Imbróglio do caso Lula mostra que eleição vai ser briga de foice no escuro
Imagem: reprodução/Facebook/Lula oficial

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Opinião

Imbróglio do caso Lula mostra que eleição vai ser briga de foice no escuro

Se você achou que o Brasil fez feio na Copa, é porque ainda não imaginou o que vai ser realmente feio numa democracia fragilizada e bagunçada.

Enquanto você ainda estava se curando da ressaca monumental pós-eliminação da Copa, no domingo (8) começou um cabo de guerra bizarro que se transformou numa armadilha política para o juiz Sergio Moro e acendeu um risquinho de esperança (um tanto infundada) em relação a uma possível soltura do ex-presidente Lula, preso já há três meses na Superintendência da Polícia Federal de Curitiba, no Paraná.

O desembargador de plantão do TRF-4, tribunal superior responsável pelo caso do tríplex do Guarujá atribuído à Lula que o levou à prisão, seria o ex-filiado do PT (que chegou a ser assessor da Casa Civil do governo Lula) Rogerio Favreto. Para os deputados-advogados por trás da jogada, Paulo Pimenta (PT-RS) e Wadih Damous (PT-RJ), a jogada era clara: usar Favreto para demonstrar a parcialidade contra a qual a Lava Jato e os tribunais paranaenses tinham contra Lula.

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Favreto fez até mais do que o pedido. Não só abraçou a tese de que Lula deveria ser solto por ser “pré-candidato” à presidência pelo PT como ainda determinou no próprio domingo a soltura imediata de Lula, que segue líder nas pesquisas eleitorais. A decisão causou um rebuliço inédito no TRF-4. O juiz Sergio Moro, que condenou Lula na primeira instância, abandonou as férias, que haviam começado na terça-feira (3), para avisar que não cumpriria a decisão. Ligou para o presidente do TRF-4, Thompson Flores, enquadrando o desembargador e pedindo que o relator do caso no tribunal, Gebran Neto, revogasse a decisão de Favreto.

Especulava-se se o ex-presidente teria uma rota para fugir do país

Enquanto isso o papo corria solto nos grupões de Whatsapp canhotos e destros. Dizia-se que Lula já estaria passando por exames no IML para a soltura, especulava-se se o ex-presidente teria uma rota para fugir do país. De nada adiantou: Gebran mandou reverter a decisão enquanto Raul Jungmann, ministro da Segurança Pública e chefe máximo da Polícia Federal, era instruído por Flores a manter o ex-presidente no xilindró até chegar a papelada. Pega no meio do tiroteio, a presidente do STF Cármen Lúcia soltou uma nota vaga, sem apontar culpados. Lula, como todos sabemos, segue preso até hoje – nem ele mesmo acreditava em sua soltura.

Mas a estratégia política rendeu frutos além dos esperados. Além de fortalecer o movimento em Curitiba que pede a liberdade do ex-presidente, animou a militância e deve ajudar a encher os protestos pró-Lula marcados para o próximo dia 18, data que marca os 100 dias de Lula no cárcere e quando também é celebrado o centenário do ex-presidente e ex-preso político sul-africano Nelson Mandela.

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Favreto acumulou oito queixas contra sua pessoa em um dia no CNJ, é verdade. Se deveria se considerar incapaz de lugar o caso de um petista, o que dizer de ministros do STF como Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli e suas relações, respectivamente, com PSDB, MDB e PT? Para Moro a situação ficou mais escorregadia. Ao atropelar a hierarquia, numa reação quase histérica, contribuiu para a tese de que, à frente da Lava Jato, persegue o PT e especialmente Lula. Além de ser questionado sobre o caso da condenação atual – que deve ser julgado pelo STJ, que está recebendo uma montanha de pedidos de habeas corpus em favor do ex-presidente – Moro pode ser declarado suspeito para julgar Lula em outros casos. De qualquer maneira, não houve até o momento fato mais cristalino em apontar algum nível de personalização em como o juiz vem tratando os casos do dirigente petista, isso sem contar o mal-estar causado nas instâncias superiores, que tentam em vão evitar o esfacelamento da Justiça.

O PT deve seguir mais fortemente a tática delineada até o momento: registrar Lula como candidato à presidência até que sua candidatura seja impugnada pelo TSE

O PT deve seguir mais fortemente a tática delineada até o momento: registrar Lula como candidato à presidência até que sua candidatura seja impugnada pelo TSE, para então tentar transferir seus votos para o “poste” da vez. Que o PT tenha uma tática eleitoral delineada com ajuda de advogados mostra o estado das coisas na certamente turbulenta corrida eleitoral que teremos em 2018. Para além do caso Lula, outros candidatos presidenciais podem se ver enroldilhados nas redes da justiça brasileira – caso do deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ), réu no STF em duas ações por incitação de estupro e injúria.

Uma vez que a moda da politização judiciária iniciada na Lava Jato a partir da divulgação de gravações sigilosas da ex-presidente Dilma Rousseff (e referendada por Gilmar Mendes no STF) começou, não há por que esperar que ela seja interrompida agora, ainda mais com a fragilidade das outras instituições nacionais no pós-impeachment e no habilíssimo e popular governo temer. Devem pulular pedidos de liminar e decisões tortas de juízes de primeira instância travestidos de cabos eleitorais – ou das últimas instâncias mesmo. Se você achou que o Brasil fez feio em 2018 na Copa, é porque ainda não imaginou o que vai ser realmente feio numa democracia fragilizada e bagunçada, que é ao mesmo tempo a esperança final da “pacificação” do país: a eleição.

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