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Temporada 2015 de Protestos no RJ Estréia com Duas Prisões e Muita Tensão

O Rio de Janeiro continua lindo?

Sob um sol infernal, manifestantes começaram a se agrupar na Cinelândia por volta das 17h.

O trabalhador fluminense mal tinha curado da ressaca do enterro dos ossos do Ano-Novo quando na sexta-feira dia 2 foi surpreendido por um aumento não de 20, mas 40 centavos na passagem de ônibus. Prefeitura e empresários justificaram o aumento dizendo estar repassando para os passageiros o custo das gratuidades e da implementação de ares condicionados nos ônibus. Curiosamente, enquanto um decreto publicado no Diário Oficial no início de 2014 dizia que todos os ônibus deveriam ter ar-condicionado até as Olimpíadas de 2016, o decreto deste ano diz que metade das viagens devem ter ar-condicionado até o final de 2015. A relação promiscua entre Prefeitura, Governo do Estado e o cartel de empresários de ônibus do Rio de Janeiro não é novidade, e mais uma vez tem gente que não ia deixar barato.

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Adiantando-se às outras capitais do Brasil, um primeiro ato foi marcado dia 5 no Rio de Janeiro, mas por conta de uma forte chuva e fraca divulgação não teve muito quórum ou repercussão. O segundo ato, já começou diferente, com muito debate no evento e páginas de Facebook que o convocavam. Frases como "Esse ato é do povo ou da esquerda?", "Fora Petralhas" e "Tarifa Zero é viagem, como vão pagar o motorista?" ecoaram na rede até a véspera do evento, criando uma certa tensão no ar, sugerindo que veríamos novamente as cenas tristes de 20 de Junho de 2013, em que manifestantes partidários, apartidários e coxinhas saíram na mão por todo país. Felizmente tudo não passou de ativismo de sofá, e o ato pôde acontecer sem grandes tretas internas, quer dizer, quase sem tretas internas… A gente já chega lá!

Por volta das 17h, sob um cruel sol de quase 40º bandeiras pretas e rostos cobertos começavam a ocupar os degraus da Câmara dos Vereadores, na Cinelândia. Pelo menos duas grandes faixas pediam a liberdade de Igor Mendes e os outros 22 ativistas que vem entrando e saindo do sistema carcerário desde sua "prisão preventiva" às vésperas da final da Copa do Mundo. Muitas faixas a respeito do aumento da passagem, perguntando sobre a ossada do Amarildo e até um "Je'Suis Charlie". Quando militantes do coletivo Vamos à Luta chegaram com um carro de som, o pessoal da escada começou a puxar um coro "não vai ter carro", o que acabou sendo atendido, mas não antes dele ser usado para uma pequena assembleia, aonde foi escolhido o trajeto da manifestação, havia duas propostas. Uma, surreal, terminando na estação das barcas que levam à Niterói e outra no terminal de ônibus e trens da Central do Brasil. Venceu a segunda.

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A manifestação seguiu numa boa pela Av. Primeiro de Março, com as mesmas cantorias de sempre, até que na Praça XV surge o Batman de Marechal Hermes, um cosplayer doidão que começou a colar fantasiado nos protestos ainda em 2013. Nesse meio tempo o Batman deu muitas entrevistas para mídia do mundo inteiro, criticando com argumentos genéricos a corrupção, e chegou a ser preso numa época em que tentaram criminalizar o uso de máscaras em manifestações. O pessoal considerava ele até algumas semanas atrás, quando o homem morcego apareceu numa manifestação e foi tirar foto logo com quem? Nosso Le Pen tropical, o deputado federal mais votado do estado – Jair Bolsonaro.

Primeiro vieram as vaias, chamaram o cara de "arroz de passeata". Depois começou um coro de "fascista" e uma chuva de garrafinha pet. Alguns policiais da Choque que acompanhavam a manifestação em fila indiana tentaram retirá-lo de lá, mas ele permaneceu de pé respondendo aos insultos. Não demorou pra uma turba partir pra cima dele, por muito pouco a coisa não ficou feia. Um pouco de gás pimenta foi disparado e com a ajuda da PM e de alguns fotógrafos ele foi retirado da manifestação de vez e não voltou mais. Tem vídeo.

Quando chegamos na Av. Presidente Vargas a Choque tentou conduzir os manifestantes, que a essa altura deviam ser entre três e cinco mil, pela pista lateral. Num determinado momento um pequeno grupo de Black Blocs os contornaram e puxaram o bonde para fechar todas as pistas sentido Zona Norte e pelo menos uma sentido Zona Sul. Já perto do Panteão de Caixias, bem próximo ao terminal da Central do Brasil, um ônibus vazio jazia misteriosamente estacionado no meio da pista, num lugar bem surreal para um ônibus estar. Um grupo de BBs se adiantou e cercou o ônibus, alertando para que ninguém o depredasse, pois aquilo seria uma "armadilha fascista".

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Após ficar uns quinze minutos bloqueando a saída dos ônibus no terminal da Central do Brasil a turba finalmente invadiu a estação de trens, a esta altura já protegida pela Choque, e por conta disso (e falta de quórum) não conseguiram realizar o anunciado "catracaço". Após uns minutos de zoeira e batucada na estação, os manifestantes saíram pacificamente da estação e começaram a se dispersar, a maioria voltando em direção a Cinelândia, fechando a Av. Presidente Vargas no caminho e depois correndo pelo calçadão do camelódromo, aonde alguns BBs tentaram fazer barricadas ateando fogo em pilhas de lixo.

Enquanto a maioria das pessoas já tinha chegado à Cinelândia e já começavam a se dispersar pelos bares da região, a PM atacou uma estudante de Filosofia chamada Thamires que supostamente estava tentando atear fogo no lixo. Eu não estava próximo no momento, mas assisti à filmagem de um colega da A Nova Democracia, aonde um policial a imobiliza numa escada e quase quebra seu braço. Quando manifestantes e fotógrafos tentaram se aproximar, policiais atiraram pelo menos três bombas de efeito moral. Houve correria na Cinelândia e alguns manifestantes foram enquadrados e revistados. Cerca de trinta manifestantes então se dirigiram à porta do quartel general da PM (ainda ostentando uma bizarra decoração natalina) aonde Thamires e um outro manifestante chamado Thiago foram levadas. Após algum tempo, eles foram conduzidos (pela porta dos fundos) à 17ª DP, em São Cristovão.

Até o fechamento desta matéria às 0h do dia 10 de Janeiro os dois manifestantes detidos permanecem em atendimento.

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ATUALIZAÇÃO: Uma versão anterior deste artigo afirmava que o carro de som era do coletivo R.U.A.