FYI.

This story is over 5 years old.

Vice Blog

O Zoológico que Inverterá os Papéis de Humanos e Animais

Esqueça as jaulas, fossos e carros com grades nas janelas. O dinamarquês Givskud Zootopia cria os bichos soltos e põe o visitante no seu devido lugar: a encolha.

Esboço do Zootopia. Todas as fotos cortesia da BIG

Quem já esteve no Zoo Lates te dirá: são os animais em cativeiro que devem ser protegidos pelos humanos – não o contrário. O último projeto do arquiteto dinamarquês Bjarke Ingels promete fazer exatamente isso. A reestruturação do Givskud Zootopia, na cidade dinamarquesa de Billund, inverte o conceito dos zoológicos ao permitir que eles vaguem livremente enquanto o público visitante fica escondido em cápsulas espelhadas ou teleféricos.

Publicidade

A imprensa até agora vem aclamando amplamente o Zootopia, apesar de o The Guardian o ter descrito como um “Show de Truman para animais, ou uma versão selvagem de Jogos Vorazes”. Para mim, simplesmente parece uma boa forma de poupar os tigres de serem banhados em cervejas e os pinguins de terem de nadar com homens pelados.

Liguei para o Ingels para descobrir mais sobre sua visão Zootópica.

VICE: Oi, Bjarke. O que te levou a esse projeto de zoológico?
Bjarke Ingels: Acredito que uma das coisas que realmente chamou minha atenção foi a filosofia de lidar com os animais enquanto seres sociais. Muitas pessoas associam zoológicos com um tigre solitário enjaulado num quadrado pequeno e enlouquecendo de tédio e claustrofobia, e acho que quando temos um zoológico social podemos realmente ter um grupo grande de animais vivendo juntos num habitat que lembra seus habitats naturais. Isso me pareceu um ponto de partida muito interessante, porque significa que, enquanto visitante, você se encontraria em minoria em comparação aos animais, e não o contrário.

Bjarke Ingels. 

De que outra forma esse zoológico se diferencia de outros?
A ambição do zoológico era fazer com que os visitantes não notassem as barreiras entre eles e os animais. Então você fica nesse ponto crucial entre o sentimento de intimidade e a necessidade de estar em segurança e a salvo. Algumas das barreiras podemos incorporar na água, por exemplo, ao garantirmos que os barcos fiquem na parte que é funda demais para os animais cruzarem. Há todo tipo de truques de paisagismo para criarmos vários tipos de barreiras.

Publicidade

Na antiga arquitetura paisagista inglesa havia algo chamado “ha-ha, que é uma série de mudanças imperceptíveis de níveis que fazem com que a paisagem natural gradualmente declive e atinja uma parede que é invisível vista de dentro. Havia um lorde que gostava de sentar e tomar chá em sua mansão enquanto admirava sua linda paisagem com gado pastando no horizonte, mas claro que ele não queria que os bois viessem e corressem atrás de sua esposa.

Então é claro que o desafio principal é planejar um zoológico de uma forma que o cercado continue lá, mas que não seja visível. Também queremos eliminar todos os traços de arquitetura feita pelo homem – nada de cabanas redondas africanas ou pagodas chinesas. Sem essa arquitetura romântica, nostálgica, vernacular, podemos integrar a arquitetura à paisagem de forma que a evidência espalhafatosa da presença humana não esteja presente. Como camuflagem.

Esboço do Zootopia. 

O zoológico é um lote de 300 hectares. Como os visitantes explorarão esse espaço?

Acredito que uma das principais inovações na experiência de ir ao zoológico foi o safari de carro, onde você pode entrar com o carro que você dirige para ir ao trabalho e dirigir por entre leões. É esse choque surreal de algo incrivelmente familiar com algo superexótico. Estamos organizando o safari de carro como uma volta que engloba todo o parque, então a partir do carro você consegue ter uma visão geral e uma experiência de todos os animais ao redor do globo.

Publicidade

E depois, ao retornar à cratera principal, você pode se ocupar de três mundos diferentes: a América, a partir dos teleféricos; a África, de bicicleta; e a Ásia, com bicicletas aquáticas. Então essa cratera se torna o ponto de partida para esses três mundos diferentes, e em alguns pontos você pode parar, descer e explorar a pé também.

Você estava pensando em fazer um protótipo de uma cápsula espelhada – ela cria uma imagem de ficção científica bem bonita.
É meio como um resort de esqui. Os elevadores para esqui têm essas cápsulas que você pode puxar para se proteger do vento e da neve. Então olhamos para ver se talvez um elemento similar poderia ser adaptado para proteger um veículo para que os visitantes pudessem se integrar com o meio.

Esboço do Zootopia. 

O conceito de zoológico mudou ao longo dos anos?
Os zoológicos costumavam ser muito importantes para as ciências e a educação quando as pessoas não podiam viajar. Agora temos filmes, televisão e passagens aéreas baratas, o que permite que muitas pessoas vejam animais ao vivo. Então parte do papel do zoológico desapareceu. Esperamos que o Zootopia possa ser uma contribuição bem excitante para a experiência de ir ao zoológico – talvez uma que o torne mais interativo.

Você encontrou alguma dificuldade quando planejava o Zootopia?
Minha firma já fez milhares de casas e prédios para humanos, mas realmente ter um grupo completamente novo de espécies para quem planejar é bem interessante, pois animais diferentes têm comportamentos completamente diferentes. Alguns animais realmente podem ser contidos com medidas muitos simples, enquanto outros animais são como [Henri] Houdini e podem escapar de quase qualquer lugar, então as medidas necessárias para contê-los variam dramaticamente.

Publicidade

Liderar uma firma de arquitetura aos seus 30 e poucos anos é raro – geralmente leva um tempo longo para treinar e desenvolver esses grandes projetos. O que você acha que te fez tão bem-sucedido nesse mercado tão cedo?
Agradeço muito você dizer 30 e poucos anos – faço 40 no dia 2 de outubro. Convencionalmente, diz-se que você fica bom em arquitetura à medida que envelhece, e acho que sempre tem essa história de quem veio antes – o ovo ou a galinha –, esse dilema do tipo Ardil 22, em que você não vai ganhar o projeto de um arranha-céu a não ser que você já tenha feito um. Tive sorte de ter assumido desafios bastante grandes numa fase prematura. Por exemplo, poderia te mostrar alguns dos nossos trabalhos que surgirão em Manhattan, que é um híbrido de arranha-céu e pátio de 274 mil metros quadrados: chamamos-no de “arranha-pátio”. Ele será uma silhueta incrivelmente notável na linha do horizonte de Manhattan.

Os planos de Ingels para as medidas de resiliência a inundações na Baixa Manhattan. 

Não sei se tenho uma receita que funciona, mas acho que algo que nos distingue de nossos colegas é que algumas vezes a arquitetura ou se trata de consultores profissionais práticos que fazem caixas fáceis de construir, mas previsíveis; ou, num outro extremo, algo vanguardista expressivo que é tão incrivelmente caro quanto altamente impraticável. Acho que o que temos tentado fazer, de uma forma banal, é ser o que chamamos de “utópico pragmático” – e realmente ter uma abordagem bem prática frente à arquitetura e deixar a vida que existirá dentro dela ser a força motriz real. O que faz nossas construções parecerem diferentes é o fato de elas atuarem de forma diferente.

Publicidade

Como sua pista de esqui em Copenhagem. O que você pode me dizer a respeito?
É uma usina de processamento de lixo em Copenhagem no telhado da qual você pode esquiar. Ela resolve um dos principais desafios desse tipo de infraestrutura pública – você precisa dela no meio da cidade, porque precisa da energia, mas você não quer ter blocos feios e enormes que façam sombra e bloqueiem a vista. Ao torná-la uma instalação pública, ela de repente se transforma numa situação na qual todos ganham, e os vizinhos a recebem bem.

Normalmente a gente teria protestos contra construir uma usina de processamento de lixo no quintal de alguém, mas nesse caso recebemos e-mails de pessoas perguntando quando ela seria aberta, porque elas mal podiam esperar para esquiar, escalar ou fazer trilha. Nesse sentido, acredito que sempre estamos buscando oportunidades inexploradas que tanto sejam incrivelmente racionais quanto pareçam quase fantásticas.

O prédio incinerador com pista de esqui do Ingels.

Acho que te ouvi falar dela como uma “sustentabilidade hedonista”. Você acha que Copenhagem, enquanto cidade, abraça esse tipo de mentalidade?
Noventa e nove por cento dos prédios são provavelmente bem normais. Mas tem algo chamado de Torre Redonda (Rundetarn), no centro de Copenhagem, que foi construída porque o rei gostava de olhar as estrelas. Fizeram uma torre que é como uma longa rampa espiralada onde você pode andar a cavalo da rua até o topo do observatório sem ter de desmontar. Adoro isso como ideia, pois a arquitetura não se trata de repetir algo que estava certo ou errado, mas de surgir com novas ideias de como realmente queremos viver. Claro, no caso do rei, ele pode fazer o que ele quiser. Mas acho que deveria ser a mesma coisa para todos.

Publicidade

A arquitetura deveria ser para transformar o mundo um pouco mais como o de nossos sonhos. Se os documentários são para descrever o mundo como ele é, a arquitetura é para criar as possibilidades de algo novo. A beleza da arquitetura é que ela torna ficção em fato, como a Torre Redonda.

Quando você conta para as pessoas pela primeira vez sobre seus planos de construir uma pista de esqui sobre uma usina de processamento de lixo, elas não acreditam em você. Mas quando está completa, depois de dois anos, torna-se um fato sobre Copenhagem. Sabe, em Veneza pode-se passear em gôndolas pelas ruas alagadas, e em Copenhagem você pode esquiar numa usina de processamento de lixo. Será um fato sobre o mundo.

Deve ser bem legal ser a pessoa que criou esse fato.
Sabe, esse é o poder da arquitetura. Você tem apenas que se lembrar de usá-la e não fazer mais do mesmo, e continuar se desafiando para fazer o mundo ainda mais incrível.

Siga Amelia no Twitter.

Traduzido por: Julia Barreiro