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Música

O Guia VICE para Raves

Todo mundo é raver hoje em dia. O futuro vislumbrado pelos filmes nos anos 1990, em que todos curtem techno e têm cabelo verde-geleca, está sobre nós.

Foto por Alex Patterson.

Todo mundo é raver hoje em dia. "A música com guitarras morreu", é bem o tipo de coisa que seu pai diria – e isso afirma o quão ela está mesmo morta. Agora, só importam batidas, efeitos e firulas. O futuro vislumbrado pelos filmes nos anos 1990, em que todos curtem techno e têm cabelo verde-geleca, está sobre nós.

Mas enquanto muitos de nós vão a raves, a grande maioria da galera entende tudo errado. Sejam as drogas, a alegria, os banheiros coletivos ou a pressão em não parecer um babaca, em geral, acabamos parecendo uns babacas. Ficamos de olho no DJ, damos soquinhos no ar, beijamos europeus e torramos nossos salários em bebidas e drogas, para vomitar tudo no fim da noite.

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Então, trate este artigo como algo do tipo Curtindo Raves para Idiotas: um manual de autoajuda para pessoas que conseguem lidar com ressacas de uma semana. Talvez pareça meio fascista dizer às pessoas como se comportarem em um evento que deveria tratar de pura liberação hedonística, mas assista a esse vídeo e você entenderá que a nova turma de formandos do curso de entusiastas em raves poderia se valer de um pouco de orientação.

SE PREPARANDO

Isso é imperativo. Ficar bonito é uma das pedras fundamentais da cultura jovem; porém, não é esse o caso se você escolhe usar bermudas de surfista e camisetas com slogans pró cultura do estupro. Lembre-se, esse senso importantíssimo de pertencimento estético é a base de todos os grandes movimentos culturais.

Só que não. Algumas pessoas ainda se esforçam bastante, mas, de verdade, quanto tempo você pode passar buscando o ângulo perfeito para seu boné da Night Slugs? Você não é o Michael Alig ou Sting em Quadrophenia; você é só um desses caras que retoca o penteado uma vez por semana. Ficaram no passado os dias de pessoas armando os cabelos com ovos e cola, passando suas jaquetas Mohair ou derramando tinta azul sobre suas cabeças.

A moda nos clubes de hoje, em geral, é confortavelmente utilitária: fácil de usar, lavável em máquina e, provavelmente, não resultará em um ataque durante o café da manhã da ressaca dominical. Claro que seria ótimo se alguém resolvesse ir um pouco mais além, mas, em que direção? Pessoas de pé ouvindo batidas repetitivas têm um histórico vergonhoso de alfaiataria, ligado à dreadlocks descoloridos e polainas de peliça fluorescentes; se a moda tivesse um Tribunal Internacional de Haia, todos os frequentadores do Eletric Daisy Carnival seriam julgados por crimes de guerra. Então, talvez seja melhor ficar com a streetwear mesmo.

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Foto por Marco Tulio Valencia.

TRAFICANTES

Me perdoe por revelar isso, mas eles são todos escrotos e uns cretinos. A essa altura, todo traficante já se ligou que uma leve trapaceada não vai afetar em nada sua base de clientes. Especialmente quando eles só compram algo quando estão bêbados o suficiente para gastar 100 paus em uma mistura de ácido bórico, levamisol e uma dose ridícula de seja lá o que for que eles querem mesmo comprar.

O que explica o que o comportamento atual aparenta ser: escolha seu veneno e, se não der certo, tome mais. No fim, algo irá acontecer. Pode ser bom, ou muito, muito ruim. Só não acredite por um único segundo que ele é seu amigo de verdade ou que se importa com você e seus órgãos vitais, mesmo que ele seja seu primo ou algo do tipo. Ele acha você um imbecil e, provavelmente, está rindo da sua cara assim que a porta do carro se fecha.

ETIQUETA NO TRANSPORTE PÚBLICO

Você está voltando para casa. Seja lá que barraco em ruínas seja, orgulhosamente, seu lar. Você não está em Ibiza. Nem todos vivem para farrear. Esta não é uma nação única, não existe só uma droga e, certamente, ninguém está na mesma frequência. Nestes tempos, se divertir pode ser encarado como um ato de desrespeito. Não há razão para crer que seus colegas passageiros (ou motorista de táxi) serão solidários com sua noitada.

Eles têm empregos, filhos, esposos, vidas para viver – e, vamos lá, se você frequenta raves com alguma regularidade, você claramente não tem nada disso. Não que isso seja algo ruim por si só, mas assim fica quando exposto ao mundo.

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Não tem por que ficar se balançando em corrimões ou beiradas e quase nunca há algum motivo legítimo para ficar falando merda com estranhos. Se alguém quebra essas regras quando você está indo para um longo e solitário turno noturno, ou quando você está voltando para casa para cuidar de seu filho doente, muito provavelmente você acharia essa pessoa uma baita cuzona.

Foto por Kieran Cudlip.

LIDANDO COM LEÕES DE CHÁCARA

A não ser que você seja o Prince, vai ter que lidar com esses caras. Fique calmo, respire normalmente e não dê uma de durão quando te revistarem.

LISTAS DE CONVIDADOS SÃO ESQUISITAS: RESPEITE ISSO
Por virtude de não serem como Moscou, onde sair toda noite é praticamente viver em um sistema de castas de discoteca, ou Berlin, onde todos os leões de chácara aprendem simplesmente a gritar "NÃO" na sua cara repetidas vezes, sair à noite em quase todos os outros lugares do mundo acaba sendo uma experiência relativamente democrática.

Você está na lista – nós sabemos. Você também está sem um puto e só quer se divertir, mas é uma arte entrar num lugar de graça sem ser um pentelho. Se o local é dirigido por uma entidade de promoção impessoal, tente de todos os jeitos dominar a situação. Ou mande um e-mail alguns dias antes dizendo que você "tem um blog"; funciona mais do que você pode imaginar. As ilusões de grandeza inerentes à promoção corporativa em boates devem ser sempre aproveitadas, então, não tenha vergonha de nada.

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Mas se a entrada em uma boate local custa menos que dez paus, não peça para entrar de graça, porra. Se você reclama em deixar uma notinha de dez na porta, mas rotineiramente passa o resto da noite comprando cocaína a preços abusivos, tem algo de errado aí. Quanto menos se paga pra entrar, menos bacana é a noite em boates que atendam ao seu nicho específico de EDM e mais vezes você ficará em casa e assistirá ao Boiler Room. Resumindo, a menos que a seja a festa do seu melhor bróder e ele não se incomode com você sendo um VIP semipermanente, pague ou caia fora.

Foto por Jake Lewis.

NO BAR

Não pague bebidas pros seus amigos já bêbados. Não pague rodadas. Não converse com o pessoal do bar. Não peça por nada que claramente não terão pra servir. Isso é um bar, não uma porra duma microcervejaria. Espere pacientemente, faça seu pedido rapidamente e tente não cuspir nos funcionários quando esquecerem do seu troco, propositalmente.

A COCAÍNA É SUPERESTIMADA

Não sei por que qualquer um com menos de 30 anos cheira pó. A maioria de nós ganha salário mínimo e temos cheirado tanto que "cocaine in the water" agora é algo mais profundo e não mais só uma letra bizarra do Rick Ross. Além disso, não é exatamente algo que vá dar um grau instantâneo na sua balada, ao contrário de ácido ou pílulas. Assim que você chegar à boate, 90% da sua noite será gasta pedindo, pegando, servindo, perguntando e falando sobre cocaína. Então, se não acabar, as after-parties se transformam em reuniões de mães completamente travadas, quando se deveria, sabe, estar se divertindo. Ah, e tem sempre aquele pilantra que embolsa a nota que todo mundo usa de canudo.

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MAS KETAMINA É PIOR

A única droga de festinha pior que cocaína é ketamina. A ketamina é a prima sociopata da maconha – uma cretina implacável sem os benefícios familiares. Nada de fome, de felicidade, de sonolência ou vontade de ouvir algo alto – só uma semiparalisia e vontade absurda de mijar assim que você tem movimento o suficiente para beber de novo.

O apelo de se ingerir tranquilizantes animais em situações sociais ainda é um dos grandes mistérios da vida, mas, por algum motivo, deixou de ser coisa de fãs de dubstep, que passavam meio despercebidos por sua ausência de movimentos, para se tornar a droga favorita do fã de deep house que usa chapéu de palha. Digo, a maioria das pessoas fica péssima usando ketamina, imagine então quem já é horrível por natureza.

E tem mais, em termos de machucados relacionados à noitadas, médicos tendo que cortar sua bexiga fora é um dos mais vergonhosos.

Foto por Daniel Leinweber.

NA PISTA

Pare de olhar para os DJs. Eles ainda parecerão com alguém esticado sobre um monte de parafernálias eletrônicas não importa onde você esteja ou quão incessante seja seu olhar.

GUARDE A PORRA DO CELULAR

Ir para a balada deveria ser sagrado. Deveria ser uma experiência imersiva, que muda sua vida e desafia por completo a comunicação compartilhável. Então, não filme nada.

No Watergate, em Berlim, há um maldito herói cuja tarefa principal é confiscar celulares de pessoas tirando fotos, usando o Shazam para descobrir o que está tocando ou ambos. "Você pode pegar a sua telefone após sair do boate, ou pode ir embora com sua telefone", algo que ouvi mais de uma vez. A brutal eficiência germânica nunca pareceu tão atraente.

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Se você quer mesmo que tirem uma foto sua em uma boate, vá a algum lugar badalado do centro, lotado de estudantes de fotografia, que, muito agradecidos, atenderão suas tendências narcisistas. Estima-se que 10% das fotos tiradas na história da humanidade tenham sido feitas somente em 2012, e 10% destas são de você rangendo os dentes.

OS METIDOS A FODÕES

Infelizmente, sempre existirá um grupo de imbecis tentando transformar Corsica em Roskilde 2000 – uma daquelas coisas tristes da experiência noturna, e uma que você tem que deixar passar. Se fosse em um bar, ponto de ônibus ou um casamento, você teria todo o direito de dar um fim nesses caras. Mas uma boate é apertada e, sinceramente, ser babaca com algumas pessoas que estão se divertindo mais do que você é um saco. A não ser que seja este próximo grupo de pessoas, é claro…

Foto por Jake Lewis.

RAVERS DE MEIO-PERÍODO

Aquelas pessoas que só vão a raves uma vez por ano. Os guerreiros de fim de semana, os desgarrados, os civis com óculos de sol, dançando uma coreografia tirada diretamente de uma série de exercícios dos anos 1990.

Não lhes dê espaço ou tempo. Só há um jeito de eles aprenderem: animosidade pura e simples. Esse não é mais o verão do amor; a música eletrônica é basicamente a única música que existe agora e você vai ter que lutar por seu território. Os clubes têm que retomar sua exclusividade, do contrário, poderiam se tornar aquele festival de música da rádio local.

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CAUBÓIS DO ESPAÇO

Eles são velhos, usam movimentos de Tai Chi, ficam olhando para o teto, usam sandálias e aquelas camisetas com estampa de equalizador, mas não deixe te irritarem. Deixe-os em seu espaço e respeite um velho soldado das raves. Você não mijaria em um memorial de guerra, então, não há necessidade de selfies com veteranos da cena.

Foto por Jake Lewis.

FUMÓDROMOS

Costumavam existir salas de chill-out; agora, temos essas merda. Dê cigarros às pessoas, mas não peça muitos. Fume maconha, mas não dê muita pala.

Pessoas que atravessam lugar na roda de baseado são as piores. Isso não é um show do Grateful Dead. Sob circunstância alguma dê um tapinha do seu baseado a um estranho. Você entraria no bar e pediria um gole da bebida de alguém? Você pediria um trago de um cigarro? É o mesmo princípio. Pessoas que só querem um tiquinho são todos ravers de meio-período (ver RAVERS DE MEIO-PERÍODO).

ESCOLHA SABIAMENTE SUA AFTERPARTY

Existem dois tipos de after após uma rave: aquela em que os DJs vão, e aquela que os ravers vão. Se você puder, tente entrar na dos DJs, que terá muito mais bebidas e drogas (isso será mais fácil para as garotas, mas lembrem-se: vocês não têm que trepar com aquele produtor holandês enrugado se não quiserem).

Se a devassidão intimidante do quarto de hotel de um DJ não atrai você, então, por que não tentar o loft de alguém em sua cidade? Eles são legais, certo? Não será um cômodo cheio de gente jogando Banco Imobiliário com o Spotify, certo? Ó Deus, será sim.

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Sua melhor opção de afterparty depende de seu preparo anterior. Não use todas as suas drogas, não gaste toda sua grana, deixe pequenas reservas de cada um desses antes que a rave cabe e vá para a casa do amigo que tiver os melhores alto-falantes. Dessa forma, você não terá que lidar com um monte de gente querendo impressionar ou trepar com um DJ, nem com estranhos sendo completamente escrotos.

Foto por Maggie Lee.

SAIBA QUANDO É HORA DE IR EMBORA

Não existe nada melhor do que sair de um rolê. E nada pior do que ficar fora por muito tempo. É algo que pode ser feito muito ocasionalmente (sério, muito ocasionalmente). Tipo talvez duas vezes na vida. Na maioria das vezes, você acabará esperando a maré te levar com uma garrafa de algo que nunca escolheria beber na mão.

Uma coisa boa dessas saídas é que elas são infinitas. Seus 20 e poucos anos não vão acabar de forma desastrosa porque alguém não tocou uma música boa naquela noite ou porque você não faturou ninguém ou a vibe não estava correta. Use seus sentidos, corte as perdas e compense na próxima. Na maioria das vezes, aquele momento na piscina da cobertura com o sol nascendo não vai rolar.

RESSACAS

Não existe um conselho certo para isso. Talvez assistir TV ou dormir muito? Provavelmente, você deva evitar falar com seus pais, acho. Seja lá o que você for fazer, é melhor ter a companhia de alguém.

Francamente, não dá para evitar, muito menos escapar; você forçou demais seu corpo e ele precisa de descanso. Muito descanso. Nem todo o Valium e bacon do mundo te impedirão de se sentir como o voo MH370 da Malaysia Airlines.

Não esqueça de que tudo o que você está sentindo é culpa sua. Não do seu primo traficante. Nem dos seus amigos que te pilharam, nem do promoter, nem do DJ – é sua. Só sua. É um reconhecimento estranhamente reconfortante de vergonha, um que ajudará você a ver sua ressaca a seu próprio modo, em vez de parte de alguma narrativa de bosta sobre sua "necessidade de liberar um pouco da tensão". Embarque na onda através do túnel e em direção à luz. Aja como um adulto e assuma a responsabilidade por suas ações.

Tradução: Thiago "Índio" Silva