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O que o Cazaquistão pensa sobre 'Borat' dez anos depois?

A comédia estrelada por Sacha Baron Cohen rendeu piadas nojentas e uma falsa ideia do país do Leste Europeu. Uma década depois, autoridades locais falam o que o filme significa pra eles.

O trailer de Borat. NICE!

Esta matéria foi originalmente publicada na VICE US.

Dez anos atrás, Sacha Baron Cohen levava ao ar Borat: O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América. O mockumentário comédia, que acompanha o alter ego cazaque de Cohen Borat Sagdiyev numa odisseia cáustica e absurda pelos EUA, produziu algumas piadas nojentas e deu à luz a milhares (e ocasionalmente problemáticas) tentativas de imitação e memes.

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Era uma tática controversa para fazer os norte-americanos passarem vergonha através da idiota e preconceituosa lente de Borat, mas também acabou por impressionar críticos e o público, permitindo que Cohen virasse um fenômeno da cultura de massa norte-americana além do alcance global de sua série na HBO, a Da Ali G Show. Mas uma entidade realmente odiou a obra de Cohen quando o filme foi lançado: a nação do Cazaquistão.

Pensando agora, é fácil entender por que os cazaques acharam Borat ofensivo. As cenas do filme no Cazaquistão foram filmadas num vilarejo pobre da Romênia; a língua "cazaque" do personagem era uma mistura de gírias em hebreu e polonês; e quase todos os detalhes apresentados no filme sobre o país eram inventados. Mesmo argumentando que Borat era uma sátira que brincava com a ignorância dos norte-americanos sobre a república da Ásia Central, alguns criticaram Cohen por extrapolar em seu retrato do país.

Especificamente, os cazaques não gostaram muito de como Cohen alegremente preencheu um vácuo de ignorância com uma imagem exagerada do país como um bueiro sujo, pobre, antissemita e misógino conhecido por exportar meninos para o rancho do Michael Jackson, produzir 300 toneladas de pelos pubianos por ano e atirar em cachorros por esporte.

Então, de 2005 a 2006, o Cazaquistão perseguiu Cohen. Nos dias anteriores e depois do lançamento de Borat, o governo cazaque contratou [duas empresas de Relações Públicas](https://books.google.com.br/books?id=SGmMAgAAQBAJ&pg=PA154&lpg=PA154&dq=kazakhstan+hired+two+pr+firms+borat&source=bl&ots=QzsRhPD-tZ&sig=6dDvSBuihsBahYIALLYDtAb07YA&hl=en&sa=X&redir_esc=y#v=onepage&q=two pr firms&f=false) e publicou anúncios no _New York Times_, _US News and World Report_ e CNN para mostrar ao público o Cazaquistão de verdade. Alguns anúncios eram enquadrados como não tendo nenhuma relação com o filme, enquanto outros visavam explicitamente usar Borat como um meio de educar o público.

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Ainda assim, logo ficou claro que os poderosos em Astana, capital do Cazaquistão, estavam putos. Em 2005, o ministro das Relações Exteriores cazaque lançou rumores de que Borat era parte de uma trama internacional para assassinar o caráter do país; no ano seguinte, o país derrubou o site do filme de seu domínio .kz, ameaçou processar Cohen e considerou censurar totalmente o filme.

As relações tensas dos cazaques com Borat continuaram na década seguinte. Em 2010, um membro do parlamento local afirmou que o filme tinha manchado permanentemente a reputação do país no exterior e prejudicado cazaques pelo mundo — alguns realmente entraram em brigas por causa dos estereótipos criados por Cohen. Em 2012, uma atleta cazaque teve que ouvir a versão de Borat do hino nacional de seu país em vez do hino real enquanto recebia a medalha de ouro numa competição do Kwait.

Vários cineastascazaques enquadraram seus projetos como respostas a Borat — incluindo uma sequência não autorizada de 2010 sequência não autorizada de 2010 My Brother, Borat, que tentava subverter os estereótipos expressados no filme de Cohen. Aí, depois de anos de ressentimento sutil, o então ministro das Relações Exteriores Yerzhan Kazykhanov disse a políticos em 2012 que o filme contribuiu com um aumento no turismo na nação — e que ele era grato por isso.

Dez anos é um grande aniversário para qualquer filme, e corresponde há praticamente uma vida para o Cazaquistão, que celebra seu 25º Dia da Independência em dezembro deste ano. A nação está sob a liderança do presidente Nursultan Nazarbayev desde que se separou da União Soviética em 1991, com um boom que resultou em transformações econômicas e culturais. O Cazaquistão se livrou um pouco da paranoia do Kremlin e desenvolveu confiança e reconhecimento no cenário internacional, então pode-se dizer que a crítica do país em relação a Borat amansou um pouco.

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"Somos uma nação orgulhosa", disse Aisha Mukasheva, porta-voz da Embaixada do Cazaquistão nos EUA. "Nos nossos 25 anos de independência, temos muita coisa do que nos orgulhar: desarmamento nuclear, desenvolvimento econômico e nosso papel cada vez maior no cenário mundial." Num discurso direito, Mukasheva disse que os cazaques não guardam rancor do filme hoje, explicando que a tensão que os indivíduos sentem é equivalente à irritação que um inglês sentiria ao ser comparado com Mr. Bean. "Era uma comédia — não um documentário", disse ela ao explicar a posição atual da nação sobre o filme.

Mukasheva compartilha a visão de Kazykhanov de que Borat deu ao Cazaquistão um lugar na mídia e aumentou o turismo do país — mas não necessariamente a longo prazo. Ela diz que o filme tem sido cada vez menos mencionado em conversas com estrangeiros, e insiste que o Cazaquistão é mais conhecido hoje pelas estações de esqui, montanhismo e belos cenários do que pelo filme. Ela deu a entender que, dez anos depois do lançamento do filme, não vale mais a pena discutir Borat em relação ao Cazaquistão.

"Agora as pessoas associam nosso país mais com gente como o boxeador Gennady Golovkin do que com o Sr. Baron Cohen", disse. "E acho que os cazaques têm coisas melhores para discutir [entre si] do que um filme que saiu uma década atrás!"

Como o Cazaquistão vê Borat em 2016 é difícil de comparar com o nível de indignação mostrado em 2006 — mas faz sentido se você atribuir aspectos humanos a uma jovem nação. O Cazaquistão de hoje parece ter desenvolvido confiança e estabilidade para focar na construção de uma reputação e legado por meio da autopromoção, em vez de atacar personagens fictícios que usaram o país como piada barata para um público que não sabia nada sobre a nação.

"Se aprendi alguma coisa com o filme do Sr. Baron Cohen", disse Mukasheva, "é que devemos compartilhar o orgulho do que realmente significa ser cazaque mais amplamente".

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Tradução: Marina Schnoor

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