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Música

A In Venus investe no dream pop em 'Ruína'

Sem perder suas referências punk, o quarteto paulistano trabalha com mais camadas de som e reverb em seu disco de estreia.

Ano passado, fui ver uma apresentação do trio Rakta na Associação Santa Cecília, em São Paulo. Quando cheguei, o show que rolava ainda era o de abertura, conduzido pelas paulistanas da In Venus; o som tinha uma pegada punk e o vocal era urgente e agressivo, mas o que mais me chamou a atenção na apresentação do quarteto estava, na verdade, no público, formado em mais da metade por mulheres — muitas ali presentes para conferir justamente a banda de abertura, presumi por sua empolgação.

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A formação dessa plateia, incomum para shows de pequeno porte, reflete a missão inicial da In Venus. Formada por Cint Ferreira (vocal e teclados) e Camila Ribeiro (bateria) no final de 2015, a banda tinha como questão central incentivar os espaços seguros para mulheres no meio musical. "O fato de a gente colocar pras mulheres que elas podem, que elas são capazes, é muito importante. É o nosso papel principal. É importante saber que há qualidade na produção musical feminina", fala Cint.

Com esse mote, o grupo começou a se apresentar com as poucas faixas que tinha em mãos e lançou, ao final de 2016, a faixa "Mother Nature". O single, que incorpora a questão feminina falando de um pedido de resgate da natureza, foi o ponto de partida para a construção de Ruína, álbum de estreia do quarteto que sai hoje pelos selos Howlin' Records e Hérnia de Discos (SP), Efusiva (RJ) e PWR Records (PE).

Ruína apresenta uma mudança na sonoridade da In Venus. Formado por camadas e camadas de sonoridades sintéticas e sonhadoras, o grupo mergulha no dream pop e shoegaze da década de 90, bem como nas referências indie rock de seu breve revival nos anos 2010, com bandas como DIIV e Beach Fossils. A mudança começou com a inserção de um sintetizador entre os instrumentos do grupo, que percebeu que era hora de mudar as harmonias das faixas já pré-existentes para que estas se encaixassem com o som do synth.

Cint conta, também, que o disco é uma "mistureba de referências", e também destaca o post-punk de Manchester e o riot grrrl como influências no som; esse último, uma inspiração em particular para seus vocais urgentes. O lado punk e hardcore da banda continua a se mostrar, porém, principalmente em faixas como "Inverno da Alma" e "Cotidiano" — coincidentemente, as duas únicas escritas em português.

"Quando a gente mudou, percebemos que não precisávamos ficar tão presas a um idioma que não era o nosso original. Não posso dizer que daqui pra frente vai ser só isso, mas já estou mais acostumada", diz Cint. "Cotidiano" é também um marco de uma situação de abuso passada por uma amiga da vocalista, e que teve uma repercussão dada a fama do homem acusado — só uma das muitas outras na tracklist que tratam de casos de abuso, assédio e outras dificuldades da condição feminina. como "What You Fight For", "Burn" e, de novo, "Mother Nature".

Sobre a última, Cint forma uma frase que define a inquietude de Ruína: "A angústia da mulher também faz parte da angústia do mundo." Ouça o disco abaixo: