Fomos ao Texas dançar com os Capitão Fausto
Todas as fotos por Rafaela Calvete

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Música

Fomos ao Texas dançar com os Capitão Fausto

Por esta altura não há quem não tenha opinião sobre o novo disco da banda lisboeta. Nós achamos que é um clássico instantâneo da música feita em Portugal. O tempo vai dar-nos razão. Falámos com o(s) Capitão.

Quando uma banda tem o mérito de meter toda a gente a cantar "eu vou morrer", mas com o ar mais alegre deste Mundo - como se fazia com os Smiths no século passado - distâncias e estéticas à parte, é sinal de que algo de especial se está a passar. Dá a sensação que os dias de incerteza dos Capitão Fausto estão mais apaziguados. Com uma sonoridade (ainda mais) segura, agora é a valer.

Depois há o Pet Sounds dos Beach Boys, os lá lá lás, as teclas, os sopros, as cordas, as harmonias, tudo misturado, ou como, já se disse no seio da VICE, "é tipo Ariel Pink à porrada com o Psicopátria dos GNR, com o Brian Wilson a arbitrar", naquelas que são as inevitáveis comparações que fazem parte do universo da música popular.

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Todas as fotos por Rafaela Calvete.

Ao terceiro álbum, Capitão Fausto Têm os Dias Contados, os dias desta banda lisboeta vivem-se entre concertos de Norte a Sul de Portugal. A VICE foi apanhá-los bem no Centro, no Texas Bar, a poucos quilómetros de Leiria, no dia imediatamente a seguir à surra a dobrar que levaram no Lux, em Lisboa. Como não podiam ficar eternamente estacionados em Santa Apolónia, o Capitão deu ordem para embalar a trouxa e zarpar, pois tinham compromissos no resto do País. Um País que também anseia por eles. Apesar de algum cansaço - mas daquele do bom - foi dia de esgotar mais uma casa e darem tudo em palco. Não falharam.

Esta é também uma altura em que chegaram ao Nº1 do Top de vendas nacional, mas isso, garantem, "nem é o que mais importa", apesar do reconhecimento ser sempre bem-vindo. "A editora deve estar mais contente do que nós, mas sim, é um trabalho que está a ser reconhecido, e cuja estratégia está a funcionar", diz o vocalista e letrista Tomás Wallenstein. E o baixista, Domingos Coimbra, reforça: "Mais do que pelo mero recorde estatístico - não são esses factores que nos fazem verdadeiramente felizes -, ficamos mais contentes por saber que as pessoas estão a gostar da nossa música. É bom sinal e significa que temos uma boa equipa, que trabalha bem".

Passa-lhes portanto um bocado ao lado - nem estão preocupados - o facto de virem a ter uma exposição maior e de, com isso, também estarem mais expostos à crítica. Antes pelo contrário. Acham perfeitamente natural que, com um público mais vasto, também possa aumentar o número de haters, que são já um clássico nestes fenómenos de sucesso.

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Para eles, o mais importante é que só lançaram o disco quando tiveram a certeza que o conseguiam "defender". Ou seja, só saiu no momento em que os próprios ficaram satisfeitos com o resultado. A partir daí, quem gostar gosta, quem não gostar não gosta - os Capitão Fausto gostam de certeza - mas sem qualquer tipo de drama para as outras opiniões divergentes. A sonoridade patente neste último trabalho foi fruto de um processo natural. "Fizemos as coisas como sentimos que as devíamos fazer nesta altura, para além disso, estava-nos a soar bem. Antes de mais, mesmo antes de ver o impacto que iria ter nas pessoas, nós próprios ficámos contentes com o resultado", assegura Wallenstein.

"A única diferença deste disco para os outros é que tivemos mais tempo para fazer as músicas. Fizemos uma espécie de pré-produção em que gravávamos várias vezes - anteriormente também o fizemos, mas se calhar não com tanto rigor - o que fez com que as músicas passassem por várias metamorfoses", esclarece Domingos Coimbra. E o baixista acrescenta: "Isso, se calhar, deu-nos uma capacidade mais pragmática de irmos directos ao assunto. Fomos cortando as coisas até acharmos que elas estavam exactamente como estão no disco. Essa deve ser a principal diferença em relação aos outros discos, porque, de resto, o processo de composição de todos foi muito parecido: sempre em ensaio, com todos a compor".

As letras falam de coisas boas, mas também de coisas más e o exemplo máximo é dado por Coimbra quando refere a ironia do concerto do dia anterior, em Lisboa, onde as pessoas cantavam, com grande alegria, o refrão da canção Os Dias Contados, que diz "eu vou morrer, eu vou morrer (mas antes vou aproveitar bem)". Tem a ver, segundo os músicos, com as melodias, a secção rítmica, onde todos investiram muito e tentaram inovar, trazendo coisas novas para a banda. O que significa que, mesmo com letras que possam espelhar algum tipo de infelicidade, o pezinho de dança triunfará sempre sobre qualquer drama [Amanhã Tou Melhor é das melhores coisas que este País anda a ouvir desde Efectivamente] .

A moral a bordo é, portanto, elevada. Há quem faça uma viagem depois de acabarem os estudos, eles fizeram um disco que agora estão a promover por todo o lado, com bons resultados. Estão entusiasmados, com esperança que tudo continue a correr bem, à medida que vão descobrindo soluções para que a circunavegação desta saga chegue a bom porto.

Dá para imaginar ouvir as músicas através de um rádio a pilhas, numa praia, como se fazia antigamente, ou numa viagem de carro. O test-drive deste disco pode ser feito de diversas maneiras, mas todas elas realçam a portugalidade de influências. Do psicadelismo do disco anterior, ao ritmo frenético do primeiro trabalho, agora notam-se mais as raízes de um património devedor - segundo os próprios - a Fausto, Zeca Afonso, Sérgio Godinho, ou à Banda do Casaco, mesmo que a sonoridade seja outra. Com isto tudo, Capitão Fausto Têm os Dias Contados é um disco de Verão lançado numa Primavera chuvosa, é o que é.