Carta de amor ao Vodafone Paredes de Coura
Todas as fotos por Marc Rodriguez

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Carta de amor ao Vodafone Paredes de Coura

Viagem a uma utopia hedonista, tornada realidade durante quatro intensos e calorosos dias.

Enquanto espanhola, mais concretamente galega, foram muitas as vezes que ouvi falar dos habitantes do país vizinho como uma comunidade gentil, amável, humilde e divertida. Depois de viver um ano na capital portuguesa, pude confirmar tal afirmação. No entanto agora, depois de assistir ao Vodafone Paredes de Coura, não tenho dúvidas que fiquei completamente apaixonada por Portugal e pelos portugueses.

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Pelas imagens que procurei no Google e pelos comentários que me foram chegando sobre o Festival, as minhas expectativas eram muito altas, mas, uma coisa é verdade: tudo o que possas ouvir sobre Paredes de Coura é absolutamente certo. Incluindo os gafanhotos que se colam à tua tenda e os quilos de pó que te vão tapar o nariz durante quatro dias.

Logo à chegada, ainda meio perdidos e de ressaca, os amáveis habitantes de Paredes de Coura presentearam-nos com toda a sua hospitalidade e simpatia e, mesmo quando te deixam na dúvida com essa fina ironia tão portuguesa, não consegues evitar morrer de amor. Tenho que admitir que, na quarta-feira, estava um pouco receosa por ter pela frente quatro dias sem descanso, no meio do mato. Todavia, o concerto de The Wedding Present foi o aperitivo perfeito e deixou a promessa de um grande fim-de-semana. Ainda assim, foram os Future Islands e a dança histriónica do seu vocalista, Sam Herring, a eclipsarem totalmente o impressionante palco principal em forma de anfiteatro natural. Tudo isto, claro, com a permissão dos Mão Morta que tiveram o público totalmente a seus pés.

No segundo dia, acordámos com uma temperatura a meio caminho entre os 36º e o inferno, pelo que decidimos ir até às margens do famoso rio que delimita o recinto do Festival. Tudo o que tinha visto anteriormente sobre a Praia Fluvial do Taboão era, afinal, muito pouco. O Rio Coura, debaixo de um céu completamente limpo e milhares de jovens ébrios montados em cisnes e flamingos, formavam um cenário de autêntico Jardim das Delícias. Até o próprio Bosco ficaria doido perante tal imagem. Era como uma utopia hedonista, tornada realidade durante quatro intensos e calorosos dias.

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Este foi o dia em que descobri Nothing e os apoteóticos HO99O9, que fizeram tremer até a última árvore de Paredes de Coura. King Krule teve também uma merecida e gigantesca ovação por parte do público e aqueles de nós que tinham ficado decepcionados com a sua actuação no Primavera Sound de Barcelona, voltámos a ficar presos à sua voz. Mas, os campeões indiscutíveis da jornada foram os At the Drive-In, com um concerto brutal, à base de muito ruído e uma energia incrível, que fez levantar a poeira no palco principal.

E na sexta-feira, ao contrário do que seria lógico, estava com muito mais energia que nos dias anteriores. Talvez pelas boas vibrações que respirei durante as 48 horas anteriores e por me ter empanturrado de smoothies e veggie burgers. Os Young Fathers confirmaram que estão para ficar e deixaram de boca aberta todos aqueles que (ainda) não os conheciam. Os Japandroids, por sua vez, estiveram um pouco mais frouxos que de costume e não deixaram o público muito bem preparado para esperar durante mais de meia hora pela entrada em palco dos eternos Beach House. Um atraso pelo qual o duo norte-americano estava disposto a compensar-nos com uma set list de sonho para os fãs e uma atmosfera etérea, carregada de flashes, que reproduziu em palco o mesmo céu nocturno que pairava por cima de nós.

Não vos vou mentir, por esta altura já estava a desejar que o Festival chegasse ao fim. Estava farta de duches comunitários, pó, insectos, mais pó e banhos cheios de ADN de desconhecidos. Já não aguentava tanta felicidade, tanta boa onda, tantas colchões insufláveis de todas as cores e tantos rapazes valentes a fazerem saltos mortais do cimo das árvores para a água. A sério, estava cansada de tanta felicidade.

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No entanto, o desfecho acabaria por ser perfeito: aprendi a dançar como o Alex Cameron, esse homem feio, mas tão sexy, de voz meio deselegante e postura lânguida; descobri a voz impressionante de Benjamin Clementine (que agora não consigo parar de ouvir); voltei a passar-me com Ty Segall e presenciei um dos melhores concertos que já vi de Foals.

Mas, sobretudo, pude celebrar os 25 anos de um Festival honesto, humilde e que nada tem que invejar dos gigantes desta indústria festivaleira musical. Se queres fazer parte de um paraíso na Terra (um paraíso sujo, caótico e com demasiado calor), não percas o Vodafone Paredes de Coura 2018.

Raquel Zas é editora online da nossa plataforma i-D Espanha. Abaixo podes ver mais fotos da 25ª edição do Vodafone Paredes de Coura.