terminado, então perguntei à Higher Pictures se eles estavam interessados em exibir esse trabalho, e felizmente eles estavam. Eu estava ansioso para dar nova vida a ele.

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Como você abordou sua mãe para participar? Foi tipo "Mãe, bota uma maquiagem na cara e tira a roupa; nós vamos pra floresta", ou algo assim? Ela topou na hora ou resistiu?
Depois da minha primeira instalação, Baloneyism, que consistia de móveis cobertos de plástico, portas de geladeira, um carpete felpudo coberto com 75 litros de tinta látex e paredes cobertas com painéis imitação de madeira pintados, eu não queria repetir o processo, mas queria continuar no contexto.

Do interior doméstico suburbano?
Sim. Então abandonei a solidão de criar objetos em estúdio, e por mais de dez anos fiz "fotos" e "vídeos caseiros" de amigos, conhecidos, estranhos e da minha mãe. Eu a abordei pela primeira vez numa visita à casa dela. Perguntei se eu podia tirar algumas fotos para um projeto, e ela concordou. A primeira sessão levou 15 minutos. Os resultados foram tão fortes, e estávamos tão relaxados, que fizemos outras – ela vinha me visitar ou eu ia visitá-la, nós tomávamos uns drinques e eu a maquiava e a vestia, e via o que acontecia. Foi na segunda sessão, quando ela me visitou em Nova York, que ela decidiu que seria mais interessante se ela tirasse a roupa. O que eu podia dizer?

Ela se divertiu? E você?
Toda a personalidade dela mudava quando eu terminava o cabelo e a maquiagem. Ela ficava muito extravagante. Acho que ela gostava da atenção e do glamour das sessões de fotos. Até hoje ela me agradece por todas as situações interessantes onde a gente se meteu.

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As sessões nunca eram discutidas antes, e nunca fizemos brainstorm. Essas sessões eram bem íntimas – mais ninguém no set. Eu fazia toda a maquiagem e figurino, e fazia malabarismos com câmeras de foto e de vídeo, ou usava um tripé quando necessário.

Quando eu mostrava os resultados, ela criticava o trabalho como uma produtora: "As pernas estão ótimas nessa" ou "A peruca ficou louca nessa". Mesmo nas imagens menos lisonjeiras e perturbadoras, ela dizia: "Eles vão amar essa. Essa aqui vai vender".

Pelo press release, parece que ela estava bêbada em todas as fotos. Isso era uma restrição da série, ou só aconteceu assim? Você também estava bêbado?
Minha mãe, que hoje tem 79, raramente bebia naquela época. As sessões eram sempre agendadas com as visitas, e gostávamos de beber nesses momentos. Isso sempre ajudou minha mãe a relaxar antes que eu dissesse, por exemplo, "quero me filmar te dando um banho".

Quando fiz meu Talent Show na Kitchen, encontrei minha mãe na Penn duas horas antes do começo. Tomamos uns drinques na estação e pegamos um táxi direto para o show. Eu disse que queria mostrar uma coisa para ela. Aí mostrei o palco que eu tinha criado e disse que éramos a primeira apresentação – que ela teria que tirar a roupa e que eu ia jogar tinta nela, para combinar com o design no cenário, ao vivo na frente do público. Ela disse "O quê?" Mas logo depois concordou em participar, duas noites seguidas. Na primeira noite eu fui com ela até os bastidores para limpá-la. Na segunda noite, a pedido dela, ela só vestiu um roupão e se sentou na plateia para assistir todas as outras performances, com tinta látex cobrindo todo o corpo. Ela se divertiu muito!

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Essas fotos foram tiradas num período de mais de dez anos. Quando você soube que a série tinha acabado? E você sabia o que ia fazer depois?
A série acabou quando eu não tinha mais nada a dizer. Na época, eu tinha exaurido a maioria das minhas ideias com foto e vídeo, e não só parei de fotografar e filmar minha mãe como parei com isso no geral por cerca de uma década. Comecei a fotografar de novo para minha exposição de 2011. Foi aí que comecei a experimentar com telas verdes. Apresentei 11 novos vídeos e muitas fotos nessa exposição. Eu queria fazer um trabalho tão psicologicamente carregado quanto o anterior, mas menos óbvio do que foto e vídeo. Foi quando comecei a explorar escultura figurativa, apresentadas pela primeira vez na minha exposição solo In Between False Comforts, de 2005.

São doze imagens nessa exposição, mas há muitas outras. Como você selecionou essas doze fotos em particular?
São mais de 300 imagens nesse corpo de trabalho, então não foi uma escolha fácil. A Higher Pictures e eu decidimos apresentar uma variedade de imagens de doze sessões diferentes, em vez de formar uma narrativa.

Fazer de um de seus pais o tema do seu trabalho e colocá-los num mundo onde você pode controlá-los, em certo nível. Você devia estar procurando conexão, reconciliação, vingança, catarse… Ou talvez uma leitura psicológica seja redutiva ou até inapropriada para o trabalho. Você tem algo a dizer sobre o que te levou a trabalhar ao redor, e com, a sua mãe?
Vamos dizer que foi muito interessante ser criado por essa mulher. Passamos por muitas dificuldades sérias, e no final da minha adolescência nós não conversávamos muito. Foi através desse trabalho que nos aproximamos de novo. As sessões de foto eram como sessões de terapia. A maquiagem que deveria levar uns 20 minutos levava duas horas, porque mamãe queria falar! Isso se tornou rotina. Ela me contava experiências de infância muito pessoais, que explicavam seu método de criar os filhos. Ela pedia perdão, e eu a perdoava, o melhor que eu podia.

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Essas fotos são exagerações dela, caricaturas. São minhas memórias de quando ela era extremamente inquieta, sem medo de se maquiar – com coragem de usar microssaia e bota no shopping local, com eu bebê no carrinho. A cor do cabelo dela mudava todo mês, e nossos móveis eram rearranjados infinitas vezes.

Isso não é tão relevante para a exposição atual, mas fiquei curioso. Alguém a contratou quando ela se colocou como "disponível" na última exposição?
Na abertura da minha exposição You Me and Her, de 2002 em Nova York, ela ficou atrás de um vidro de segurança. Ela recebia as pessoas fumando, bebendo e usando só um boá de plumas e salto alto. Isso foi documentado num monitor de vídeo colocado com ela naquele espaço. Acho que a lista de preço dizia que ela estava disponível por $6 mil a hora. Ninguém pagou para passar tempo com ela.

Que pena. Então você está produzindo um livro de fotos?
Sim, é basicamente tudo; temos dois ensaios já escritos para esse livro, um pelo meu irmão Ed e outro pelo artista Michael Bilsborough. O título provisório é Unavailability. Atualmente estou procurando uma editora.

E o que vem agora?
Comecei a combinar minhas fotos com trabalhos em gesso e fibra de vidro. Também tenho uma exposição solo na David Castillo em Miami e na Andrew Kreps em Nova York em 2015. Veremos.

Robert Melee: a dozen Roses ficou em exposição na Higher Pictures Gallery até agosto de 2014.

Joseph Keckler é um artista interdisciplinar, escritor e barítono operístico. O Village Voice o nomeou "O Melhor Artista Performático do Centro" em 2013. Siga-o no Twitter.

Tradução: Marina Schnoor