Drogas

2015 foi um ano espectacular para a erva na América, e 2016 será ainda melhor

Na política norte-americana há um velho adágio que diz algo parecido com isto: “Como vai o Ohio, assim vai a Nação”. E ainda que isto possa ser verdade no que diz respeito a campanhas presidenciais – o último candidato a chegar à Casa Branca sem ganhar aquele estado foi John F. Kennedy, em 1960 -, os “stoners” dos Estados Unidos bem podem rezar para que a máxima não se aplique à legalização da marijuana.

Em Novembro último, uns representativos 64 por cento dos votantes no Ohio rejeitaram o “Issue 3”, uma iniciativa de cariz eleitoral que pretendia legalizar a cannabis de uso recreativo para adultos a partir dos 21 anos de idade. O resultado acabou por ser contrário à tendência nacional: 58 por cento dos americanos dizem agora que a erva deve ser legalizada, naquela que é a maior percentagem de sempre favorável ao direito a qualquer cidadão poder apanhar valentes mocas se assim o entender.

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A falha fatal na proposta do Ohio reside no facto de que, se tivesse sido aprovada, contribuiria para criar o primeiro oligopólio de marijuana do mundo, já que concederia direitos exclusivos de plantação da erva legal do Estado a apenas uma mão cheia de produtores, já de si bastante ricos, e que incluía, por exemplo, a lenda da NBA Oscar Robertson, o antigo membro da “boy-band” 98 Degrees, Nick Lachey, e um descendente do presidente William Howard Taft. Tal e qual um “space cake” excessivamente potente, a perspectiva de um grupo selecto sacar todos os lucros da legalização, parece ter sido demasiado indigesta para os votantes.

Enquanto os nativos do Ohio decidiram não embarcar na tendência da erva, as experiências em curso noutros estados e até noutros países por esse mundo fora continuam em marcha com diferentes graus de sucesso. No Colorado e em Washington, os dois primeiros a abraçarem a marijuana recreativa, o negócio floresce. Em Washington estima-se que as vendas de erva legal atinjam os 2.3 milhões de dólares por dia e tenham gerado cerca de 65 milhões em impostos só no ano fiscal de 2015. O Colorado vende agora 100 milhões de dólares de erva por mês e o Estado encaixou 60 milhões nas colectas respeitantes a 2015.

O Oregon foi, em 1998, um dos primeiros estados a legalizar a marijuana para fins medicinais, e a sua nova lei dirigida ao uso recreativo entrou em vigor em Julho último, debaixo de um clima generalizado de grande expectativa e euforia. Atraídos pelas promessas de um gajo chamado Pork Chop, que garantia que iria oferecer perto de 200 quilos de erva, no dia 1 de Julho milhares de pessoas juntaram-se numa ponte mesmo no centro de Portland à espera da meia-noite, hora a que a lei se tornaria oficial. Apenas uns dias depois dessa concentração pública, vários produtores e vendedores anunciaram nova oferta, numa demonstração do poder de uma indústria avaliada em 2.7 biliões de dólares a nível nacional. Quando as primeiras lojas de erva para fins recreativos abriram no Oregon, em Outubro de 2015, venderam cerca de 11 milhões de dólares só na primeira semana.

A população de Washington DC votou de forma esmagadora a favor da legalização da erva e a lei entrou em vigor em Fevereiro, permitindo que adultos possam estar na posse de até cerca de 55 gramas, ou que cultivem até três plantas. No entanto, devido à obstrução do Congresso, o Estado ainda não tem um sistema funcional para regular o imposto sobre a venda do estupefaciente, ou seja, apesar de tecnicamente ser legal fumá-las em DC, a cidade está a perder a oportunidade de facturar, tal como muitas outras cidades “verdes” estão a fazer.

Ao todo, 23 estados e a capital norte-americana autorizam neste momento alguma forma legal de consumo de cannabis. Enquanto os opositores da legalização continuam a argumentar que a situação vai levar a que os jovens se tornem meros mocados apáticos e possam, eventualmente, seguir o caminho das drogas duras, os últimos dados estatísticos apontam para que o uso de marijuana por adolescentes não se alterou e que o consumo de drogas duras nessas faixas etárias está em declínio. O crime violento e o crime contra a propriedade também decresceram no Colorado desde que a lei da erva entrou em vigor.

Do ponto de vista da justiça criminal, parece que a maior falha nas políticas de legalização e descriminalização reside no facto de as minorias continuarem a ser vítimas de prisão por posse de pequenas quantidades. Em Nova Iorque, onde pessoas que agora sejam apanhadas com menos de 25 gramas supostamente são multadas e não presas, 86 por cento das detenções na cidade por pequenas quantidades de erva envolveram em 2015 afro-americanos e latinos. No Colorado, os detidos por questões relacionadas com marijuana caíram em cerca de 95 por cento, mas, de acordo com dados da “Drug Policy Alliance”, os residentes negros ainda têm mais probabilidade de ser presos que os seus vizinhos brancos.

Os críticos também reclamam que a erva está agora a saltar para fora dos estados onde é legal, e a entrar em zonas onde a proibição é absoluta. E aparentemente é verdade – A VICE News falou recentemente com “dealers” e produtores do Oregon e de Washington, que confirmaram aproveitar as vantagens bastante lucrativas da venda do seu produto noutros estados. O Nebraska e o Oklahoma já processaram o Colorado por causa deste efeito colateral da legalização e ambos os casos estão pendentes de dar entrada no Supremo Tribunal. O Solicitador Geral dos Estados Unidos – um dos advogados de topo do Governo Federal – apelou recentemente ao Tribunal para que não aceite o caso.

Vê o documentário da VICE News: “Inside America’s Billion-Dollar Weed Business: The Grass Is Greener”.

a sua primeira colheita de marijuana decreto caminho lento prometeu Supremo Tribunal do México toneladas de erva há sinais

Muitos peritos em políticas de droga concordam que a única forma de eliminar completamente o mercado negro da cannabis é acabando de vez com a proibição – e, apesar do voto negativo do Ohio, os Estados Unidos podem mesmo estar à beira de dar esse passo. O Nevada votará a legalização este ano, e na Califórnia, uma iniciativa de cariz eleitoral apoiada pelo fundador do Napster, Sean Parker, e vários grupos de peso na área da advocacia está também prevista para 2016. Uma série de outros esforços de legalização estão também em curso em 16 estados, incluíndo Michigan, Florida e Massachusetts.

E, se calhar até mais importante, o próximo Presidente a ser eleito nos Estados Unidos pode trabalhar no sentido de tirar a marijuana da Categoria de Nível I das substâncias controladas (onde actualmente se encontra ao lado da heroína, LSD e outras drogas duras), ou apoiar a legislação para tornar a erva legal no conjunto dos 50 estados. Entre os candidatos democratas, Hillary Clinton já apelou para que se passe a classificação da marijuana para droga de Nível II, enquanto Martin O’Malley e Bernie Sanders querem mesmo retirá-la da classificação como droga.

Entre os candidatos republicanos, Donald Trump, Ted Cruz e Jeb Bush – que admitiu inclusive ter fumado há 40 anos atrás quando andava no Liceu – dizem que são a favor de que se deixe cada Estado decidir por si próprio nesta matéria, enquanto Rand Paul já há muito que expressou o seu apoio a uma legalização total. Ben Carson, por sua vez, diz que vai intensificar a guerra às drogas, e Carly Fiorina opõe-se à erva legal por causa da luta da sua filha contra o álcool e drogas de prescrição médica. Marco Rubio apoia o uso médico limitado, mas é contra a legalização. Chris Christie já jurou que vai acabar com a legalização a nível estadual assim que for eleito.

Claro que, para ditarem o futuro da erva legal nos Estados Unidos, estes candidatos presidenciais terão que, em primeiro lugar, vencer as eleições gerais – e para fazerem isso, provavelmente têm de ganhar no Ohio.

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Este artigo foi originalmente publicado na VICE News.