Vera Lúcia: a líder sindical negra que prega a revolução socialista

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Quem quer ser presidente

Vera Lúcia: a líder sindical negra que prega a revolução socialista

Na série de apresentação dos presidenciáveis para 2018, a VICE conta a trajetória de Vera Lúcia, do PSTU.

Se você acha que o PT e Jair Bolsonaro são os dois extremos que disputam esta eleição presidencial, é hora de rever seus conceitos e conhecer Vera Lúcia, a candidata que representa o PSTU. Depois de ler este texto, vai ficar difícil continuar a chamar Lula ou Fernando Haddad de “esquerdistas bolivarianos que querem implantar uma ditadura comunista”.

Vera, é verdade, iniciou sua vida partidária no PT, no começo dos anos 1990. Tinha pouco mais de 20 anos e já fazia parte do movimento sindical que conheceu ao arrumar um emprego numa fábrica de calçados em Aracaju. Ela nasceu em Irajá, no sertão de Pernambuco, e mudou-se com a família ainda criança para a capital sergipana; antes da fábrica, trabalhou como garçonete, datilógrafa e escriturária.

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Mas o PT era revolucionário de menos para Vera, que entrou na Convergência Socialista, uma das dezenas de tendências que formavam o PT na época. Esse grupo foi expulso da legenda em 1992, depois que o então presidente do partido, José Dirceu, conhecido por seu estilo autoritário ao lidar com as divisões petistas, implantou uma série de medidas para tentar disciplinar os filiados, que incluíam a proibição de jornais e sedes próprias de cada tendência. Era uma tentativa de organizar a confusão dentro de um partido nascido nos anos finais da ditadura militar, fruto da junção de intelectuais marxistas (muitos deles retornando do exílio), líderes católicos ligados à Teologia da Libertação e dirigentes sindicais, muitos deles que nem mesmo se identificavam com a esquerda – como o próprio Luiz Inácio Lula da Silva já admitiu em entrevistas.

A CS acabou expurgada do PT por defender o impeachment de Fernando Collor de Mello antes de virar modinha – já em abril de 1992 eles foram às ruas com faixas “Fora Collor”, enquanto o PT só entrou oficialmente na disputa para derrubar o presidente em julho. O novo partido nasceria no ano seguinte, primeiro com o nome de Partido Revolucionário dos Trabalhadores e depois com o nome definitivo, Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado.

Vera se filiou ao novo partido em 1994 – mesmo ano em que a legenda, ironicamente, apoiaria a candidatura fracassada de Lula, derrotado por um Fernando Henrique Cardoso turbinado pelo Plano Real. Nas cinco eleições presidenciais seguintes, o partido lançaria candidato próprio em quatro: 1998, 2002, 2010 e 2014, sempre com José Maria de Almeida, consagrando o slogan “Contra burguês, vote 16”. A exceção foi em 2006, quando o partido apoiou a campanha de Heloísa Helena, do PSOL.

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Neste ano, o partido resolveu apostar numa cara nova. Vera Lúcia já é figurinha carimbada no Nordeste, e foi candidata do PSTU à prefeitura de Aracaju nas últimas quatro eleições, tendo o melhor resultado em 2012, com 20.241 votos, ou 6,6% dos votos válidos. Em 2006 e 2014, tentou uma vaga na Câmara Federal, e em 2010 saiu para governadora de Sergipe, também sem sucesso.

Mas a eleição, para Vera e o PSTU, não é a principal preocupação. O partido aproveita o horário eleitoral e as entrevistas com os candidatos, como esta na TV Brasil, apenas para divulgar sua mensagem, que considera o processo eleitoral uma farsa burguesa, comandada pelo poder econômico, com aval de outros partidos ditos de esquerda – o PT e o PC do B estão sempre na alça de mira da legenda, com mais rigor até que as legendas conservadoras, porque o PSTU considera que elas iludem os trabalhadores ao aceitar participar do processo eleitoral. “Para combater o capitalismo é preciso enfrentar a burguesia, mas também os reformistas que atuam para manter esse sistema”, escreve o partido no site em que estabelece seu programa de governo.

E a mensagem é clara: implantar uma revolução socialista, com a adoção de conselhos populares que vão governar o povo – isso mesmo, uma versão brasileira dos sovietes, os conselhos representativos de trabalhadores estabelecidos após a Revolução Russa de 1917. Para isso, defendem uma educação popular que conscientize os brasileiros.

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No plano imediato de governo, Vera fala na estatização de pelo menos 100 empresas privadas consideradas estratégicas para aquecer a economia nacional e gerar empregos – mas jura que a expropriação será apenas de grandes empresas, defendendo os pequenos e médios empresários. Para empoderar o trabalhador, a promessa é ampliar o salário mínimo para R$ 3.752,65, valor calculado pelo Dieese no começo deste ano como ideal para sustentar uma família de quatro pessoas. O Dieese é um grupo de estudos econômicos mantido por sindicatos.

A candidata também promete revogar todas as medidas do governo Michel Temer que considera prejudiciais aos trabalhadores, como a limitação do teto de gastos e a reforma trabalhista. A quem acusa a esquerda de “querer transformar o Brasil numa Venezuela”, diz que o país de Chavez e Maduro não é um modelo: “É um Estado capitalista”. Também está no programa de governo uma ampla reforma agrária, com o fim de todos os latifúndios e a prioridade na agricultura familiar.

E Lula? Para a candidata, “está colhendo o que plantou” – o PSTU, ao contrário de outras legendas que foram oposição à esquerda aos governos petistas, como o PCB, o PCO e o PSOL, não participou das manifestações pedindo a libertação do ex-presidente, que considera sua prisão pela Operação Lava Jato como um misto de erro judicial e perseguição política. “Não saímos em defesa de Lula porque ele optou por governar com esses setores que estão enlameados na corrupção, e se lambuzou também”, disse Vera em entrevista à BBC Brasil.

Até agora, a posição revolucionária do PSTU não encontrou respaldo eleitoral. O melhor desempenho de Zé Maria em suas quatro candidaturas presidenciais foi em 2002, quando recebeu 402.236 votos, ou 0,47% dos votos válidos. Nas pesquisas realizadas pelo Datafolha até agora, Vera Lúcia alcança sempre a marca de 1% das intenções de voto.

Vera Lúcia Pereira da Silva Salgado
Formação: Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Sergipe
Idade: 51
Patrimônio: R$ 20.000,00
Trajetória (partidos): PT-PSTU
Vice: Hertz Dias (PSTU)

Acompanhe as trajetórias de todos os presidenciáveis na série Quem quer ser presidente .

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