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Para juristas de SP, Lava Jato pode conduzir a um Estado Policial de repressão de minorias

Ato no Largo São Francisco criticou autoritarismo e espetacularização de Moro.

Todas as fotos por Guilherme Santana.

O Ato de Juristas pela Legalidade e pela Democracia realizado no Salão Nobre da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), no Largo São Francisco, na quinta-feira (17/03), teve críticas às atuações do juiz federal Sérgio Moro na Lava-Jato e também ao comportamento da imprensa e mídia, retomando casos da ditadura e de desrespeito ao Estado Democrático de Direito. O evento contou com nomes relevantes da Justiça nacional, como Fábio Konder Comparato, Dalmo Dallari, Sergio Salomão Shecaira e Marcelo Semer, além de políticos, intelectuais, artistas e estudantes, superando a capacidade de 800 pessoas do espaço. Para o juiz Semer, o encontro mostra que não é possível combater a corrupção corrompendo a Constituição. Há quase 40 anos, esta mesma sala foi palco da leitura da Carta aos Brasileiros, a qual tinha o professor da faculdade Gofredo da Silva Teles como principal redator, enquanto importantes juristas condenavam o regime de exceção da ditadura militar, apelando ao Estado de Direito.

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Marcelo Semer.

Ao levar para o público as gravações de telefonemas entre a presidente Dilma e o ex-presidente Lula, o juiz federal Sérgio Moro divulgou material restrito à esfera judicial. Moro apenas poderia enviar a gravação ao Supremo, e lá seria decidido se abririam inquérito, ação penal, arquivamento, devolução e demais atos jurídicos. Semer aponta que, de acordo com a lei, gravações telefônicas são uma exceção ao princípio da privacidade. Ele afirmou não ser prazeroso ouvir um político do gabarito de Lula se referindo ao STF como "acovardado", mas o problema maior é publicar assuntos pessoais: "O que falariam de nós se todas nossas conversas estivessem sendo gravadas?".

Mesmo assim, Marcelo Semer não vê as ações da Lava-Jato sendo corroboradas, acreditando ser errônea a visão maniqueísta determinando que todas ações de Moro seriam erradas, embora tenha retomado a tese de que os agentes não devem ceder aos impulsos populares e ultrapassar a Constituição. "A Avenida Paulista batendo palmas para uma decisão sua é sedutor", afirma o juiz, que aponta os perigos em se seguir a afirmação do juiz Joaquim Barbosa durante o julgamento do Mensalão. Na ocasião, Barbosa argumentou que se deveria ouvir as vozes das ruas, porém isso pode acabar levando para um afastamento da Constituição. O professor do Largo São Francisco Gilberto Bercovici acredita que a Constituição foi violada por Moro, enquanto o STF, por medo da mídia e de setores da classe média, se acovardou e não impôs limites ao mesmo. Para os juristas, esse quadro abrirá espaço para as autoridades realizarem prisões preventivas, o que, em sua maioria, afetará a população pobre e negra. Semer defende o fim da Polícia Militar, apontando sua taxa de homicídios cujas principais vítimas são os jovens de mesmo perfil dos encarcerados citados anteriormente. Essa mesma polícia vem sendo questionada pela Organização das Nações Unidas, a qual afirma que duas mil pessoas foram mortas pela mesma instituição – em sua maioria, afrodescendentes. O juiz aponta também o número de 625 mil presos, dos quais 40% ainda nem foram julgados, sendo que ainda podem ser absolvidos. Muitos estão em tal situação pelo excesso de prisões provisórias.

"Estamos às vésperas do caos político", resumiu o professor Fábio Konder Comparato. Entre os principais problemas, estão as crises econômica e política: a primeira, gerada pelo capital especulativo, que aumenta o fosso entre classes sociais; e a segunda, vista na repulsa da população por representantes públicos. Para agravar, Comparato aponta a atuação da mídia, em que "os meios de massa formam a cabeça do povão e seis famílias comandam 90%", enquanto Shecaira vê a atuação desses grupos com a oposição para a realização de um golpe de Estado. Ele afirmou que "estamos pela legalidade. Estamos pela prisão de Sérgio Moro", referindo-se ao fato de Moro ter liberado as gravações.

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