Meio Ambiente

A vida sem papel higiênico é uma vida melhor

Quando aprender a técnica da água e mão, você vai ficar imaginando por que passou todos esses anos esfregando suas fezes com papel seco.
woman holding water in a bottle

Entre as muitas coisas preocupantes que emergiram nas últimas semanas, temos a obsessão apocalíptica de vários países com papel higiênico. Apesar de especialistas na indústria garantirem que ainda há bastante do produto disponível, as pessoas insistem em encher seus carrinhos (e carros) com pacotes. As prateleiras estão vazias. Banheiros estão sendo roubados. Um departamento de polícia do Oregon até teve que divulgar a seguinte declaração: “Há uma escassez de papel higiênico. Isso também vai passar. Não ligue para o 911. Não podemos te levar papel higiênico”.

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Quando medos aleatórios como esse surgem – palhaços assustadores, ataques sônicos, cultos satânicos, o bug do milênio – isso diz algo sobre a sociedade. Mas o que podemos tirar da emergência atual de SAPH, ou síndrome de ansiedade com papel higiênico? Isso é mesmo um problema? É um microcosmo da nossa experiência diária na privada? Ou só estamos passando por uma fase oral-anal do nosso desenvolvimento como sociedade?

Minha filha adolescente me colocaria na última categoria. Mas essa questão em particular está muito perto de casa pra mim. Anos atrás, quando eu era um jovem viajante, tive a mesma ansiedade. Por anos viajei com meus próprios rolos de papel higiênico, porque tinha medo – melhor, ficava apavorado – em acabar num lugar onde não tivesse nenhum.

Estive em muitos lugares assim, na África Oriental e Ocidental, no Sudeste Asiático, no Caribe. Nesses lugares, geralmente tinha uma mangueira, garrafa ou chaleira do lado da privada. Mas eu não entendia a logística, o protocolo e o decoro envolvidos. Morei na Itália por um ano inteiro como estudante de intercâmbio com um bidê no quarto, achando que era só uma pia estranhamente baixa.

E era, mas eu não sabia que era uma pia para seus países baixos. Se eu soubesse na época o que sei agora, minha vida teria sido muito mais fácil, com menos ansiedade e eu teria muito menos irritação. Viajei para lugares onde o Mr. Whipple não ousaria passar, e tenho uma sabedoria adquirida duramente para compartilhar.

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Primeiro, pense assim: Se você estivesse andando descalço no quintal, e tivesse a infelicidade de pisar no cocô fresco do seu cachorro, qual seria sua reação? Você pensaria “Eita, preciso pegar um papel seco que rasga fácil pra limpar isso do meu pé”?

Não. Você iria correndo pegar uma mangueira, ou pra uma pia. Você pegaria um sabão. E esfregaria o pé usando as mãos.

O que é um jeito longo demais de dizer: papel higiênico não é o melhor sistema.

Indo um pouco além: não precisamos de papel higiênico.

Papel higiênico é bacana, mas os humanos viveram muito bem sem ele por pelo menos 70 mil anos (tenho certeza que li isso em Sapiens) ou talvez muito mais. Foi só recentemente que pessoas de certos países se tornaram dependentes dos rolinhos brancos.

O que usávamos antes? O que bilhões de pessoas usam atualmente? E o que deveríamos estar usando hoje?

Água.

E uma mão.

Isso, eu disse. Ninguém fala disso, mas deveríamos. Isso pouparia incontáveis árvores, gigantescas quantidades de água e muitas horas mais de preocupação.

Se limpar assim não é muito difícil. A logística é simples. É o vão mental e cultural que é difícil de cruzar. Mas o que te espera do outro lado? Uma bunda muito mais limpinha.

Dependendo do dispenser de água à sua disposição, você pode fazer isso de várias maneiras.

No Japão, eles têm privadas chiques que jogam água de todas as direções, em todas as temperaturas.

Em grande parte da Europa eles usam bidês.

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Na Tailândia você encontra um spray manual em cada banheiro.

Em outros lugares, você vai ver uma garrafa ou chaleira perto da privada.

Estritamente falando, essas tecnologias são apenas variações de um tema: jogar água na sua porta dos fundos, e você não precisa de uma ferramenta especial pra isso. Com bidês e sprays é mais simples, mas com qualquer objeto que retenha água, você pode simplesmente derramar a água no cóccix e ela vai naturalmente ser afunilada pra baixo onde precisa chegar.

Depois que a água chega na área suja (não antes) você usa uma mão para te ajudar a limpar a sujeira. Dependendo da sua dieta, isso pode levar uma certa quantidade de tempo e água. Mas com treino, é algo muito rápido e eficiente. Na Itália (eu sei) as pessoas colocam um pouco de sabão nas mãos antes de se limpar.

Se você quiser, e tiver o luxo, você pode usar um pouco de papel higiênico para terminar/conferir o serviço. Mas não é necessário. Quando você tiver limpo (o número dois) e enxaguado (o número 1), sua bunda está pronta. Se tiver alguma água residual, imite a Taylor Swift e o resto vai secar sozinho. Confie em mim.

Depois, é só lavar a mão com sabonete. Desde que você esfregue as mãos juntas por seis ou mais vezes sob água corrente, as bactérias vão ter descido pelo ralo.

Só é preciso se acostumar, e não espero que a prática seja amplamente adotada em breve. Mas quando aprender isso, você vai ficar imaginando por que passou anos esfregando suas fezes com papel seco.

Você vai ficar imaginando como chegamos nesta situação, e vai esperar que possamos sair dela. Ou até acabar o sabonete, pelo menos.

Frank Bures é o autor de The Geography of Madness: Penis Thieves, Voodoo Deaths, and the Search for the Meaning of the World's Strangest Syndromes .

Matéria originalmente publicada na VICE EUA.

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