Os milicianos que deixaram tudo para combater o ISIS no Iraque

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Viagem

Os milicianos que deixaram tudo para combater o ISIS no Iraque

O que um fotógrafo britânico de origem iraquiana aprendeu depois de passar cinco semanas com os soldados de várias milícias no Norte do Iraque.

Este artigo foi originalmente publicado na VICE UK.

Enquanto criança, em Londres, Yassin Yassin, provavelmente nunca esperou ir parar à linha da frente do conflito no Iraque. Tirando o facto de ter sido obrigado a abandonar o país durante o regime de Saddam Hussein para se juntar a familiares que viviam no Reino unido, a sua vida tinha sido sempre normal.

Agora, aos 24 anos, está de volta a Londres depois de uma viagem ao Iraque onde fotografou os grupos armados ao serviço do governo - eles preferem não ser apelidados de milícias, salienta Yassin - enquanto trabalhavam de forma a impedir o auto-proclamado Estado Islâmico de avançar no terreno de batalha.

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O projecto fez parte de um esforço levado a cabo por Yassin para tentar compreender no que se tornou o país que um dia se viu forçado a deixar para trás, bem como quem são os cidadãos que pegaram em armas contra o ISIS. Ao passar algum tempo com três grupos - Kataib Jund Al ImaM, Tayyar Al Risali e Forket Al Imam Ali - a sua atenção focou-se não apenas nos perigos sempre presentes da vida em guerra, mas também no sentido de camaradagem que aquelas condições criavam entre todos.

"Ao início estava assustado, porque nunca tinha sido exposto a um perigo real, mas à medida que o tempo passava e que ia vendo a calma destes soldados, também eu fui ficando mais relaxado", conta o fotógrafo. Todavia, essa sensação haveria também de mudar, depois de, a dada altura, lhe ter sido apontado um edifício ,mesmo à sua frente, que estava a ser atacado pelo ISIS. Aí sentiu-se verdadeiramente numa zona de guerra.

Yassin partilha com a VICE algumas das imagens que captou no terreno, bem como algumas das memórias das cinco semanas que este ano passou no Iraque.

VICE: Como é que conseguiste este acesso às milícias?

Yassin Yassin: Voei a partir do Reino Unido e comecei, simplesmente, a bater à porta dos escritórios destas milícias, a perguntar se podia documentar o que estavam a fazer. Obviamente que não foi fácil. Muita gente não confiava em mim e pensava que talvez pudesse ser um espião, ou assim. Mas um dos meus familiares conhecia um jornalista da televisão, que por sua vez conhecia uma pessoa, que conhecia outra pessoa e acabei por ficar com um pé na porta.

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Como era um dia típico com os combatentes?

É difícil descrever um dia normal, porque eram todos bastante diferentes. Eu estava lá mesmo antes da libertação de Fallujah - que tinha caído sob o jugo do ISIS em Janeiro de 2014, logo depois de Mosel, a 10 de Junho, e Tikrti a 13 de Junho. Durante a minha estadia, o grupo Hashd Al Shaabi estava em modo defensivo e eu andei na linha da frente com eles enquanto tentavam manter o inimigo ao largo.

O que é que viste, ou o que é que te deixaram ver?

Cada milícia está dividida em dois: os soldados e a equipa de media, que me levou à sua base, no Campo Speicher, em Tikrit. Conheci um engenheiro de desactivação de bombas que trabalhava com este grupo - não quis ser fotografado, por razões de segurança - e que me disse que tinha trabalhado como tradutor para o exército norte-americano durante a Guerra do Iraque.

Mais tarde, noutro local, conheci também um soldado que não conhecia o engenheiro, mas que tinha lutado ao lado do exército de Mahdi durante a guerra de 2003. E embora não tivesse participado directamente nas situações, esteve ligado a um grupo que deu bastantes dores de cabeça aos americanos, que matou muitos soldados e raptou tradutores iraquianos. Achei interessante que estes homens com visões totalmente opostas se tivessem unido no combate a um inimigo comum. Todos neste grupo têm um objectivo comum: destruir o ISIS. E todos me trataram com respeito.

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Que histórias mais te impressionaram?

Uma delas foi sem dúvida a de Malik [na foto acima], que conheci no Campo Speicher. É um combatente jihadi, com vinte e poucos anos, natural do Sul do Iraque, que estava há um ano na milícia quando o fotografei. Falou-me de um pacto que tinha feito com os seus quatro irmãos mais velhos: se morresse, o irmão seguinte iria substitui-lo e assim sucessivamente até não restar nenhum. Tinha todas as qualidades de um bom amigo - era simpático, caloroso - e mantivemo-nos em contacto. Até me esqueci de que ele era uma autentica máquina de matar, um soldado à séria.

@tnm___ / @yassino_yassino

Campo Speicher, a base militar com o nome do tenente norte-americano de 33 anos, Michael Scott Speicher, que foi morto a tiro durante a Guerra do Golfo de 1991.

Três gerações de combatentes Jihadi, com o mais novo a vestir uma camisola do Manchester City.

A equipa de comunicação do Hashd Al Shaabi encontrou assim a área circundante ao antigo palácio presidencial de Saddam, em Tikrit.

Quando lhe perguntei se o podia fotografar, este jovem consentiu com um aceno e continuou a sorrir.

Sheikh Abdul Adheem, é líder de uma tribo. Fotografei-o em Saqlawia, no Centro do Iraque. Ele gere este local onde os soldados podem encontrar um sítio para repousar e rezar. Com ele trabalha uma pequena equipa e vivem dos donativos.

Buracos de balas e marcas de sangue são visíveis nos carros abandonados nos terrenos junto ao palácio presidencial.

A isto chama-se "Satir" (a protecção) – basicamente uma parede feita pelo homem, com uma trincheira do lado de lá, construída com o objectivo de travar os carros-bomba do ISIS.

Hussein, um soldado de 70 anos do Hashd Al Shaabi, que diz que se juntou à milícia por já não ter idade para o exército e querer livrar o Iraque do ISIS.