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Os Insurgentes do ISIS Estão Quase Cercando Bagdá

Os insurgentes tomaram o controle de vastas áreas rurais ao oeste e ao sul da capital, movimentando-se para cercar a cidade e repetir a pressão que fizeram em Bagdá no auge da Guerra do Iraque em 2006 e 2007.

Imagens do ISIS numa rede social mostram combatentes do grupo desfilando com um veículo das forças de segurança do Iraque capturado.

No final de 2013, as forças de segurança do Iraque invadiram um acampamento de protestos sunita em Ramadi, a capital da inquieta província de Anbar. O governo xiita do primeiro-ministro Nouri al-Maliki argumentou que o acampamento tinha se tornado um refúgio de militantes envolvidos com a Al-Qaeda.

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A repressão de Maliki provocou levantes nas cidades de Anbar, com tribos rebeldes atacando e tomando o controle de prédios do governo e delegacias de polícia. Como parecia estar perdendo o controle de Anbar, Maliki retirou seu exército de Ramadi e Falluja, as principais cidades da província, na véspera do ano novo. Infelizmente, para o primeiro-ministro, esse se mostrou um passo ainda mais desastroso – pois assim que o exército iraquiano saiu, centenas de veículos com a bandeira do Estado Islâmico do Iraque e do Levante (o ISIS), grupo jihadista descendente da Al-Qaeda, começaram a chegar, vindas do deserto.

No começo de janeiro, o controle do governo sobre as principais cidades de Anbar quase ruiu completamente, com o ISIS e grupos tribais insurgentes tomando Falluja e controlando quase metade de Ramadi.

Nessa última, o ISIS conseguiu tomar a cidade mesmo estando em menor número do que os combatentes das tribos locais e outros grupos insurgentes. No começo de janeiro, conforme os comboios do ISIS se infiltravam, seus combatentes teriam declarado Falluja um emirado islâmico, e hastearam sua bandeira negra sobre delegacias de polícia e os principais prédios do governo. Logo, o clérigo radical Abdullah al-Janabi voltou à cena. Al-Janabi costumava liderar o Conselho Shura Mujahidin em Falluja, um grupo estabelecido pelo precursor do ISIS, Al-Qaeda no Iraque. Da última vez que esteve na cidade, ele coordenou tribunais da charia cujas punições “fizeram o Talibã parecer brando”. Agora ele está de volta, pregando abertamente em mesquitas.

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O ISIS também anunciou o estabelecimento de um “Comitê para a Promoção da Virtude e Prevenção do Vício” para aplicar sua interpretação estrita da lei islâmica, e, numa coalizão com outros grupos insurgentes, montou uma estrutura administrativa para controlar a cidade e manter os serviços públicos funcionando.

O ISIS desfila com um veículo do FSI em Falluja.

Apesar de sua reputação de brutalidade, o ISIS tem agido com cautela em Falluja, indicando que – no Iraque, pelo menos – o grupo jihadista aprendeu a lição com o Despertar de Anbar de 2006. Na época, tribos locais e insurgentes, ressentidos com a dominação do ISIS, se aliaram aos americanos e ao governo do Iraque para expulsar o grupo da província.

“A estratégia do ISIS tem sido muito mais conciliatória do que era esperado quando eles entraram na cidade”, observou Aymenn Jawad al-Tamimi, do Fórum do Oriente Médio, notando que, apesar dos temores de execuções em massa da polícia local e suas famílias, o ISIS não agiu contra eles. Al-Tamimi também apontou que “os recursos financeiros do grupo permitiram que ele se engajasse em divulgação para residentes, xeques e estudiosos religiosos”. Finalmente, numa cidade sunita com uma história de rebelião contra a ocupação norte-americana e o governo iraquiano, “não há dúvidas de que exista uma apreciação por eles por parte de muitas pessoas em Falluja, gente que acredita que o ISIS tem o papel principal de liderar as ofensivas mais ousadas contra as forças de segurança iraquianas na área mais ampla de Anbar”.

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A capital da província, Ramadi, que o governo afirmou repetidas vezes estar livre da presença de insurgentes do ISIS, se provou um moedor de carne para o exército iraquiano. Combates contínuos vêm acontecendo na cidade desde janeiro e o ISIS ainda controla muitos bairros no sudeste de Ramadi. Em resposta, o governo iraquiano mobilizou unidades de Operações Especiais que incluem a notória Divisão Dourada, que responde diretamente ao primeiro-ministro Maliki.

Mas mesmo que a Divisão Dourada e outras unidades de contraterrorismo de elite sejam peritas em expulsar insurgentes de um determinada área, elas são forçadas a entregar a segurança da região para unidades normais do Exército Iraquiano depois disso. O que leva, inevitavelmente, a problemas.

Imagens do ISIS de veículos do exército iraquiano destruídos em Ramadi.

Os soldados iraquianos presentes em Ramadi enfrentam um campo de atuação muito mais nivelado do que os soldados americanos encontraram na cidade em 2006. No entanto, eles estão cada vez mais sobrecarregados, e sofrem com falta de munição, deserções em massa e falta crítica de apoio aéreo. O ISIS capturou grandes quantidades de equipamento iraquiano, incluindo armas, armaduras à prova de balas, capacetes, equipamento de visão noturna, Humvees, picapes e até veículos blindados fornecidos pelos Estados Unidos. Já surgiram imagens de combatentes do ISIS usando mísseis teleguiados apreendidos contra tanques e veículos blindados do exército iraquiano.

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As lutas têm sido impiedosas e brutais: em março, surgiram filmagens nas redes sociais de um combatente do ISIS passando por uma fileira de soldados iraquianos ajoelhados, executando um por um com uma pistola. As unidades do exército iraquiano também estariam realizando matanças extrajudiciais de combatentes do ISIS e postando imagens de corpos mutilados nas redes sociais. Em imagens sangrentas, que lembram a morte do guarda da Blackwater que desencadeou a primeira batalha em Falluja em 2004, militantes do ISIS responderam queimando corpos de soldados iraquianos e arrastando cadáveres com os Humvees capturados.

As Forças de Operação Especial iraquianas combatendo insurgentes do ISIS em Ramadi, março de 2014.

Mas o trabalho do ISIS para frustrar o governo do Iraque já foi além dos assassinatos e roubos. Em março, membros do ISIS fecharam as comportas de uma barragem no rio Eufrates ao sul de Falluja, inundando as áreas rurais próximas para impedir a movimentação das forças de segurança iraquianas, e quase transformando a cidade numa ilha. A inundação forçou o exército iraquiano a recuar da cidade e confiar quase que inteiramente em artilharia de longo alcance imprecisa, matando dez civis por dia. Grandes áreas agrícolas desapareceram debaixo d'água, desalojando milhares de famílias e destruindo casas e plantações.

O fechamento da barragem também causou falta d'água no sul do Iraque e piorou a situação já crítica da energia elétrica no país, já que as usinas de energia que dependem do Eufrates estariam operando 50% abaixo da capacidade normal, causando grandes apagões. Com as eleições se aproximando, no que será praticamente um referendo da política de segurança do primeiro-ministro Maliki, o ISIS está em posição de travar uma guerra econômica em grande escala.

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O crescimento da insurgência não está restrito a Anbar. No começo de abril, foi divulgado um vídeo mostrando um comboio de cerca de 100 veículos do ISIS desfilando em Abu Ghraib, a oeste de Bagdá. O local da notória prisão fica a menos de 50 quilômetros da Zona Verde, o centro do governo iraquiano, e a 8 quilômetros do Aeroporto Internacional de Bagdá e do Camp Victory, o ex-quartel-general dos Estados Unidos no Iraque. Os insurgentes também tomaram o controle de vastas áreas rurais ao oeste e ao sul da capital, movimentando-se para cercar a cidade e repetir a pressão que fizeram em Bagdá no auge da Guerra do Iraque em 2006 e 2007.

Forças do ISIS com um tanque do Exército Iraquiano capturado, depois de uma emboscada em al-Humayrah.

Com o crescimento da insurgência, os Estados Unidos vêm fornecendo às forças iraquianas munição, rifles M4, quase 100 mísseis Hellfire e drones de vigilância, e há helicópteros Apache e aviões F-16 com entrega marcada para este ano. De acordo com Daniele Raineri, jornalista do jornal italiano Foglio e especializada na insurgência no Iraque, os Estados Unidos já interferiram de forma mais. Raineri diz que os drones de vigilância americanos voaram sobre Anbar em dezembro e janeiro para fornecer inteligência às forças iraquianas, e o NSA, que reúne metadados de toda a comunicação telefônica do Iraque, tem ajudado as forças de segurança a localizar os líderes do ISIS. Essa estratégia parece ter tido algum sucesso na província de Anbar.

Ainda assim, com as eleições se aproximando no dia 30 de abril, os insurgentes do ISIS continuam no controle das principais cidade de Anbar e estão chegando cada vez mais perto de Bagdá. As forças de segurança iraquianas são inefetivas e estão sobrecarregadas, e agora não há mais dezenas de milhares de tropas americanas para ocupar o país e combater os insurgentes.

Num discurso no começo de abril, Abu Muhammad al-Adnani, o porta-voz incendiário do ISIS, se gabou: “Voltamos às cidades e controlamos a região, e vamos ser mortos mil vezes antes de pensar em sair. As cidades e províncias que estão sob nosso controle, no topo delas Falluja, não serão comandadas hoje, pela Vontade de Alá, exceto pela Lei de Alá, e não haverá lugar nelas para secularistas. Porque Falluja é a Falluja dos Mujahidin e Anbar é a Anbar dos Mujahidin”.

Dez anos depois do começo da história, a insurgência no Iraque renasceu completamente e o conflito está alcançando uma fase nova e sangrenta.

@MemlikPasha